30. Luminus, e a Cidade Espiritual.

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Aterrorizada pelas palavras da rainha, dirigi meu olhar para o próprio ser. Percebi que minhas mãos emanavam um fulgor, embora nenhum vestígio de sensação me acometesse. Essa luz, similar àquela que experimentara ao provar o Éris, destituída da angústia agonizante que trespassava meu corpo naquela ocasião, agora me envolvia com uma sensação aprazível.

— De que matéria eram formadas essas maçãs mesmo? — indaguei, buscando compreender o motivo pelo qual meu corpo resplandecia como uma lâmpada acesa.

— Mana pura! — respondeu Yuri, ainda estudando-me meticulosamente por mais alguns instantes.

— É por isso que emano esse brilho? — questionei, mas Yuri, absorta em suas próprias reflexões, desconsiderou minha pergunta. Ela examinava-me de cima a baixo, levantava meus braços, explorava minhas mãos, espreitava dentro de minhas orelhas; todo o meu ser parecia transformado em algo raro naquele momento.

— Ei, o que estás a fazer? — perguntei, enquanto ela erguia meus pés, alheia à minha indagação.

— Oh, peço desculpas! Deixei-me levar pela emoção. É uma raridade evocar tal resposta.

— Raridade em que medida? — indaguei, envolta pela curiosidade.

— Raridade a ponto de ter ocorrido apenas em uma dezena de ocasiões em toda a história.

— Uau, verdadeiramente raro. Mas, para ser sincera, só sinto um calor reconfortante!

— Precisamos encaminhá-la ao Ancião. — Yuri pronunciou-se, erguendo-se apressadamente.

— Por qual razão? Vou perecer? Isso é um infortúnio? — inquietei-me, já tomada pela aflição.

— Reexamine seus atributos. Quanta mana já reacendeu em ti? — Yuri desconsiderou minhas perguntas uma vez mais, imersa em sua própria urgência.

Às voltas com a perplexidade do que transcorria, inquiri o significado de toda aquela urgência, desvendando meus atributos uma vez mais. Ali estavam eles, dos quatro pontos de MP (Pontos de Mana) esgotados ao usar a pedra de teleporte, apenas um ressurgira. Um enigma se desenrolava, algo singular e intrigante. Normalmente, minha mana, escassa como a aurora, renasceria plenamente em cerca de uma hora, recarregando-se com a velocidade que me é peculiar. Entretanto, nesse instante, transcorrido um dia, apenas um ponto restaurara-se, desafiando as leis costumeiras que regiam minha essência.

— Hmmm. Confirmei minhas suspeitas. Vamos, conduzi-la-ei à cidade. — Yuri tomou minha mão e arrastou-me consigo.

— Que cidade? E o que está ocorrendo? — indaguei, ansiosa por desvendar o enigma que se desdobrava à minha volta.

— Não há tempo para explicações agora. Precisamos alcançar nosso destino antes que o encantamento se dissipe.

— Encantamento? Que encantamento? O efeito de eu resplandecer como uma lâmpada acesa? Pretendes exibir-me como uma raridade? — retruquei, firmando-me no solo, recusando-me a dar um passo adiante.

— Elena, por favor! Esta é minha chance de demonstrar que não estou equivocada!

— Sobre o quê, Yuri?

— Confie em mim, por favor. O efeito Luminus perdura apenas por breves minutos e ocorre uma única vez em cada indivíduo, jamais se repetindo. O tempo escasseia.

Yuri exibia inquietação e nervosismo, um tumulto silencioso que a consumia, um enigma que eu, em minha ignorância, não conseguia desvendar. Optei, então, por silenciar minhas perguntas e segui-la com a disposição do silêncio.

A rainha evocou sua nuvem uma vez mais, e, juntas, alçamos voo veloz. A cidade mencionada resplandecia no horizonte distante. Gradualmente, percebi meu corpo retornando à sua normalidade.

— Ei, Yuri! Estou retomando a forma habitual. — tentei atrair a atenção da rainha, mas ela, mergulhada em seus pensamentos, permaneceu alheia a minhas palavras.

Desembarcamos à entrada de uma grandiosa urbe. As edificações que moldavam aquele recanto eram esculpidas em pedra branca, adornadas por detalhes dourados, e suas janelas assemelhavam-se a cristais da mais pura essência. Os calçamentos das vias evocavam pedras preciosas, cintilando como diamantes em uma sinfonia de cores deslumbrantes. 

Era uma visão paradisíaca, onde entre as construções imponentes floresciam árvores majestosas — carvalhos ancestrais, sequoias gigantes, acácias e ágar perfumavam o ambiente. Um contraste sublime entre o tecido da natureza e a alvenaria erigida.

Envolta pela magnificência, meu fascínio cresceu, almejando explorar cada recanto daquele Éden arquitetônico. Uma perfeição inigualável se desenhava diante de mim. Espíritos povoavam o ambiente, coexistindo como humanos em uma sociedade meticulosamente orquestrada, cada qual desempenhando seu papel com harmonia e propósito.

— Poderíamos deambular por entre essas maravilhas? — perguntei, exuberante.

— Hahaha! Como eu desejaria... — Yuri respondeu, um timbre de melancolia enroscando-se em suas palavras.

A paisagem capturara tão completamente minha atenção que, até então, os olhares dos demais espíritos passaram despercebidos. Quando finalmente tomei consciência, percebi que em estranho desdém, os olhares dos outros espíritos se cruzavam conosco, numa dança de indiferença que pairava no ar, como se o encanto da paisagem não fosse digno de partilha ou compreensão.

— Ei, Yuri, por que esse comportamento? Não és tu uma rainha? Deveriam estar a te saudar com celebrações.

— Deixa pra lá, Elena. São apenas um bando de almas amarguradas, deveríamos ser seres de pureza, mas alguns nunca aprenderam a lidar com suas próprias frustrações!

A resposta franca de Yuri me surpreendeu, induzindo-me ao silêncio. Talvez eventos passados tenham desencadeado cicatrizes que me escapavam, considerando que todos ali eram significativamente mais antigos do que eu, carregando consigo uma bagagem repleta de histórias e vivências.

As Crônicas De Elena - e o Passado Esquecido!Onde histórias criam vida. Descubra agora