35. Memorias afloram

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Diante do majestoso trono do Espírito Ancião, Yuri suavemente sussurou em meus ouvidos:

— Pode abrir os olhos agora, Elena.

Ao despertar a visão, deparei-me com a imponente figura diante de mim. A pressão que emanava de sua presença era avassaladora, suficiente para curvar qualquer humano ou espírito.

Minhas pernas trêmulas me impediam de manter a cabeça erguida.

— Calma, criança! Não irei te fazer mal. — A voz do grande Espírito soou gentil desta vez, desprovida de hostilidade.

— Venha, se aproxime! — Ele ordenou, convidando-me a dar passos adiante.

Com passos hesitantes, minhas pernas ainda trêmulas me guiaram até sua presença. Embora a pressão que antes emanava dele se dissipasse, o medo persistia em minha alma.

O Ancião ergueu sua mão em minha direção, e, com olhos cerrados, antecipei-me a qualquer movimento. Sabia que nem mesmo Yuri poderia intervir, caso a vontade do grandioso ser se voltasse contra mim.

Enquanto mantinha os olhos fechados, percebi que meus pés deixaram de tocar o solo. Uma força suave e cuidadosa elevou-me do chão. Cautelosamente, decidi abrir os olhos e deparei-me sentada no colo do Ancião. Naquele abraço seguro, sustentada por seus braços, experimentei algo semelhante à sensação que Yuri me transmitia.

Meu temor desvaneceu, transformando o grandioso Espírito capaz de extinguir minha existência num simples ancião de barbas longas. Seu olhar sobre mim era silencioso, um leve semblante de contentamento se desenhava em seu rosto.

Aconchegada em seu colo caloroso e terno, o ambiente ao redor perdeu importância, envolvendo-me numa atmosfera de serenidade e proteção. Nunca tive avô, mas naquele instante, a sensação parecia ser aconchegar-me nos braços de um.

Deixando-me levar pela imaginação, repousei minha cabeça em seu peito, sentindo a suavidade da barba vasta roçar delicadamente meu rosto, provocando cócegas no nariz. Um sorriso se desenhou em meus lábios, e, sem perceber, entreguei-me a acariciar aquela barba imponente.

— O que estás a fazer! — ecoou a voz grave e profunda daquele grandioso Espírito.

Sua pergunta me retirou dos abismos dos meus pensamentos mais profundos. Apesar da ausência de hostilidade em tua voz, meu coração se sobressaltou. 

"O QUE FIZ? MEU DEUS! ENLOUQUECI? PERDI A NOÇÃO DO PERIGO?" – pensei ao recobrar a consciência de onde me encontrava. 

Fixei o olhar em seu rosto, e juraria ter percebido uma lágrima prestes a se formar em seus olhos. Achando que eram meras ilusões, baixei a cabeça e implorei perdão. 

— Perdoa-me, ó grande Ancião. Deixei-me levar por devaneios. Rogo pelo perdão da vida desta simples humana! – supliquei, ainda de cabeça baixa e envolta em seu colo.

— Em que pensavas? – indagou ele, firme, mas com gentileza. 

— Que tu eras... – as palavras titubeavam ao escapar de meus lábios, temia confessar o que realmente imaginara. Yuri contara-me que os espíritos aprimoraram a habilidade de detectar mentiras humanas após serem traídos por eles. 

— Não temas! Prossegue! Revela-me teus pensamentos! – ordenou o Ancião. 

— Eu... eu imaginei que fosses meu avô... – meu corpo tremeu em uníssono com minha voz, o medo retornava para me envolver.

Vozes ecoavam por todo o recinto, um clamor ininteligível preenchia o espaço. Os espíritos, agitados, expressavam-se em alvoroço. 

— SILÊNCIO! – bradou o grande espírito, impondo-se com majestade. 

O salão mergulhou instantaneamente em quietude, um silêncio que perdurou por preciosos momentos. 

— Elena, que visões dançaram em tua mente ao cerrares os olhos? Não hesites, conta-me tudo. – insistiu o Ancião, sua voz denotava uma curiosidade delicada, e, apesar da relutância, decidi narrar sem reservas. 

— Hunnf! – suspirei profundamente, nutrindo coragem para revelar as "fantasias" que concebera. — Eu... eu nunca conheci um avô, mas sempre idealizei alguém semelhante ao senhor. Sua barba me acaricia o nariz com suavidade, assemelhando-se a nuvens feitas de algodão. Exala um perfume de lavanda silvestre com jasmim. Essas reminiscências me conduziram a um belo campo, repleto de flores e impregnado com seu aroma. Aahh! Lá, entre as flores, encontrei a Rainha Yuri. O local possuía o mesmo perfume que emana de vós. E havia também dentes de leão, que, curiosamente, recordam-me vossa barba!

Sorri inadvertidamente, envolvida pela emoção. Novamente, permiti-me falar o que não era essencial. O Ancião permaneceu em silêncio, seu semblante envolto em uma expressão indecifrável. Não tinha ideia do que me aguardava por ter cedido à imaginação. A ansiedade, qual mão sufocante, começou a apertar meu peito, instigando a falta de ar. O silêncio reinava, cada pensamento ecoava, conjecturas sombrias dançavam em minha mente: "Serei fulminada aqui?" ou "Acaso enfrentarei torturas?".

Após um intervalo, resolvi dirigir meu olhar para Yuri. Suas mãos abafavam um suspiro de espanto, enquanto seus olhos reluziam, testemunhas das lágrimas que se formavam. Alev e Lucian permaneciam imóveis, logo atrás dela. A perplexidade marcava o rosto de Alev, enquanto Lucian exibia uma expressão de surpresa e confusão. 

Ao fitar novamente o Ancião, percebi que ele me examinava minuciosamente, capturando cada reação minha e cada molécula do meu ser. Sua expressão, de repente, tornou-se ligeiramente sombria, dirigindo um olhar firme a Yuri, questionando-a.

— Yuri, compartilhou esses detalhes com ela? Descreveu como era Agnis?

As Crônicas De Elena - e o Passado Esquecido!Onde histórias criam vida. Descubra agora