A Viúva e o Trigo 1.1

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Ato 1: Primeira Parte

[Aila Wheat]

O casamento é o dia mais feliz para uma mulher. Discordo.

Talvez para algumas camponesas e nobres, o casamento seja sim seu dia mais feliz, ou o dia mais aguardado, seja lá o que for. Acredito que essas meninas tenham suas idealistas expectativas sobre um príncipe encantado montando em um cavalo branco ou num camponês forte de pele bronzeada e coberto de virilidade. Quem sabe se suas mentes divagam sobre festas de boda com decorações luxuosas, um vestido de noiva impecável da pele mais fina e glamorosa, ao som de uma orquestra no grande banquete alegre.

Mas para mim nada disso se tornava adequado.

O meu casamento era na própria propriedade da minha família, graças ao descaso e negligência de realizar na igreja da cidade mais próxima. As decorações nem se fala, o mais simples e rústico, se é que tinha.

Para a família mais rica da região, realizar o casamento da sua única filha dentro de casa com um banquete simples, éramos motivo de chacota. Meu vestido era pior do que a maioria das camponesas, tínhamos pouquíssimos convidados, e claro, não podia faltar o ar de desgosto e caras ranzinzas. O dia mais feliz da minha vida era uma decadência sem tamanho.

E meu noivo...?

- Vamos acabar logo com isso. – Foi sua bufada fria sem sequer olhar para minha cara.

Mas por que deveria me importar? Realizar o sonho de toda garota de encontrar sua alma gêmea, casar na igreja com traje de princesa e receber parabenizações da cidade inteira? Não poderia me agarrar menos a essa ideia.

Afinal, eu era apenas Aila Wheat, a moeda de troca mais valiosa da família Wheat, se não de todo Westwood.

*

Muitos anos antes.

Um tempo onde as grandes embarcações explorava o mar ocidental, navegando infinitamente às bordas do mundo atrás de monstros marinhos, terras inexploradas ou simplesmente especiarias do País do Norte. As notícias fantásticas sobre o Novo Mundo chegavam até mesmo a Westwood, uma pequena província no leste do País do Oeste.

Fomentando a imaginação de todos, não era incomum ver meninos e meninas, jovens e adultos olhando paras imensas planícies rumo ao horizonte vendo o sol poente, se indagando, mitigando as maravilhas desse Novo Mundo. Era a conversa das tavernas, assunto nas escolas, brincadeira das crianças.

Mas não para mim. Descobri muito cedo que nem todos poderiam sonhar. Seja na busca de uma fantasia inexplorada ou mesmo a simples e alegre vida no campo.

Deitada sobre o chão de madeira do meu quarto, eu rabiscava as folhas marrons de papeis com o lápis de chumbo que havia pegado do meu pai. Após alguns rabiscos aqui e caprichos ali, terminei o que considerava minha mais linda obra de arte.

Algum tempo atrás, tive a oportunidade de conhecer um vendedor ambulante que exibia seus belos quadros. Aquela experiência me inspirou profundamente, pois ele apresentou um mundo totalmente novo onde a vida e os sentimentos poderia ser capturada dentro dos quatro cantos de uma tela. A beleza poética daquelas obras despertou em mim o desejo de criar algo tão belo que pudesse ser chamado de meu. "O meu belo..."

Infelizmente, meu pai mandou o homem embora a gritos, mas não impediu que os desejos do meu coração crescessem. E por muito tempo procurei formas de colocar prática o meu belo mundo. Até aquele dia que finalmente acreditei ter criado "o meu belo".

Finalizando o desenho, larguei o lápis e desci as escadas voando, parei próxima a cozinha vendo minha mãe ocupada com as panelas. Sorrateiramente, esquivei dela e fui em direção aos campos de trigo.

PARA ELA: ABERTURAOnde histórias criam vida. Descubra agora