Subtendido

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Esses ferimentos no braço de Ludwig foram por uma boa razão. Agora que eles estão aqui na minha frente, vermelhos e frescos, são um lembrete do óbvio. O bom senso, talvez passageiro, agora pode durar. Eu fixo meus olhos e lembro que lutas como aquela é o que eu sou, é o que eu faço com rivais.

O meu aliado me encara durante todo o jantar. Identificar suas expressões é perigoso também, mas uma vantagem; eu só tenho de garantir que ela fique do meu lado.

Mas a hora de dormir é a pior parte. Só há mais um dia antes dos Jogos. As horas vão embora sem que eu consiga dormir. Minha mente quase não trabalha a meu favor e quando eu considero que dormi minha vida toda com um rival, eu sei que não há mais dano. Se sempre foi assim e se eu sempre disse que poderia matá-lo, uma noite ou duas não podem abalar o trabalho de anos, eu ainda preciso dele pra isso.

Atravesso o quarto e quando abro a porta do seu, eu até sei que ele tinha razão; não é culpa de ninguém se o outro quarto parece mais aconchegante.

- Cato – Ludwig não é apropriado agora. – Eu posso ficar aqui?

Ele está acordado, olhando para cima. Levanta a cabeça, olha pra mim e não diz uma palavra, nenhuma expressão, nada aconteceu enquanto abre o espaço ao seu lado. Ele afofa o travesseiro e eu caminho até lá. Não é minha culpa.

Eu não peço desculpas, ele continua calado, olhando para cima de novo. Aaron nunca pôde me alcançar aqui. Se houver alguma coisa lá em cima, eu tento ver também.

Nenhum contato físico. Eu durmo.

[...]

Clove – Distrito 2. 10h27min, 07/12

Sou a segunda a chegar para o café. Brutus nunca perderia mesmo uns minutos a mais comendo.

- E aí, sardentinha?

Ele está sempre querendo alguma coisa, então não respondo. Pego minha comida e espero que ele fale.

- Enobaria fez um trabalho porco na sua educação, hein.

- O que é que você quer, querido? – pergunto falsamente, me virando e batendo o prato na sua frente.

- Como foi com a Nyra ontem? Ela encheu o saco?, por causa do Cato? – mais comida. Que Deus não deixe esse homem morrer antes de me arranjar os patrocinadores.

- Ela mencionou algumas vezes – bebo o suco. – Você não vai falar com ela, não?

- O quê? O que é que eu falaria, menina?

- Fala pra ela que o Ludwig...

- Ele sabe pra onde vai se vencer.

Eu engasgo.

- Você é louco?

- Não. – Parece o fim da conversa. Ele dá de ombros, como se eu entendesse.

- Oi, oi, oi! – Nyra chega agarrando meu pescoço e beijando meu rosto até me deixar irritada com esse perfume de morto. Eu preferia quando ela tomava seu café no quarto, toda cheia dos ressentimentos da Capital. Agora somos amigas. – Clove! Eu estou tão ansiosa para a entrevista hoje, nós nos divertimos tanto ontem que eu...

Sorrio como se estivesse ouvindo. Mas continuo avaliando Brutus porque, quando eu vencer, que tipo de lugar me espera segundo o que esse idiota disse?

A equipe de preparação chega quando eu já fui para a sala de televisão. Eles me agarram também, todos cheios de "Clover" que me fazem querer arrancar essas maquiagens patéticas com as unhas.

- Ela continua linda nós somos tão sortudos tão sortudos por termos um casal tão lindo do 2 eles são tão glamorosos eu estou tão orgulhosa!

Eles não param de falar nunca, eles não respiram. Quando puxam meu cabelo pela milionésima vez, me levanto e empurro um idiota que achou que um cabelo parecido com uma flor era legal. Pego o aparelho estranho de sua mão.

Linhas BorradasOnde histórias criam vida. Descubra agora