Capítulo 9

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Na vida existem muitas formas de traição, contrariando o pensamento banal que trair é apenas algo restritos a os amantes. Existem as traições entre irmãos, que se deduram entre si aos pais. Existem as traições entre pais e filhos, quando os filhos são ingratos e não dão o devido valor ao esforço de seus genitores ( também há casos de pais que não se importam com o bem estar e sentimentos dos filhos). Há a traição entre amigos, que se chamam de irmãos mas que se abandonam na primeira oportunidade. Existem muitas formas de traição, porque não é restrito apenas a interesses românticos ou fraternais.
E era uma dessas variações de formas de traição que Madalena estava sentindo naquele momento, vendo a fumaça sair de cima do incinerador de corpos do povoado. Se sentia traída pela vida, na qual achava que nada ruim lhe faria porque era sua vez de viver. Se sentia traída por ela ter tirado seu tio, se sentia traída pelo tio de tê-la deixado.

Ao redor do incinerador estavam todos que vieram prestar as condolências à família. Todos desejavam força para aguentar o luto, e de longe Madalena observava Cecília abraçada a Claire, observava todos que vinham abraçar Marcus (que estava totalmente inconsolável). Via Chris mais distante fumando um cigarro muito indiferente, mas ainda respondia as pessoas acenando com a cabeça as suas palavras. Não se importando pela morte do pai, menos ainda que havia tirado a oportunidade de Madalena se despedir de Willian.

Madalena era apenas a espectadora de fora da própria família, apenas as senhoras que ela costumava sentar próxima a igreja vieram dar algumas palavras. Foram mal vistas por isso porque se espalhou a fofoca que Madalena havia se escondido e se negou ir ver o tio em leito de morte. Apesar de Marcus e Claire estarem desmentindo, ninguém iria contra Cecília. Então estavam a ignorando por um boato, mesmo que fosse um momento de luto e muito difícil.

O coveiro pediu que se afastassem para fazer o preparo da urna, Madalena (que já estava afastada) não conseguiu ver como o tio foi resumido a algumas gramas de pó. Abaixou o rosto, encarando os pés descalços cobertos apenas por meias compridas . Não tinha sapatos disponíveis que pudesse usar com as unhas quebradas, e o pé que estava mais machucado foi enrolado em faixas de tecido escuro, na altura do tornozelo com uma tala de madeira. Em sua mão esquerda se apoiava com uma muleta dada por Maria (que não estava acompanhando o velório, havia voltado mais cedo para casa por ser sensível a funerais).

O pároco chegava com a aparência muito abatida. Estava com o Rito de Exéquias em uma mão e logo foi trocar palavras com a família. Talvez tenha ignorado Madalena por estar muito distante, encolhida entre as árvores da parte de trás da igreja. Eles fariam orações e homenagens ali, e uma pessoa da família iria levar a urna para o enterro no cemitério. Com Marcus inconsolável e Claire muito nervosa Cecília havia decidido que quem levaria seria Christopher. Que não se importou em nada, mas fingiu ter algum respeito.

Conforme as palavras de orações de discursos estavam sendo dados mais a frente, Madalena estava apenas observando. Sem nenhuma expressão no rosto arranhado e com muito inchaço, não conseguia mais chorar e seu corpo estava muito cansado pela mente abalada. Sentou-se nos bancos de concreto, muito descrente no que estava acontecendo.

- Eu não entendo...- Murmurou quando Marlie chegou perto dela carregando uma mala. A mulher nem precisou ser formalmente demitida para arrumar as coisas e ir embora. Passou para ver Madalena, com quem não tinha uma relação de amizade. Entretanto a viu crescer nos últimos anos que trabalhou para Willian.-Eu fiz de tudo, não entendo porque isso aconteceu...

A mulher suspirou, sentando-se do lado dela e encarando mais a frente à multidão, ouvindo as orações do pároco ao falecido.

-Querida..- Suspirou.- Coisas ruins também acontecem as pessoas que amamos.- Disse a abraçando, fazendo um carinho em sua cabeça de uma forma muito maternal.-A vida funciona dessa forma, pessoas entram e saem dos nossos caminhos. Isso não se restringe a nossa família.

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