10. Serena

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Ainda estou impressionada com a forma que falei com o tal Gustavo na reunião, quando Jô me dá um tapinha nas costas e organiza em palavras o que está passando pela minha cabeça nesse exato momento.

— O que deu em você, Serena? — Ela pergunta, mas seu tom não é negativo, o que me dá um alívio instantâneo por imaginar que é um bom sinal pro meu emprego não estar em jogo — Lançando verdades afiadas bem na lata do cliente, hein? Tô orgulhosa.

Ela está certa. Eu sou muito boa no que faço aqui, que é criar estratégias criativas de marketing personalizadas para nossos clientes, mas, eu costumo ser bem mais contida do que fui hoje, inclusive sou muito mais de criar e apresentar estratégias depois das reuniões do que assim, na hora. Eu normalmente entro muda e saio meio calada desses primeiros contatos. Então consigo entender exatamente por que Jô estranhou minha desenvoltura hoje dessa forma. Não foi nada Serena.

— Me empolguei com o lance da academia — Digo, dando um gole na minha xícara de café de sereia — Meu algoritmo do tik tok resolveu me jogar pra esse lado, então tenho acompanhado muitos conteúdos dessa galera ultimamente. Tava inspirada.

— Que bom te ver assim, depois de tudo — Ela dá mais um tapinha nas minhas costas e sai pela porta de vidro da sala de reuniões.

Quero sair atrás dela e voltar para minha mesa, mas não quero esbarrar em Gustavo que está agora sentado na mesa de Laura, do administrativo, assinando o contrato. Decido ficar por aqui mesmo até a barra estar limpa lá fora, e estou de costas a caminho da minha cadeira cativa na ponta da grande mesa de reunião, quando ouço a batida na porta.

— Posso entrar? — A voz inconfundível atravessa a sala e eu fecho os olhos quando ela perfura os meus ouvidos, me deixando tensa imediatamente. Parece um barulho desagradável que faz aquelas ondas de arrepio atravessarem o corpo, sabe? Como unhas arranhando um quadro negro ou isopor sendo cortado com um estilete.

Me viro no reflexo, e torço pra minha cara não estar desfigurada diante daquela sensação.

— Oi, claro — Não me movo nem tenho nenhuma intenção de me aproximar dele. Mas ele já faz isso por nós dois e caminha rapidamente na minha direção, mas para em uma distância ainda segura.

— Eu queria te dizer que eu não gostei da sua ideia — Sua voz sai séria, arrogante como na primeira vez que a ouvi, pouco menos de 24 horas atrás — Mas vou topar porque Leo faz muita questão dessa nova abordagem e eu vou deixar que ele veja com os próprios olhos que isso não vai funcionar, é bobagem.

— Você não tá falando sério — Eu rio. Tenho vontade de dar um soco na cara dele, mas não seria apropriado, então ao invés disso eu só rio — Você vai gastar o dinheiro da sua própria empresa em uma estratégia que você não acredita que vá funcionar, só pra provar um ponto pro seu amigo? Isso não é demais, até pra alguém como você?

— Sim. Eu tenho como compensar isso depois, dinheiro não é exatamente um problema.

— Uau — Meu queixo cai e eu me esforço em colocá-lo de volta no lugar antes de continuar essa conversa maluca. Deve ser realmente incrível viver em um mundo em que dinheiro não é exatamente um problema. Não é o meu caso, infelizmente.

— Seis meses. Você escolhe a pessoa e disponibiliza um personal para acompanhá-la em todo o processo de treino nesse tempo, e para orientar também em relação a alimentação, roupas, e hábitos saudáveis. Todo o lifestyle que você obviamente tanto ama — Aponto pra ele e deslizo as mãos da cabeça aos pés, — E vamos ver se a pessoa desiste antes dos seis meses, ou, se decide continuar mantendo os novos hábitos pra vida. E o mais importante: Vamos ver se ela inspira outras pessoas a fazerem o mesmo e te deixa ainda mais rico. Não que você precise.

PROJETO VERÃO (degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora