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  Na manhã de terça-feira, quando soube, senti o meu mundo a desmoronar.  O meu pai tivera falecido. O acidente foi muito grande, e o meu pai não aguentou. A família abalou por completo, mas ficamos unidos, como sempre, e tentamos superar a situação. Claro que isso não aconteceu. O meu pai morreu! Como é que supero isso? O pequeno Mikey é talvez o único que ainda não entendeu a gravidade da situação. É uma criança, é normal. Eu, como a segunda mais nova da família, fiquei com a tarefa de ir entreter o puto. 

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  Uma semana tivera passado desde o trágico acidente. Estava na altura de voltar às aulas. Ninguém da escola sabia do sucedido, o que era ótimo, pois iria evitar aqueles olhares cínicos, irritantes. Em cada aula que tive, perguntaram-me o que tinha acontecido para ter faltado tantos dias de seguida. Eu, para ocultar a verdadeira razão, disse que tinha apanhado uma gripe. E foi o que bastou, todos acreditaram. Ou não.

  Segunda era sinónimo de aula de preparação. E eu tinha a certeza que iria estar na lua, como nas aulas anteriores. 

  Quando tocou para a aula, eu já me encontrava no interior da sala. Não tive vontade de sair para o exterior, e enfrentar o chuvoso dia, tão cinzento como o meu interior desde o acidente. Perdida nestes meus pensamentos vagos, não dei pela entrada do professor Stanley. Entrou, fechou a porta e de imediato se dirigiu à sua secretária.

- Charlotte, eu sei que me mentiu. Não esteve doente. Não iria adoecer da noite para o dia. O que se passou? Tem a ver com o acidente? - E BOOM, acertou mesmo na ferida, o que me fez lacrimejar. 

- Sim. - disse eu, desviando o olhar.

- Conte-me. Fiquei preocupado consigo. - Olhou-me nos olhos, tentando invadir todo o meu ser.

  Não consegui dizer nada. Como é que este professor tinha a capacidade de entender que eu lhe menti. Nem Naomi tinha entendido. Nada fiz, até que, por impulso, me levantei e abracei o professor Stanley. Mas. O . Que. É. Que. Eu. Acabara. De. Fazer. ????? Não acredito, quando tomei noção do quão estranho estava a ser aquele abraço recuei. Mas, estranhamente, o professor puxou-me para si e abraçou-me. Que constrangedor. Como estava a sentir-me bem, apesar de estar a estranhar, abracei de volta. Próxima dele, consegui sentir o doce cheiro do seu perfume. Um perfume atrevido, mas delicado. Comecei a chorar. Aquele abraço era o mais perto que eu teria de um abraço reconfortante de família, já que a minha não tivera a ousadia de o fazer. 

  No momento em que nos desapegamos, olhei para o professor Stanley. Senti-me estranhamente bem. Nunca tivera abraçado algum professor, muito menos um professor tão recente. Ele percebeu que eu estava um pouco embaraçada, e rapidamente me disse algo, com a sua voz suave mas imponente:

- Sente-se melhor? - Perguntou, esboçando um sorriso. Ficou com um ar tão doce.

- Estou sim, obrigado, e desculpe! - Respondi, muito baixinho.

- Oiça, Charlotte, não se sinta envergonhada pelo sucedido, - a sua mão tocou no meu braço - eu estarei aqui para a ajudar no que possa!

  Depois destes agradáveis minutos de reconforto, fomos começar a trabalhar. O tempo passou a correr. Quando finalizamos a análise e um excerto de uma obra, já passava uma meia hora do toque final, que nem ouvimos tocar. Mal nos apercebemos, arrumamos rapidamente as nossas coisas e fomos embora. 

  A noite chegara. Chegara bem cedo. Sinais que o Inverno estava cada vez mais próximo. As ruas envolventes ao recinto escolar estavam nuas de veículos, que minutos antes tornavam quase impossível a passagem. É a maravilha do ser humano. 

  Comecei a andar rápido pois começara a chuviscar. Sem casaco ou chapéu, usei a mala como proteção. A chuva intensificava-se cada vez mais. Dei por mim a chorar, parada, a levar com a chuva. Ultimamente andava sensível, chorava a toda a hora. Fiquei ali parada, até ganhar forças para continuar o caminho até casa. De repente, vejo umas luzes aproximarem-se e rapidamente entendo que são simplesmente os faróis de um carro. Um carro que pára a meu lado. Provavelmente queria informações. Abre a janela do carro. É o professor.

- Charlotte, entre, eu levo-a a casa, está a chover torrencialmente. - diz, como em tom de ordem. Eu decido entrar.

- Obrigado, a minha mãe nem se deve ter lembrado de me vir buscar, para variar. - digo, a fim de tentar justificar o porque de ir a pé e sozinha para casa num dia destes.

- Não tem mal... Diga-me onde mora, para eu a levar lá.

  A viagem foi bastante curta, pois moro numas casas relativamente perto do colégio, três/quatro minutos de carro. Nesse pequeno espaço de tempo tive oportunidade de observar a condução dele. Segura, confiante diria até.  Quando parou junto ao meu portão, ficámos uns dois minutos a conversar. Era tão estranho, um professor a deixar-me em casa, um professor a apoiar-me. Na rádio era os Pentatonix que se faziam ouvir. Fiquei a saber que era uma das suas bandas preferidas. Coincidência. Também os adorava.  Despedi-me com um "Até amanhã, muito obrigado professor Stanley." e um sorriso, que me foi retribuído. O carro afastou-se, coloquei a chave no portão e entrei.

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