Capítulo 61 - Silêncio

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Narrador  |  Point of View





O silêncio predominante do quarto de hospital era interrompido apenas pelo ocasional bip de monitores e pelo suave zumbido dos aparelhos médicos. Sentada ao lado da cama, Lena observava Kara, cujo rosto pacífico contrastava com a agitação dos últimos dias. Após ter sido transferida da UTI para o quarto nessa manhã e ter a sedação retirada, havia uma expectativa palpável no ar. Kara, após dois dias sob forte sedação, finalmente teria a chance de acordar.

Lena, em meio a essa espera, dividia seu olhar entre Kara e a tela do seu notebook. Ela estava envolvida em responder a uma enxurrada de e-mails, todos repletos de mensagens de apoio enviadas por amigos e colaboradores de Kara. Cada palavra de encorajamento, cada gesto de carinho, trazia um pouco mais de força para Lena, que tentava se manter firme por ambas.

O quarto, que normalmente carregava a atmosfera fria e estéril característica de hospitais, estava visivelmente transformado. Nos cantos, desenhos coloridos feitos por Lori e Lucca, traziam uma injeção de vida e alegria ao ambiente. Eles retratavam cenas simples, como uma família de mãos dadas, o sol brilhando no céu, flores em vasos. Era uma tentativa ingênua, porém genuína, de trazer um pouco do conforto de casa para aquele espaço.

Além dos desenhos, várias flores, enviadas por amigos preocupados e solidários, adornavam o quarto, espalhando cores vibrantes e um perfume delicado pelo ar. Cada buquê contava uma história de amizade e apoio, lembrando Lena de que, mesmo nos momentos mais difíceis, elas não estavam sozinhas.

Lena sentiu-se tocada por esse carinho todo, mas sua atenção era constantemente roubada pela figura adormecida ao seu lado. Ela segurava a mão de Kara, sentindo o calor e a vida pulsando sob a pele, um lembrete constante de que, apesar dos desafios, havia esperança. A espera pelo momento em que Kara abriria os olhos era angustiante, mas Lena sabia que valeria a pena. Ela estava pronta para enfrentar o que viesse, contanto que pudesse fazê-lo ao lado de sua esposa.

À medida que os segundos se arrastavam, o quarto de hospital, antes imbuído de uma quietude tensa, começava a se preencher com uma nova energia. Kara, em sua luta interna, estava prestes a cruzar a fronteira entre o abismo escuro da inconsciência e o mundo vivido da realidade. Sua mente, embora turva e assolada por pensamentos caóticos, lutava para encontrar algum sentido no que estava acontecendo. Cada pensamento parecia mais pesado que o anterior, uma tempestade furiosa que devastava tudo em seu caminho, deixando-a presa em um turbilhão de emoções e memórias fragmentadas.

O corpo de Kara, um receptáculo de dor e peso, parecia ancorá-la ainda mais nesse estado de confusão. A sensação de imobilidade era avassaladora, cada tentativa de mover-se era como lutar contra correntes invisíveis, que a puxavam de volta para as profundezas de sua própria mente. No entanto, em meio ao caos, uma faísca de determinação acendeu-se dentro dela. Kara sabia que precisava emergir dessa névoa densa, que precisava reencontrar a luz, mesmo que seus olhos resistissem à ideia de se abrirem.

Com um esforço monumental, que exigiu cada partícula de sua vontade, Kara começou a abrir os olhos lentamente. As pálpebras, pesadas como chumbo, resistiam ao movimento, fazendo com que cada milímetro conquistado fosse uma batalha em si. E, quando finalmente conseguiu abrir os olhos, uma sensação de ardência intensa a atingiu, uma cruel lembrança da fragilidade de seu estado.

Os contornos do quarto de hospital começaram a se desenhar lentamente diante de seus olhos, mas a luz suave parecia excessivamente brilhante, agredindo seus sentidos recém-despertados. Tudo era um borrão de cores e formas, um mundo que ela reconhecia, mas que parecia distante e estranho.

Kara se sentia confusa, mas mesmo assim aliviada por não estar mais naquele lugar tenebroso.

Lena, percebendo o sutil movimento ao seu lado, virou-se imediatamente para Kara, um misto de esperança e preocupação estampado em seu rosto. Ao ver os olhos de Kara se abrirem, mesmo que ligeiramente, uma onda de alívio e alegria inundou seu coração.

Resentment - Adaptação KarlenaOnde histórias criam vida. Descubra agora