66 - Eu me apaixonei por você.

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E lá estava ele mais uma vez.

Observando-a.

Era só o que fazia.

Desde que os bombeiros e paramédicos foram em seu socorro.

Ele observou tudo.

O transporte até o hospital, após uma rápida e delicada retirada do carro, porque era mais que óbvio o estado grave em que ela se encontrava. Ele os viu imobilizá-la. Seu pescoço, num colete cervical, sua perna numa tala, e seu corpo, agora, inerte na maca.

Sem compreender ao certo a razão, mas sem questioná-la tampouco, o demônio seguiu o veículo vermelho e branco, que corria apressado pelas avenidas desertas, com as sirenes irritantemente ligadas.

Ele presenciou tudo.

Seguiu cada passo, viu cada movimento feito por médicos e enfermeiros na busca incessante de salvar a vida dela. O caído até mesmo afugentou alguns demônios que buscavam atrapalhar a ação humana quando viu que apenas o protetor da garota não daria conta. Ele lutou, urrou e espantou-os um a um dali.

Quando questionado, pelo anjo encarregado da proteção divina dela, o porquê de estar tentando ajudá-la quando não deveria, o caído apenas se justificou dizendo que seria seu último ato bom. E olhando para a jovem, que desistia pouco a pouco da própria vida, pensou que talvez ela fosse sua última esperança.

Ele estava danificado, quebrado, possuído.

Ela machucada, ferida, magoada.

Ele não tinha salvação.

Ela sim.

E se um deles, ao menos, pudesse ser salvo, ele ficava feliz que fosse ela.

Por isso, inspirando fundo, o demônio se aproximou, se inclinou e cochichou em seu ouvido.

- Volte. Volte, por favor. O Criador ainda te ama. Ama mais que tudo. Ele quer que você seja feliz. Por isso, está te dando uma segunda chance.

Ao se afastar, viu que nada mudara. Na verdade, até os médicos já estavam desistindo (e quase declarando a hora de seu óbito), e sem conseguir deixar isso acontecer, ergueu o rosto para os céus e clamou:

"Senhor, sei que não sou mais digno de ti, mas esta jovem só está perdida. Não sabe o que faz, ou o que fez. Por favor, se não quiser fazer por mim, faça por ela. Ela não merece esse destino. É tudo o que peço"

E baixando seus olhos para ela novamente, tornou a pedir.

- Volte, por favor. Volte para mim.

"Senhor..., por favor"

E assim que se permitiu acariciar os curtos cabelos negros sentiu-a "voltar a vida" ao ouvir.

"O que não concedo a um filho de coração puro e em desespero?"

O caído então pôde, finalmente, dar um meio sorriso quando viu os lábios da garota buscando por ar e os batimentos sendo registrados na máquina cardíaca.

Depois disso, ele a acompanhou por todos os dias em que ficara hospitalizada (a não ser, é claro, quando o demônio dentro de si tomava conta. Quando via que perderia o controle, voava para longe e só retornava depois de recomposto). Viu sua luta, sua revolta, sua depressão, mas finalmente, após achar seu diário (de quando era criança) foi que Heidi pareceu achar um novo propósito.

O caído não desejava, mas quando se deu por conta já chegava junto a janela dela. Ele mal se escorara na parede - do lado de fora - quando a ouviu se pronunciar.

Fallin' ↬ Joshua HongOnde histórias criam vida. Descubra agora