2 - Rude

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CAROLINE

Acordei cedo para o horário britânico, ainda estava sentido um pouco a diferença de fuso horário. O que não era nenhuma surpresa, levando em conta que era apenas meu terceiro dia em Brighton. 

- Carol?!- Ouvi batidas na porta seguido do meu nome sendo gritado, eu sabia que só poderia ser uma pessoa.

- Está acordado essa hora? - Perguntei abrindo a porta para ele, estava se tornando comum estar na presença de Gabriel. 

- Estou, te acordei? - Ele perguntou sentando no sofá. - Gosto de acordar cedo para correr. 

- Você é esquisito. - Me joguei ao seu lado. - E eu já estava acordada. 

- Vim te chamar para isso! 

- Para correr? - Levantei a cabeça para olha-lo. 

- É!

- Você sabe onde fica a porta. - Joguei minha cabeça para trás novamente e ele riu. 

- Vamos, você já acordou mesmo.

- Não tem outros amigos?

- Claro que tenho, mas eles estão dormindo.

- Eu sinto tanta inveja... - Suspirei.

- Fuso?

- Sim. - Respondi apoiando minha cabeça em minha mão. - O quão extrema é essa corrida aí?

- Iniciante, prometo. - Ele estendeu a mão para mim. - Eu só gosto de correr na praia no começo do dia.

- Mal é começo de dia mesmo, são 5:44. 

- Quase lá. - Gabriel deu de ombros. - E aí?

- Tá, tá, tá. - Suspirei me levantando. - Vou trocar de roupa, espera aí.

Ele fingiu bater continência e eu revirei os olhos rindo. Seis e meia em ponto estávamos dentro do elevador, Gabriel me fez comer antes de descermos. Ao passarmos pela porta, lá estava ela. Cabeça baixa como sempre e o cigarro preto em mãos. 

- Bom dia. - Eu desejei em inglês quando passamos por ela. 

Não obtive respostas, nem sequer um acenar de cabeça. "Rude", foi o que pensei. 

- Por que falou com ela? - Gabriel perguntou logo que começamos a correr.

- Tive vontade. - Dei de ombros. - Ela é realmente rude daquele jeito?

- Nunca ouvi sua voz e olha que uma vez já pisei no pé dela sem querer!

- Tem quanto tempo que ela mora lá? 

- Alguns meses. - Ele respondeu casual. - Quase um ano, eu acho. 

Me surpreendi, parecia que todo mundo se conhecia naquele prédio, menos ela. Gabriel mesmo sabia a fofoca de todos os nossos vizinhos, quem traia quem, quem era talarico de quem, chegava a ser impressionante. Achava quase surreal que ele, logo ele, não soubesse nada dela. Nem ao menos seu nome. 

Depois de uma corrida que, para mim, não teve nada de iniciante, voltamos para nosso prédio com garrafas cheias de água em mãos, não havia aguentado esperar chegar em casa e Gabriel me acompanhou. 

- Eu vou sair mais tarde com uns amigos e minha namorada, se você quiser ir. - Ele chamou enquanto subíamos as escadas que davam até a portaria, já podia vê-la de lá.

- Claro! Eu vou achar ótimo conhecer mais gente. 

- Bato na sua porta às 20h. - Ele avisou enquanto abria a porta.

Eu estava um pouco atrás e tive um pequeno vislumbre do rosto da mulher sentada ao lado da porta, ela estava sem boné. Era a primeira vez que a via sem. Podia ver seu rosto apenas de perfil.

- Carol? - Gabriel chamou segurando a porta. 

- Desculpa, estou indo. - Dei uma pequena corrida para alcança-lo. - Você viu? Ela estava sem boné.

- Quem? - Ele perguntou confuso. 

- A fumante misteriosa, como quem? - Perguntei quase indignada. - Você não a  viu?

- Mentira?! Não vi! - Ele exclamou desolado. - Não acredito que perdi isso, sabe quantas vezes já a vi sem boné? Zero!

Eu ri de sua reação enquanto as portas do elevador se abriam. 

- Perdeu sua chance, até mais tarde! - Me despedi saindo do elevador. 

- Até, Carol! - Ele desejou enquanto as portas se fechavam. 

Entrei em casa soltando um suspiro, minha mente me levando diretamente para o perfil da fumante misteriosa. O cigarro não me agradava, mas todo o resto de sua estética era extremamente intrigante. Não podia deixar de me sentir curiosa sobre ela. Batidas na porta me distraíram. 

Estranhei, não poderia ser Gabriel, afinal, havíamos acabado de nos ver. Olhei pelo olho magico, tentando ver quem era, mas tudo que vi foram fios negros e um... boné... Meus olhos se arregalaram, ela estava em minha porta?! Mais batidas foram seguidas e eu me afastei respirando fundo antes de finalmente abrir a porta.

- Você precisa de... - E antes que eu pudesse terminar de falar algo, ela me cortou.

- Você é algum tipo de stalker? - Ela perguntou bem séria e finalmente me olhando nos olhos, seu rosto me era familiar, mas eu não conseguia lembrar exatamente de onde.

- O quê? - Perguntei confusa, sem lhe dar passagem. 

- Quem te mandou aqui? TMZ? MTV? E!? 

E então finalmente me lembrei, na minha frente estava nada mais e nada menos do que Day Limns, a sensação mais recente do rock. 

- Eu... Me desculpa, nossa eu nem sabia que era você. - Pedi sem graça, ela provavelmente devia ter percebido minha encarada mais cedo e o fato de que eu era incapaz de passar ao seu lado sem olhar em sua direção. 

- Está falando sério? - Ela perguntou ainda meio rude.

- Tem como ser mais educada? - Perguntei me estressando. - E sim, estou falando mais do que sério. 

Ela não respondeu mais nada, apenas saiu caminhando em direção ao final do corredor, morávamos no mesmo andar? 

- Sério? Não vai dizer nem um "Desculpa"? - Perguntei parada em minha porta vendo ela se afastar.

- Deveria? - Perguntou parada no corredor. 

- Você meio que foi uma ogra agora mesmo. - A lembrei. 

"Hm" foi tudo que ela disse antes de virar de costas e continuar  andar, logo entrando em seu apartamento. Minha confirmação de que ela era mal educada veio de imediato, não podia acreditar que depois de tanta curiosidade, ela havia sido sanada de uma forma tão esdruxula. 

Resolvi não gastar mais meu tempo pensando nela, já sabia quem era e já estava tudo resolvido. Esperava não ter mais encontros com a tal "Day Limns", finalmente concordando com algumas noticias que a chamava de "simplesmente rude". Era o que ela era mesmo, rude. 

Notas de AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora