Capítulo 16 - Nadando em Águas Profundas

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O caminho até a cabana de Dorothea não foi tão longo quanto pensei que seria.

Enquanto seguia uma Áster muito silenciosa, aproveitei para apreciar a vista. A Corte Outonal é mais bonita do que imaginei que poderia ser e me peguei sorrindo ao longo do caminho tortuoso de pedrinhas, folhas secas e terra úmida. Suas cores são vibrantes e ao mesmo tempo neutras, numa mistura perfeita com vários tons de laranja, verde e marrom. Havia algumas árvores frutíferas por onde passamos e pude experimentar os sabores das maçãs, framboesas, cerejas e ameixas. Quando por fim chegamos na cabana, meu estomago estava cheio e meu paladar satisfeito.

Dorothea nos recebeu da mesma forma como havia feito na primeira vez, rabugenta e pouco amigável. Ela nos ofereceu um chá para nos aquecermos mas Áster não aceitou e preferiu partir, informando que voltaria para me buscar mais tarde. Não tive escolha a não ser me sentar em uma poltrona puída em frente a velha feérica e socializar um pouco, antes de pedir que me ajude com minha magia.

Portanto, estamos sentadas em silencio por quase 10 minutos.

Não percebi que seria tão desconfortável e intimidante ficar a sós com Dorothea e seu olhar penetrante. Esperei que ela desse inicio à conversa, que trouxesse o assunto a tona ou que pelo menos exigisse um pedido de desculpas da minha parte, mas ela simplesmente não disse nada. Aparentemente ela quer que eu tome a iniciativa, o que faz sentido já que sou eu que preciso de sua ajuda.
Respirando fundo, aperto as mãos ao redor da xícara sem asa e tento parecer amigável.

- Gostaria de me desculpar pelo modo como falei com você antes. Eu ainda estava um pouco em choque com a descoberta da minha magia e Eris me trazer aqui de surpresa não ajudou. Sinto muito por ter saído daquela forma.

Dorothea me estudou com olhos sábios e depois um pequeno sorriso irônico se formou nos lábios finos.

- Você não estava em choque, estava apavorada menina. E apenas porque sei disso, não me ofendi nem um pouco. Sei que está aqui para aceitar a oferta de aprender a lidar com seus poderes, mas preciso avisa-la - Dorothea se inclina para frente e tira a xícara das minhas mãos, colocando-a ao lado da que ela mesma usou na mesa baixa entre nós - Não vai ser fácil ou rápido. Precisa estar disposta a sentir dor, pois vamos forçar seu corpo, sua mente e sua magia até o limite.

A velha fixa seu olhar no meu rosto, parecendo ansiosa. Mas o que ela disse não é uma novidade, tenho plena consciência de que tenho um longo caminho pela frente. Não sinto medo, apenas a agitação da ansiedade em meu estômago. Eu quero isso mais do que tudo. Quero voltar para casa, para o meu mundo, meu lar.

- Estou disposta a fazer e suportar qualquer coisa, contanto que no fim eu consiga o que eu quero: voltar para o meu mundo - respondo com firmeza.

O olhar de Dorothea sai de meu rosto e desce preguiçoso até parar em minhas mãos, e sei imediatamente o que ela está encarando. A marca do meu vínculo com Eris.

- Tem certeza que é isso o que quer? - ela provoca.

- Absoluta.

O sorriso dela aumenta, transformando seu rosto em uma expressão felina com as presas pontiagudas à mostra. Se esse é seu sorriso de satisfação, não quero descobrir como Dorothea fica quando está com raiva.

- Então vamos começar, menina - ela se inclina novamente e agarra meus pulsos com força, virando minhas mãos para cima. Engulo minha surpresa e Dorothea desliza as mãos frias sobre as minhas até que nossas palmas estejam alinhadas, me encarando com expectativa - Feche os olhos e busque sua magia. Faça com que ela responda ao seu chamado, mas não deixa-a livre. Agarre com força e a empurre para fora. Vou ajudar a direciona-la.

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