𝟎𝟎𝟒

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🇧🇷 𝟎𝟎𝟒

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🇧🇷 𝟎𝟎𝟒. Um IPhone não-pago e os vinte reais perdidos;

CLARICE LISPECTOR PONTUOU em seu livro, A hora da estrela, que tudo começou com um sim. Uma molécula disse sim para outra molécula e então nasceu a vida. Mas antes de tudo, já havia algo além disso,  assim como já havia o nunca e o sim. No final das contas, sempre houve o sim, e sempre haverá.

Tal citação me deixou com um nó na cabeça quando a ouvi pela primeira vez, no ensino médio. Até quando devemos dizer sim? Até quando o sim é necessário? Até quando a vontade de terceiros se sobressaí diante das suas próprias? Bom, embora o contexto do livro seja completamente diferente — Algo que descobri umas semanas depois—, esse fragmento ressoa em minha mente até agora.

E se eu mandar ele se foder?, penso, mantendo meus olhos fixos na tela extremamente luminosa do meu celular.

Vinte ligações perdidas.

Vinte ligações perdidas depois de três anos sem ver a minha cara, oito meses sem nem mesmo um maldito telefonema e vinte anos de pura ausência e negligência.

— Ah, caralho. — Resmungo, sabendo que haveria mais e mais ligações.

Embora não atender essas chamadas não tenha sido algo proposital, de fato, eu realmente não tinha interesse em encerrar o meu dia perfeito com uma conversa caótica com esse homem, o qual muitos dizem que deveria chamar de pai.

Porra nenhuma. Um pai não te troca pela primeira piranha que surge em sua frente.

— Quem era?

Desvio a atenção do meu celular para a porta do banheiro, fitando a silhueta da loira que estava molhada como um lulu da pomerânia e emburrada como um pinscher. Ela claramente sabia que eu estava esquisita pela quantidade de vezes que olhei meu celular.

— A Vivo cobrando. — Minto, apertando o botão lateral para desligar meu telefone. — Chatos para caralho.

— De noite? — Cruzou os braços em desconfiança, e eu franzi o cenho, a olhando de cima a baixo.

— Desculpe, mãe. — Brinco, arremessando-me na cama como um saco de batatas. — Mas é sério, não é ninguém.

Seu suspiro alto evidenciou a sua desconfiança diante de minha garantia tão fajuta quanto uma nota de três reais.

— Ainda não acredito que você se fez de louca para entrar no paddock. — Diz Gabi, aproximando-se da cabeceira de sua cama, agarrando sua escova de pentear. — Tipo, você ultrapassou os limites da loucura, garota.

Solto uma risada alta, relembrando da reação de minha amiga quando soube.

Saímos do autódromo há mais de três horas, mas, graças ao trânsito louco da capital paulista, chegamos ao hotel há pouco menos do que cinquenta minutos. Nosso tempo no transporte foi resumido em: estresse, xingamentos e surtos.

𝐈𝐏𝐀𝐍𝐄𝐌𝐀 𝐆𝐈𝐑𝐋, Charles LeclercOnde histórias criam vida. Descubra agora