A manhã seguinte seguiu cansativa e quente para a época, era o dia da avaliação para a monitoria.
Dake Albert foi convincente em meu processo de inscrição repentino e agora, eu estava na sala do grêmio, disputando espaço com vinte alunos que roubavam fôlego um dos outros com tanta proximidade.
Fazia vinte e um graus, e a ventilação das salas estava precária.
Como Albert havia dito, o conteúdo era simples e objetivo. No dia anterior, estivemos juntos na biblioteca revisando matérias, o que também havia facilitado meu desempenho.
A monitoria não parecia um projeto interessante, a princípio, mas seria certamente o mais fácil. Eu precisava me preocupar com minhas cartas de admissão para a universidade e melhorar o meu currículo era quase indispensável. Tendo isso em mente, torci para que passasse no teste.
Ao início do intervalo de almoço, Albert e eu decidimos sair para um parque municipal, há duas quadras do Bright.
— Lancaster — Albert chamou, enquanto caminhávamos para fora do colégio —, tudo bem?
— Sim — eu respondi, no entanto, senti que a resposta havia sido pouco convincente. — Sim, estou bem — completei.
— Você parece distraída — ele constatou.
— É que estou com alguns problemas, mas não é nada de mais. Não se preocupe — assegurei. — Onde está Dayse?
— Ah, ela não pode ir. Está preparando uma apresentação de seminário.
— Então vamos ser só nós dois? — questionei, encarando seus olhos castanhos.
— Algum problema com isso?
— Não, claro que não — eu sorri, sendo retribuída de volta.
Chegando ao parque, Albert retirou da bolsa um lençol branco, o qual estendeu sobre o gramado, debaixo de uma Aroeira. O céu azul estava manchado por algumas nuvens, que vez ou outra, cobriam o sol ameno.
Retirei as botas e as coloquei ao lado do lençol estendido, sentando-me logo em seguida.
— E então, você ainda não contou como foi o teste — Albert falou, sentando-se também, ao meu lado.
— Foi como você me disse, bem fácil.
— Viu só? Eu sempre estou certo.
Eu sorri com sua afirmativa, retirando da bolsa uma garrafa pequena de refrigerante.
— Não, você só faz parte do planejamento — retruquei, abrindo-a. — Eu imaginei que teria mais candidatos.
— A adesão foi bem baixa, estamos com problemas de engajamento nas atividades acadêmicas esse ano — Albert deslizou os dedos pelo cabelo despenteado. — Eu e a senhora Kimblr estamos tentando reverter o quadro, mas está complicado.
— Senhora Kimblr? — perguntei, dando um gole do refrigerante em seguida.
— Ela é conselheira acadêmica e trabalha com o grêmio — ele explicou. — Você já deve ter visto, ela usa saias longas e blusa com decote.
— Se já vi, não me lembro — respondi, estendendo a garrafa de refrigerante para ele.
Albert a tomou em mãos e inclinou a cabeça para trás, bebendo dela. Observei seu pomo de adão se movimentando conforme o líquido descia por sua garganta.
— Trouxe umas fatias de pão, se quiser — disse, após voltar a garrafa e eu concordei com a cabeça, sorrindo.
Então ele se virou para alcançar a bolsa do outro lado do lençol e retirou de lá a embalagem com alguns pães de forma integrais.
— Eu sei que talvez você não queira falar — ele voltou a dizer, abrindo o saquinho —, mas quando você disse sobre estar com alguns problemas, não pude deixar de ficar preocupado. Pode ser que ajude se você compartilhar — concluiu, em tom cuidadoso com as palavras, deixando os pães sobre o lençol.
Olhei para o gramado e os chafarizes, que embelezavam a área central do parque, ao longe. Fiquei em silêncio por alguns segundos, escutando apenas o cantar desordenado dos pássaros na árvore, acima de nossas cabeças.
Era certo que Albert e eu estávamos construindo um tipo de vínculo, mas ainda não sabia se poderia confiar nele.
— Olha, eu prometo que morrerá aqui — ele assegurou.
Me voltei para analisar seu rosto, havia traços gentis e receptivos desenhados nele. Os fios de cabelo castanho caíam em sua testa, balançados pelo vento, vez ou outra escondendo os olhos esperançosos por uma resposta.
Então abracei as próprias pernas, me encolhendo.
— Bem... eu e Emily tivemos uma briga — confessei, por fim. — Acho que somos muito diferentes e não sabemos lidar com isso.
— Entendo — ele respondeu, deslizando o olhar pelo parque. — Vocês se falam, pelo menos?
— Nada, acho que estou fugindo dela e ela de mim.
— Mas se são amigas, não deveriam resolver? — perguntou.
Deixei escapar um suspiro e mordi o lábio inferior, pressionando-o.
— Na teoria, sim — repliquei. — É o que os amigos fazem. Só que, pela forma como tudo aconteceu, sinto que não sou adequada para o tipo de companhia que ela quer. Acho que Emily está tentando crescer socialmente e eu sou apenas uma novata meio sem sal, que não vai alavancá-la para ser popular.
Albert riu após minhas palavras.
— Você sem sal? Isso é uma grande modéstia — retrucou. — É uma das garotas mais inteligentes que já conheci.
— Como tem tanta certeza? Nós temos só uma aula juntos — eu o confrontei, pegando um dos pães integrais da embalagem.
— Nós não medimos a inteligência de uma pessoa só pelo meio acadêmico, Lancaster — ele disse. — Dá pra perceber pela forma como ela conversa e como se comporta.
— Hum, não é como se isso valesse alguma coisa para pessoas como Katherine Johnson e companhia — falei, mordendo o pão em seguida.
— Katherine Johnson?
De repente, o rosto de Albert se tornou sombrio e distante, como se minhas palavras tivessem o transportado para alguma realidade cruel dentro de seus pensamentos.
— Sim — eu respondi, tendo a voz abafada pelos restos de pão ainda sendo mastigados dentro da boca. — Algum problema?
— Não, não é isso — ele falou com uma expressão incomodada traindo seus dizeres. — Estou me perguntando de onde você a conhece.
— Bem, Emily convidou ela e algumas outras meninas para verem um conjunto de maquiagem novo e eu estava lá também. Foi daí que começou toda a confusão.
Naquele momento, Albert somente respirou fundo, como se estivesse decepcionado. Esperei que ele dissesse algo ou que perguntasse sobre o acontecido, do contrário ele apenas alertou:
— Cuidado com essas pessoas, Lancaster.
— Por quê? — eu questionei, analisando seu rosto incompassível.
Ele levou uma fatia de pão até a boca, mastigando uma porção de vezes antes de responder:
— Apenas mantenha distância, tudo bem?
Permaneci em silêncio, digerindo suas palavras.
Gostaria de ter perguntado qual a relação entre ele e Johnson para ficar tão visivelmente abalado com a menção de seu nome, entretanto, não me manifestei.
De volta ao Bright, nós nos separamos pela primeira vez com um abraço. Ou um quase-abraço, visto que nossos corpos mal se tocaram.
Não voltei a vê-lo naquele dia, nem mesmo Dayse ou Emily. As aulas daquela tarde preencheram-se de solidão, desânimo e calor.
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Walker
Romance"Naquele instante, memorizei cada traço dele... a curva da boca, os olhos castanho-escuro, os cílios tocando a maçã do rosto e até a rebeldia atraente dos fios platinados. Seu calor invadia meu corpo, alastrando-se e dançando com meu âmago, e ainda...