Uma pequena fresta na cortina deixa entrar um raio de sol que bate em meu rosto, me acordando. O dia está claro e pelo jeito já passam das 8horas da manhã, flexiono os braços a cima da cabeça para me livrar da preguiça e me sento na cama que está vazia. Levanto decidida e vou rumo ao banheiro, hoje vai ser o dia. Tem que ser. Vou retomar as rédeas da minha vida e da minha carreira. Cinco anos é muito tempo para ficar me lamentando, aquilo tudo não foi minha culpa. Não foi. Repito para mim mesma, pela milionésima vez só essa semana.
Tomo um banho quente, me enrolo na toalha e entro no closet, tem alguma coisa errada, muito errada. A minha parte está normal, tudo arrumado como deveria estar, tudo do jeito que deixei a noite quando fui dormir. Volto para o quarto e vejo meus óculos de armação com cordão vermelho em cima da mesinha, minha bolsa está na poltrona, e os meus sapatos jogados em um canto.
- O que está acontecendo aqui?
As portas de Ulisses no closet estão abertas, as gavetas mexidas e vejo que faltam roupas, os cabides estão quase todos vazios, e a mala de viagem sumiu. Visto uma camisa branca e o robe rosa e desço as escadas.
A sala está quase do mesmo jeito, mas ainda faltam coisas, o violão sumiu, a foto da avó dele no dia do nosso casamento também, entre outros objetos pessoais. A campainha toca e eu vou atender, ainda sem entender o que está acontecendo.
- Senhora Ana Carolina Soffredini? - um homem alto de terno cinza escuro pergunta com voz um pouco rouca, eu aceno com a cabeça. - Tenho aqui uma ordem de despejo para a senhora. Em 48 horas esse imóvel tem que ser desocupado.
- Desocupado? Mas essa é a minha casa.
- O imóvel foi vendido, e o prazo de 30 dias para desocupação, termina em 48 horas.
- Vendido? Quem vendeu? - pego ou melhor praticamente arranco o papel da sua mão, e começo a ler.
As palavras se embaralham diante dos meus olhos e eu tenho que ler várias e várias vezes para que comecem a fazer sentido, Ulisses vendeu a nossa casa, e eu tenho que sair.
Um estalo.
Como se um clique dentro do meu cérebro tivesse me despertado para a realidade do que eu estou vendo e vivendo, os armários revirados, os cabides vazios, os objetos desaparecidos, Ulisses enfim se cansou e fugiu com ela. Sim, eu sei que meu marido tem um caso há anos e nunca me importei muito com isso, afinal era só sexo e no final ele era bom pra mim. Pelo menos era isso que eu achava.
Depois de me vestir e me arrumar, entrei no carro e fui até a clinica de Fisioterapia onde trabalhei durante toda a minha carreira e também de onde estou afastada nos últimos cinco anos. Quando o maior nome do futebol nacional, se machucou, Ana Carolina Soffredini era o nome que todos pensaram ser a salvação do joelho direito que iria nos levar ao hexa na próxima Copa do Mundo, mas não foi o que aconteceu, ele forçou demais, exigiu demais do próprio corpo e no fim em um exercício mal executado, ele se lesionou novamente e se aposentou aos 22 anos. Ele era um prodígio e tinha o futuro pela frente, e eu acabei com a carreira dele.
Ao chegar na clinica, eu pude sentir que as coisas eram bem mais sérias do que jamais imaginei. A fachada não exibia mais a enorme placa em mármore branco e letras douradas: "Clínica de Fisioterapia Soffredini" em seu lugar havia apenas as marcas dos parafusos que a prendia no lugar, as luzes estavam apagadas e as portas lacradas com tábuas e correntes.
Senti minha visão escurecer, minhas mãos gelarem, minhas pernas teriam me deixado cair se eu não tivesse sentada. Comecei a hiperventilar e sabia que uma crise estava chegando, com a terapia aprendi a visualizar ela quando se aproxima, era fumaça negra, que me envolve e me domina, senti as garras se infiltrando dentro do carro e se apertando em volta dos meus pulsos, se enrolando em minhas pernas e me mantendo presa, o ar começa a rarear, meu peito sobe e desce rápido enquanto tento me lembrar do que a minha terapeuta disse:
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De Volta ao Amor
FanfictionCarol é uma fisioterapeuta, que após um fracasso profissional, abandonou a carreira durante 5 anos. Casada com Ulisses há mais de 15 anos, ela não estava esperando quando ele vendeu a clínica de fisioterapia, a casa, e limpou as contas no banco do c...