É você que aumenta o tamanho do mundo em mim

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Ainda é tempo - Anavitória ♪

Cena censurada: Clara e Helena se beijam outra vez e bebem vinho (3/5).

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Assim que Clara deu as costas a Aurélio, as lágrimas que antes tinha feito tanto esforço para que não rolassem sobre seu rosto, simplesmente vieram à tona sem que ela fosse capaz de se controlar. Suas mãos tremiam e suavam, enquanto ela sentia o coração pulsar nos ouvidos e o mundo deixar de fazer sentido.

Parecia que tudo ao redor dela tinha explodido e se desintegrado, e que Clara tinha sido jogada ao relento, sobrevivendo forçadamente em meio ao inóspito da inexistência, vagando no vazio sem conseguir se agarrar a nada para se salvar, porque não existia mais nada. E que, mesmo se existisse, ela também não tinha mais força ou via razão para tentar continuar viva.

Até porque Clara tinha esgotado tudo, completamente tudo o que tinha, ao tentar não desabar na frente daquele personal — que ela já nem lembrava mais o nome — e que, ainda assim, o seu tudo não tinha sido o suficiente para impedir sua voz de falhar, quando precisou dar qualquer desculpa para sair daquele lugar antes que sucumbisse.

A única coisa que havia lhe restado tinha sido um pânico desesperador e aterrorizante que parecia se alastrar pelo seu interior, como uma morte lenta e dolorosa, ao mesmo tempo que a consumia num segundo só. Era como se, ao chegar ao seu ápice, não tendo mais para onde se propagar, ele aumentasse sua potência mais e mais a cada instante, fazendo com que Clara achasse que aquele era o pior possível, mas descobrisse logo em seguida que sempre dava para piorar. O que tornava tudo altamente excruciante, mas nunca chegava a matá-la de fato.

Era uma espécie de tortura. Era como se assistir morrendo em fogo lento.

Clara não se achava muito boa com fisionomia. Tudo bem, muito boa era eufemismo. Ela era péssima. No mesmo dia em que conhecia alguém, já esquecia dos seus traços meia hora depois — talvez menos. E se nunca mais o encontrasse ou demorasse demais para vê-lo outra vez, aí é que não lembraria nem que já tinham sido apresentados algum dia.

Na grande maioria das vezes, isso acontecia nos eventos de trabalho do seu marido. Ela até tinha se especializado na arte de fingir conhecer pessoas que sequer se lembrava só para escapar dessas situações embaraçosas. Também já tinha desistido de tentar acertar o nome de alguém porque, tudo bem, talvez fosse menos pior nisso — já que até chegava perto —, mas também nunca acertava.

Era mais seguro esperar que outra pessoa falasse ou então perguntar discretamente a Theo — o que ela preferia não fazer — para evitar uma saia justa. Que nem naquele jantar caótico em que ela chamou a CEO da Bradex, empresa com a qual Theo estava em negociação naquela época, de Melissa ao invés de Elisa. Duas letrinhas a mais e tinha feito um estrago.

Mas, mesmo assim, mesmo tendo todo esse histórico, mesmo tendo a memória péssima, a imagem — não o nome — de Aurélio ficou guardada na sua mente para sempre.

Para Clara, ele tinha sido o portador das más notícias, aquela pessoa que poderia ter passado despercebido por ela em qualquer outro momento, mas que se tornou impossível de ignorar ou esquecer depois de desempenhar um papel tão marcante e significativo — por mais que de forma negativa — na sua história. Aurélio tinha se transformado na personificação do seu maior medo, seu terror encarnado, o anunciador de um golpe que lhe feriu a alma, o presságio da pior coisa que poderia acontecer no pior momento possível.

Se fosse em qualquer outra situação, Clara engoliria aquele bolo na garganta e tentaria suprimir a própria dor até que chegasse em casa e pudesse dar vazão a tudo o que estava sentindo. Ou melhor, até que chegasse em seu quarto para que Rafa não visse nada, de preferência. Apesar de às vezes falhar e acabar chorando no colo do filho, mas tentava ao máximo não expor a ele os momentos em que a tristeza que sentia parecia maior do que ela se achava capaz de suportar.

Tudo O Que Nunca Tiveram | ClarenaOnde histórias criam vida. Descubra agora