É por você que eu vivo

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Santa Rosa estava saindo do papel. Todo o projeto estava sendo desenvolvido de forma limpa e organizada, com foco em políticas públicas  voltadas para melhorias. Claro que construir uma cidade do zero não era uma tarefa fácil. Mas, sinceramente, nem os La Selva e muito menos os Neves gostavam de coisas fáceis.

A 4×4 passou no centro da cidade, que seguia uma arquitetura típica das cidades de Minas Gerais: toda coloridinha, com casas que lembravam a era colonial. O ruivo olhava pela janela, pensando em como era interessante ver aquelas pessoas andando de um lado pro outro apenas vivendo suas vidas; em como as crianças podiam simplesmente brincar na pracinha e correr livres pela cidade.

Tinham planejado apenas uma visita de dois dias à cidadezinha – que fazia Nova Primavera parecer gigante – mas Rams realmente se dedicou e pensou em lugares que queria muito mostrar ao marido.

Os Neves seguiram o rumo de um condomínio pequeno, com no máximo umas dez casas de luxo. Estacionaram bem na frente de uma casa branca de arquitetura moderna que, na cabeça do mais velho, lembrava uma caixa de sapatos com vidros verdes. Mas nunca falaria nada pra irmã: afinal, ela batalhou por aquela casa e ele respeitava isso. 

Kelvin se mexeu agitado no banco do passageiro, descendo do carro com pressa. Ele até iria correr ao encontro da anfitriã, pois estava com saudades da cunhada; mas o rottweiler apelidado de “soja” foi muito mais rápido correndo em direção ao ruivo.

O cachorro latia forte e parecia estar com raiva de Kelvin: a calça brilhosa e barulhenta que estava vestindo, junto com uma jaqueta cinza igualmente cintilante, também não ajudava muito. Assustado, o baixinho deu meia volta correndo em direção ao carro. Quando Rams saiu do lugar do motorista, teve que segurar o cachorro pela guia e tentou acalmar o marido, mas era como se tudo passasse em câmera lenta.

Kelvin tinha as mãos estendidas na altura do rosto; parecia que estava fazendo uma pose de zumbi, mas na verdade apenas morria de pânico do cachorro gigante.

– Ramiro – choramingou – Ele vai me morder aaai! – gritou agudo quando Soja latiu mais alto.

Berenice tinha um Yorkshire que era a coisa mais fofa, perfeita e que se comportava como uma lady quando estava no colo. Kelvin amava a cadela, achava “Britney” uma gracinha super fofa; mas aquele cão gigante que a cunhada tinha –  aquele cão não era de Deus.

Petra saiu da porta gigante de madeira, correndo como os nove meses de gestação permitiam que ela corresse, presenciando o encontro das visitas com o mascote da casa.

Assustado, Kelvin continuou afastado, segurando–se na 4x4 como se ela pudesse o protegê–lo da ameaça canina. Com raiva, encarou a mulher – que, na sua opinião, nunca esteve mais linda. Petra brilhava. Estava muito redonda, mas de forma fofinha e adorável. Tanto, que foi o rosto redondo de Petra até o acalmou um pouco.

– Por que você não tem um cão normal? Um pequeno, tipo um Yorkshire ou um pinscher? 

Ela, que usava um vestidinho verde musgo estilo verão, riu. Segurando a barriga e tapando a boca delicadamente com a mão livre:

– Porque eu já tenho você. – riu mais frouxo, se aproximou do irmão.

Chegou perto o suficiente para abraçar o preto pelos ombros, de um jeito muito rápido com a diferença de altura.

– Oi, Rams.

Ele segurou o cachorro com força, que fazia questão de puxar a guia, e latir mais alto.

– Petra, ocê tá bonita demais.

Ela sorriu tímida, abaixando a cabeça e arrumando o vestido verde soltinho no corpo.

PurgatórioOnde histórias criam vida. Descubra agora