Sombra 11

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Não peço que leves em consideração a forma como vou lhe transmitir minhas palavras acerca da vida, acerca da existência, acerca do mundo e o lirismo com a qual expresso meus recorrentes devaneios. Não peço que se atente a forma lúdica e muitas vezes exagerada que interpreto toda existência, toda a significância, toda a subjetividade e peculiaridade de ocorrências em determinadas instâncias da vida. Posso até ser considerado um tolo, por tratar uma, por muitos considerada, fortuita eventualidade, acontecimento fútil, fugaz acaso corriqueiro de tal forma.
Contudo na condição de poeta. Isso torna-se uma impossibilidade intrínseca.
Eis o mal do poeta: inevitavelmente enxergar a essência dos minuciosos e profundos detalhes de coisas vagas e comuns da vida.
Quer coisas boas, quer coisas ruins.
Quer coisas alegres, quer coisas tristes.
Quer coisas prazerosas, quer coisas maçantes e tediosas.
Quer coisas pequenas, quer coisas grandes.
Coisas sobre a vida, coisas sobre a morte.
O louvor e a tragédia.
Detalhes invisíveis se transformam em hipérboles sob a escrida obstinada de um tenaz poeta.
Um esteta visionário ou um idiota lírico?
Um tolo obcecado ou um sábio reflexivo?
Não! Apenas um humano, demasiado humano.
Atento a detalhes de suas glórias e de seus percalços.
Seus pensamentos furtivos.
A forma lírica de sua existência.
Nenhum detalhe belo e singular é capaz de passar em oculto a seus olhos.
A fugaz queda de uma gota d'água da ponta de uma folha.
A sutil presença de uma pequena flor no parapeito da janela.
Pétalas de determinada flor espalhadas sobre um vasto gramado.
Sutis detalhes da vida.
Desapercebidos por olhos que se ensoberbecem em sua própria futilidade e são cauterizados por sua narcísica  ganância e insignificância existencial.
Detalhes percebidos por aqueles que saboreiam os ricos temperos das instâncias passageiras da vida humana.
Detalhes percebidos por olhos que não vagueiam perdidos e enterrados nas cavernas de sua própria libido.
Essa sina vaga pelos vales de meu recôndito inconsciente.
Materializando-se sobre minha ferrenha e voraz escrita.
Embriagado em encantos.
Me ponho a escrever.
Eis a sina do poeta:
Por vezes transcrevi traços de minha alma em poemas.
Cantei sonetos dos minuciosos detalhes e particularidades do ser e a beleza fumegante que flui de puro interior do céu noturno.
Uma vasta e abrangente nuvem das mais diversas alegorias, metáforas,
Refletindo em detalhes a inefável complexidade da alma.

Hoje vejo um corvo empoleirado sobre um galho de uma árvore,
Que deliberadamente pousa sobre os meus ombros, e sobretudo de forma a expressar demasiado encanto e imponência. 
Canta em meus ouvidos seus últimos e melancólicos dizeres.
E voa para o longínquo céu, levando uma rosa consigo e deixando apenas uma de suas penas para que eu continue escrevendo enquanto o observo voar em direção ao Oriente, até que eu não o veja mais.
Despeço-me! E guardarei tuas preciosas lembranças e todas as coisas que aprendi.
Talvez algum dia em meio às eventualidades fugazes da vida humana, eu te encontre novamente.
Mas por hora...
Apenas adeus!


Fragmentos de uma existência: As sombras do subjetivo Onde histórias criam vida. Descubra agora