Acordei quase dez e meia da noite largada no sofá, ainda de roupa íntima; ouvi um assovio e senti uma brisa gelada, a janela permanecia aberta com as cortinas esvoaçantes. Levantei para fechar e vi o visor do celular acender: Vitor. Meu amigo mais antigo que havia acompanhado cada lágrima derramada, me chamava para uma festinha em seu apartamento.
Dei de ombros vestindo um vestido básico e allstar, peguei celular e chave e subi até o terceiro andar. Diante a porta do 303 bati três vezes. Quando a porta abriu, a música ficou mais audível: The cigarret duet. Entrei sem esperar o convite, já era de casa, me joguei no sofá macio e senti o cansaço das pernas como se tivesse corrido uma maratona.
— Quer beber o que? — Perguntou Vitor sentando ao meu lado.
— O que tiver. — Respondi.
Ele me ofereceu uma lata de cerveja gelada e a porta foi batida outra vez.
— Chamei uns amigos, espero que não se importe. — Ele disse.
Abri o lacre dando de ombros e dei um gole com urgência, a espuma rasgou minha garganta levando a sede. Na frente entra uma mulher: baixinha e com belos seios seguindo um homem alto que me comeu com os olhos. Eles me cumprimentaram e sentaram à minha frente, Vitor trouxe mais cerveja e um pote de petiscos com amendoim e castanhas.
A mulher e vitor conversaram sobre alguma besteira, me atentei mais nos olhos castanhos e no cheiro de agressividade que emanava daquele pedaço de desejo masculino à minha frente. Ele sorriu de forma cafajeste e eu olhei para o lado, me levantei e fui até a cozinha. Abri a geladeira que parecia uma festa adolescente: fumaça, luz e muita bebida. Peguei outra lata e abri ali mesmo, não me importava com o dia de amanhã, minha esperança era que ele não existisse. Ouvi passos e ainda olhando as grades da geladeira sorri debochada.
— Você precisa fazer umas compras mais saudáveis. — Disse me virando.
Não era o Vitor, parei de sorrir.
— Eu sabia que seu sorriso era lindo. — Ele disse. — Vim pegar mais cerveja.
— Pode deixar que eu levo. — Peguei uma grade com seis.
Ele esticou a mão e pegou a grade de minha mão, depois esticou a outra mão me oferecendo um pedaço menor que minha unha de um papel fino e colorido. Franzi a testa me lembrando de quando Chico costumava trazer aquela merda e esconder na carteira, enrolado no papel com salmos bíblicos.
— Experimenta, vai ser legal.
Chico costumava dizer isso antes de passar a noite fora do ar depois de me comer como se eu fosse a única. Olhei por cima do ombro dele, Vitor me observava e silenciosamente me incentivou enquanto ele estava ao lado da garota que não parava de falar. Da mão dele peguei o papel e coloquei no céu da boca. O homem me pegou pela mão e me guiou de volta até o sofá, ele sentou ao meu lado e me envolveu com seus braços enquanto eu sentia a língua começar a formigar e minha cabeça girar.