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S T A S S I E

Cada passo era uma como uma luta contra a exaustão e o frio. Meus pés tropeçavam nas raízes expostas, e eu me agarrava aos troncos das árvores para não cair. A neve caía em flocos grossos, encharcando minhas roupas e penetrando em meus ossos. O vento gelado uivava em meus ouvidos, e meu queixo batia sem parar. Não sabia quanto tempo já estava andando pela floresta gelada. Cada minuto parecia uma hora. Meu corpo tremia muito, Sentia uma dor insuportável na minha cabeça, como se alguém estivesse batendo nela com um martelo.

Eu estava quase sem forças. Meus músculos doíam, e ficava difícil respirar. A neve empilhava ao meu redor, e eu estava com medo de ser enterrado por ela. Fechei os olhos por um instante, para tentar juntar um pouco de força. Sabia que não podia parar. Se eu sentasse, o frio ia tomar conta e eu provavelmente morreria. Com muito esforço, abri os olhos e continuei andando.

Cada respiração era uma tortura. Meus pulmões pareciam estar sendo esmagados a cada puxada de ar, e a dor era quase insuportável. Minha visão estava borrada, como se eu estivesse vendo tudo através de um véu de neve. Meus pés latejavam de dor. Cada passo era um agonia, e eu tropeçava com frequência. Havia me machucado tanto com as pedras e galhos no caminho que mal conseguia me mover. Eu tentava me concentrar no caminho, mas era difícil manter o foco. Minha mente estava nublada pela dor e pelo cansaço

Olhei ao redor sabendo que tinha me afastado o suficiente da casa, mas agora estava perdida em uma floresta escura com animais perigosos que adorariam me transformar em janta. Me perguntei se tudo o que fiz valeu a pena, todo esse esforço para morrer sozinha, agonizando em dor. Tentava não ter pensamentos ruins, mas dada a situação, ficava difícil.

— Por favor.- Implorei olhando para cima, estava com tanto medo.— Por favor, não me deixe morrer.

O frio me obrigava a soluçar sem parar. Olhava para todos os lados, desesperada, buscando por algum sinal de abrigo. Mas tudo que via era neve e escuridão. Barulhos estranhos ecoavam pela floresta, me deixando ainda mais apavorada. A única luz vinha da lua, mas era fraca e não me permitia enxergar muito mais do que um palmo à minha frente.

Na caminhada não vi o galho e meu vestido se prendeu, enquanto eu tentava me livrar dele com a força do puxão, caí no chão com tudo. Um grito desesperado escapou da minha boca, enquanto eu mal podia acreditar no que estava acontecendo. Agora, além da dor na perna, eu tinha um novo corte, no braço. Consegui estancar o sangramento da perna cortando um pedaço do meu vestido, mas agora estava praticamente nua da cintura para baixo, já que o tecido estava todo rasgado.

A neve tornava o solo escorregadio, dificultando ainda mais a caminhada. Eu tentava me equilibrar, mas tropeçava com frequência, caindo com força no chão gelado. A dor era excruciante, e a cada queda eu me sentia mais fraca e sem esperanças.  Dúvidas angustiantes me atingiam em cheio. Será que deveria desistir? Será que o destino já havia traçado meu fim? Deveria aceitar a morte de braços abertos e me entregar ao inevitável, remoendo tudo o que vivi enquanto dava meus últimos suspiros? A imagem de Kylie era a única coisa que me mantinha em pé. O pensamento de reencontrá-la era a única razão pela qual eu ainda não havia desistido. Era como um farol na escuridão, me guiando em meio ao desespero e à dor.

Em meio à nevasca, um brilho tênue e fugaz cortou a escuridão gélida da floresta. Era como um piscar de estrela distante, quase imperceptível, mas que acendeu uma chama de esperança em meu coração. Com o corpo exausto e a alma carregada de desespero, me ergui com a força que me restava e segui em direção àquela luz solitária, como um náufrago buscando o farol da salvação.

A neve caía em meus olhos, me cegando parcialmente e dificultando meus passos vacilantes. Mas a cada passo, a luz se aproximava, se tornando mais forte e definida, como um farol me guiando para longe da morte. Finalmente, após o que pareceram horas eternas, cheguei ao local da luz. Meus olhos se arregalaram de surpresa e incredulidade. Não era uma miragem cruel criada pela minha mente cansada. Era real. Diante de mim, uma estrada de pedra se estendia, coberta por um manto branco de neve, iluminada apenas pela luz fraca da lua. Um único carro, com seus faróis acesos, passava à distância, deixando um rastro de esperança em seu caminho.

Lágrimas de alívio banhavam meu rosto. A esperança, que por um momento me abandonou, voltava a florescer em meu coração. Finalmente, um sinal de que a civilização estava próxima. Com a alma reanimada, observei os arredores. Uma trilha de fumaça subia ao céu do lado esquerdo, indicando a mansão de Samuel. Sabia que não conseguiria ajuda voltando para lá, provavelmente ele já havia acordado e mandado seus cães de guarda me procurarem.  Com um suspiro profundo, iniciei minha caminhada pela direita, na estrada escura e solitária. A neve caía cada vez mais forte, dificultando a visão e meus passos. A cada metro percorrido, sentia o frio penetrar em meus ossos e o cansaço tomar conta do meu corpo.

Eu não sabia quanto tempo havia caminhado, mas a cada metro percorrido, sentia a força me abandonar. Meus olhos estavam pesados, e a visão se turvava. As pernas fraquejaram, e um grito de dor escapou dos meus lábios quando caí de joelhos na neve gélida. Ao olhar para minhas pernas, vi feridas abertas e sangrando. A dor era insuportável, e as lágrimas brotaram dos meus olhos involuntariamente.

Senti um desespero tomar conta de mim. A neve caía cada vez mais forte, cobrindo meu corpo e dificultando minha respiração. A ideia de morrer ali, soterrada pela neve, me aterrorizava. Meus músculos se recusavam a obedecer, e a voz estava fraca demais para gritar por ajuda. Me sentia completamente sozinha e desamparada.

— Anastásia!- Um grito cortou a nevasca.

Era a voz de Kylie, ecoando pela estrada. Ouvi com clareza, tão real que por um momento me questionei se estava delirando. Olhei para o céu, permitindo-me uma risada fraca. Morreria ouvindo sua voz? O universo não poderia ser mais perfeito...

—  Stassie!

Meu corpo tombou na neve gélida, mas meu coração se aqueceu com sua voz. Finalmente, após tanto tempo, a ouvia novamente.  Estava pronta para me entregar à morte. Havia aceitado que não havia saída e minha história acabaria ali, naquela estrada escura e solitária.

Uma sensação de calor me invadiu enquanto meus olhos se recusavam a se abrir. Gritos ecoavam em meus ouvidos, como ecos distantes. Alguém me balançava com delicadeza, como um barco sendo guiado em meio a ondas tempestuosas.

— Stassie, por favor, acorde.- Ela implorava. — Eu preciso de você, meu amor!

Tentei abrir meus olhos, mas as pálpebras pesavam como chumbo. A neve que caía ao meu redor se transformava em um véu branco, me isolando do mundo.

— Kylie?- murmurei, minha voz fraca e rouca.— É você?

Com o coração batendo descompassado, abri meus olhos, desafiando a neve que caía em meu rosto. Mas a cena que vi não era um sonho. Lá estava ela, Kylie, ajoelhada ao meu lado, seus olhos marejados de lágrimas e sua expressão de desespero.

— Sim, meu amor, sou eu. Ela respondeu, apertando minha mão com força. — Estou aqui com você.

Kylie chorava descontroladamente, seus soluços ecoando na quietude da neve. Seus braços envolviam meu corpo com força, como se quisesse me proteger do frio que me consumia. Sua testa repousava sobre a minha, enquanto sussurrava palavras de amor que pareciam melodias distante em meus ouvidos.

— Eu te encontrei, Stassie. -Ela murmurou em meu ouvido. — Eu nunca desisti de você.

Eu queria retribuir suas palavras, queria dizer o quanto a amava, o quanto sua presença me acalmava, mas meu corpo não respondia mais. A força abandonava minhas veias, e a escuridão me cercava, ameaçando me engolir. Meus sentidos se embotavam, e o mundo ao meu redor se tornava um borrão indistinto. Já não sentia a neve que caía sobre meu rosto, nem o frio que penetrava em meus ossos. Tudo o que eu sentia era o calor do corpo de Kylie contra o meu, e a melodia suave de sua voz me embalando em um sono profundo.

Em meio à neblina que obscurecia minha mente, me perguntava se havia morrido. Será que essa era a minha vida após a morte? Ou será que eu estava apenas delirando, presa em um sonho cruel e vívido? As perguntas se amontoavam em minha mente, mas as respostas se esvaíam como a neve derretendo ao sol. Eu estava cansada, fraca, e tudo o que eu queria era descansar, entregar-me à paz que me envolvia. Com um último suspiro, fechei meus olhos e me deixei levar pela escuridão. A voz de Kylie ainda sussurrava em meus ouvidos, mas suas palavras se distanciavam cada vez mais, até se tornarem um eco distante em minha memória.

𝐨𝐫𝐠𝐚𝐬𝐦Onde histórias criam vida. Descubra agora