17. difícil não reparar em cada detalhe seu

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Ana Beatriz
Tatuapé, SP

Observava a vista da janela enquanto a playlist de R&B do Thiago tocava baixinho, deixando um clima leve.

Estamos há alguns minutos do shopping, e essa é a primeira vez que ficamos quietos desde a hora que nos vimos, quando ele foi me buscar em casa. E eu jurei que depois daquele beijo a timidez dele dobraria, e eu ficaria super desconcertada, mas isso não rolou. A primeira coisa que fizemos quando nos vimos foi rir igual idiotas e puxar assuntos aleatórios um atrás do outro.

— Já tem ideia do que a gente pode fazer? — ele perguntou assim que entramos na rua do shopping.

— Eu tô com fome.

Estava dando quase três da tarde, e a minha barriga implorava por comida.

— Almoçou não?

— Eu esqueci que tinha que almoçar, acredita? — Ri de mim mesma.

— Oxi, mano. Quem esquece de comer? — O riso dele saiu nasalado.

— Uma pessoa que mora sozinha. E acontece muito.

— Verdade, né, cê mora sozinha. — Ele pareceu pensar alto.

— Desde os meus dezenove, graças a Deus e ao Kaique!

Nunca esqueço de lembrar que se eu tenho a minha independência hoje, é graças ao Kaique. Sempre que possível, eu tento demonstrar a minha gratidão.

— E você tem agora...?

— Vinte e dois. Tem uns aninhos que eu me viro já.

Vi o Thiago estacionar em uma vaga perto do elevador, e meu lado preguiçoso agradeceu muito.

— Cê mó nova, né?!

— Tenho cara de mais velha? — Tirei meu cinto.

— Pela cara eu chuto que você tem uns vinte e dois mesmo, mas quando conversa com você parece que é mais velha. — Thiago disse todas as palavras me olhando enquanto desligava o carro.

Parecia um movimento simples, mas eu sempre reparo em pessoas que conseguem falar olhando nos olhos.

— Não acho isso da hora. — Confessei sem desviar o olhar.

— E por quê? — Se mostrou curioso de verdade.

— Porque às vezes eu gostaria de ser mais imatura, viver coisas da minha idade, sabe? Mas eu precisei virar adulta cedo demais.

Thiago tinha os olhos completamente atentos em tudo que eu dizia, e ele conseguia ser expressivo.

— Olhando por esse lado, deve ter sido difícil. E é compreensível pra você que teve que assumir uma casa com dezenove. — Ele deu uma pausa, ficando pensativo. — Apesar de eu ajudar a minha mãe sempre com as coisas em casa, minha cabeça era só música e zoar com a rapaziada. Sempre fui molecote.

— Se foi, não é mais. Cê é mais cabeça que muito cara mais velho que eu conheço. — Fui sincera e vi um sorriso tímido brotar no canto da boca dele.

— Mas e aí, a sua família? Eles apoiaram você sair tão nova?

Meu sorriso desmanchou alguns centímetros com a pergunta, mas me esforcei ao máximo pra não demonstrar o meu desconforto.

— Bom, quando eu saí de casa, eu só avisei que tava indo embora e fui. — Dei de ombros como se fosse a coisa mais normal do mundo, mas eu não sou burra e sei que não é. — A gente não tinha e ainda não tem uma boa relação.

Esperei algum desconforto, ou uma cara de pena vindo dele, mas o que eu recebi foi ao contrário. Ele só concordava, parecendo me entender.

— Você tem que me fazer parar de falar, Thiago. Senão eu não paro. — Brinquei tentando quebrar o clima xoxo que ficou.

— Eu gosto de te ouvir falar. — As palavras saíram tão suaves da boca dele, que parecia já ter ensaiado dizer.

— Não dá palco que você se arrepende. — Continuei na tentativa de uma brincadeira, mas ele me olhava tão concentrado que me fez falhar em arrancar alguma risada pra espantar o clima.

Os olhos do Thiago pareciam me tocar enquanto ele deslizava o olhar pelos cantos do meu rosto.

— Tá olhando o quê? — Perguntei tentando disfarçar o quanto aquilo estava me intimidando.

— Você tem um furinho no queixo igual ao meu.

Ele se esticou, tocando com a ponta dos dedos o meu queixo e fez um carinho confortável.

— Só que o seu precisa reparar muito pra ver. — Concluiu subindo os olhos pros meus.

Todas as partes do meu corpo imploravam pra beijar aquele homem, mas me contive.

— Acho que ninguém nunca reparou nisso. Eu mesma até esqueço às vezes. — Deitei a cabeça na cadeira, sem sair da linha dos olhos dele.

— Difícil não reparar em cada detalhe seu. — Ele falou com o tom de voz mais baixo, e eu não sei descrever a sensação que eu tive de ouvir isso.

Me sentia uma adolescente boba.

— Thiago? — Falei no mesmo tom que ele.

— Oi?

— Você não quer me beijar, não? — Perguntei fazendo ele rir por ser algo inesperado.

Eu juro que tentei o máximo manter o flerte, mas eu preciso muito disso.

— Tá querendo pular pro último passo do encontro? — Esticou os braços, fazendo carinho no meu rosto.

Pode parecer patético, mas minha mente deu um estalo de que eu estava mesmo em um encontro.

— E você não quer? — Perguntei desafiadora, sem mover um músculo.

— Tudo que eu mais penso desde que eu parei no seu portão. — Ele confessou se inclinando pra perto.

Foi como um ímã, o meu corpo indo de encontro ao dele e ali finalmente as nossas bocas se juntarem de novo. Meus divertidamente vibravam muito por dentro.

Acho que o beijo dele é um dos meus favoritos.

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