Capítulo 5

93 12 158
                                    

Como de costume, a noite nem acabou quando desisto de tentar dormir. O sono me escapa, cruel e insensível, deixando-me com, no máximo, duas horas de descanso precário por dia. No orfanato, me deram muitas medicações na tentativa de me ajudar a adormecer, pequenas pílulas amargas que deixavam um gosto horrível na boca, como se fossem feitas especialmente para torturar crianças. Na época, eu imaginava que cada uma delas tinha sido criada em algum laboratório sombrio do mal, onde cientistas riam sinistramente enquanto misturavam ingredientes secretos. Aceitava essa tortura na esperança de que fizesse efeito e eu conseguisse ter um pouco de paz e adormecer, mas elas nunca funcionaram.

Desde então, passo horas lutando contra o sono, e quando ele finalmente me vence, adormeço apenas para reviver o pior dia da minha vida. E assim, a batalha recomeça, uma luta incessante para não adormecer e revisitar a dor, a agonia dos meus pais, vê-los dando seu último suspiro enquanto gritam o meu nome "Heaven", e eu permaneço imovél, sem conseguir me mexer, trancada na ferragens daquele carro idiota. Minha mente e meu corpo vivem em uma eterna disputa; não importa quem vence, eu sempre saio perdendo.

Com pensamentos a mil, que parecem nunca cessar, levanto da cama com o coração apertado, envolta em um turbilhão de emoções confusas. Cada manhã é um renascimento doloroso, um despertar para um mundo que perdeu o brilho. Meus passos são pesados, como se cada movimento exigisse uma força que não possuo mais, eu estou tão, mas tão cansada. A escuridão do quarto me envolve, um eco da escuridão dentro de mim. Mas agora, não é apenas o luto que me atormenta. Quando fecho os olhos, um novo rosto surge em minha mente, um rosto diferente dos meus pais, e essa imagem me causa quase um ataque cardíaco, ou pelo menos é o que parece. Meu coração dispara tanto que preciso colocar a mão sobre o peito, tentando acalmá-lo em vão. A lembrança de seus olhos me persegue, um olhar que penetra minhas defesas e me deixa vulnerável de uma maneira que nunca experimentei antes.

Por que ele está invadindo minha mente? Por que todo o meu corpo formiga quando lembro dele? Por que parece que não consigo me controlar quando penso nele? São tantos "porquês", nunca foi assim. Vivi oito anos em um orfanato, conheci muita gente, crianças, adolescentes na puberdade, funcionários e "futuros pais", aqueles casais que nos observavam como se estivessem em uma vitrine onde eles escolhiam o mais bonito para levar para casa, ou então, não escolhiam ninguém, pois nenhuma criança ali era digna deles. E entre tantas pessoas, nunca houve alguém que chamasse minha atenção. Sempre estive tão focada na minha dor que nunca prestei atenção em ninguém. Então, por que agora não consigo parar de pensar nele?

Não faz sentido, não faz nem uma semana que nos conhecemos. Que sentimento, que emoção é essa que está me consumindo, me torturando, me fazendo ansiar por vê-lo, por tocá-lo? Sinto um fogo crescendo dentro de mim, uma chama que me queima por dentro, me fazendo desejar sua presença com uma intensidade que desconheço. O que é isso que estou sentindo? Não pode ser a tal da paixão de que tanto falam. Eu me recuso a acreditar nisso. Jurei sob o túmulo dos meus pais que nunca iria me apaixonar, e eu vou cumprir. Não vou derramar nenhuma lágrima por mais ninguém. Eu não posso, eu... eu não aguentaria passar por isso de novo.

Eu preciso desse emprego. Preciso me manter forte e seguir em frente. Não posso deixar que Caio Lafaiete continue a bagunçar a minha cabeça e balançar esse coração bobo, idiota, que não sabe a hora de parar. Eu vou me manter longe, e eu vou resistir a qualquer que seja esse sentimento tolo. Eu vou conseguir! Preciso conseguir. A sobrevivência é minha única escolha, e meu coração, por mais teimoso que seja, terá que aprender a obedecer à razão.

—------------------------------------------------------------------------------------

Chegando na mansão, começo a limpar os quartos dos hóspedes, tentando focar apenas em meu trabalho e afastar qualquer pensamento sobre ele. Cada passada de pano é uma tentativa de afastar a angústia que teima em me acompanhar. As horas passam voando, e quando percebo Dona Rosa está me observando da porta.

HeavenOnde histórias criam vida. Descubra agora