A manhã surge lentamente, trazendo aquele cansaço que já virou meu velho companheiro. A noite foi mais uma daquelas em que o sono mal chegou e, quando veio, trouxe com ele os pesadelos de sempre. Mas, a noite anterior... Pela primeira vez em oito anos, dormi a noite inteira... E não dormi de qualquer jeito, dormi a noite inteira abraçada com ele. Caio.
Olho para a janela, o céu já começa a clarear, mas a inquietação em mim persiste. Me viro de barriga para cima, olhando para o teto, como se a resposta estivesse escondida em alguma rachadura da pintura. Como posso negar que, pela primeira vez em tanto tempo, algo dentro de mim se acalmou. Algo nele me trouxe paz.
O calor do corpo dele me envolveu, afastando os pesadelos e as lembranças dolorosas que normalmente me assombram. O som da respiração dele, tão calma e constante, foi como uma âncora que me manteve longe dos meus demônios internos. Pela primeira vez desde... tudo, encontrei paz.
Viro de lado na cama, o coração batendo um pouco mais rápido ao me lembrar de como me senti segura nos braços de Caio. É estranho pensar que, por algumas horas, o peso do mundo se dissolveu. Eu me pergunto como algo tão simples, como o toque dele, foi capaz de afastar meus medos mais profundos. Durante todos esses anos, tomei inúmeras medicações, fiz muitas terapias, troquei várias vezes de psicólogos e psiquiatras, e nada foi capaz de me ajudar a dormir, nada, até ele...
Sacudo a cabeça, tentando afastar a sensação confusa que invade meu peito. Preciso colocar um freio nesses pensamentos e na sensação desconfortável que ele provoca em mim.
Mas não é só desconforto. É algo mais, algo que não sei nomear, e que me faz querer fugir e ficar ao mesmo tempo.
O problema é que eu não sei se isso é bom ou perigoso. Talvez um pouco dos dois. Talvez mais do que deveria ser.
Levanto, respiro fundo e me preparo para o dia que, inevitavelmente, me leva de volta à casa de Caio. Isso deveria ser apenas mais uma obrigação. Deveria. Mas agora, depois de tudo, nada mais parece tão simples assim.
A verdade é que, por mais que eu tente afastar o pensamento, Caio está se tornando uma presença constante em mim, e isso me apavora mais do que qualquer pesadelo.
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Estou tirando o pó dos livros na biblioteca, concentrada em afastar os pensamentos confusos sobre Caio. Meus movimentos são automáticos, tentando manter a mente ocupada, mas a sensação de algo fora do lugar não me deixa em paz. Quando coloco o último livro na prateleira, e sinto uma presença atrás de mim. Um calafrio percorre minha espinha, e quando me viro, vejo Natascha se aproximando. Seus saltos ecoam pela sala, e o olhar afiado que ela me lança faz meu corpo enrijecer. Está claro que ela veio para causar confusão.
Ela para bem na minha frente, os braços cruzados, e um sorriso sarcástico curvando seus lábios perfeitos.
— Preciso ter uma conversinha com você, Heaven. Agora! — ela diz, a voz carregada de autoridade, como se não houvesse tempo a perder.
Respiro fundo, tentando manter a calma, mas o olhar dela revela que essa conversa não vai ser nada tranquila. Me viro completamente para ela, cruzando os braços em um reflexo de defesa. Se ela quer confronto, eu não vou recuar.
— Sobre o quê, exatamente? — pergunto, tentando manter a voz indiferente.
— Não se faça de sonsa, Heaven — ela responde, o sorriso malicioso crescendo em seu rosto. — Eu sei muito bem o que você está tentando fazer.
Seus olhos brilham com uma fúria mal disfarçada, e sinto meu estômago se contrair com a insinuação. Mas não me deixo intimidar.
— Tentando fazer o quê? Organizar os livros? — pego um dos volumes da prateleira, balançando-o diante dela. — Sim, sim, sou extremamente perigosa quando estou com um romance nas mãos.
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Heaven
RomanceHeaven viu seus pais morrerem em um trágico acidente de carro aos dez anos, e desde então, sua vida nunca mais foi a mesma. Ela cresceu no Orfanato Esperança e carrega traumas profundos que moldaram sua vida. Aos dezoito anos, ao deixar o orfanato...