4 | Grande velho amigo

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“A curiosidade deveria me levar a descobrir coisas novas e não a cometer tolices.
Como eu consigo sempre estragar tudo?”
— Página 14, diário de Lucy

 
  Fiquei um dia inteiro dentro do meu quarto com a mínima vontade de sair, o que parecia um milagre ou uma surpresa e tanto até para mim que detesta ficar presa.

  Passei a tarde pintando o que viesse a mente e tudo ficava ruim e caótico demais. Ler meus livros me dava dores de cabeça, principalmente as fábulas, por que elas pareciam tão reais em suas palavras?

  E se for real?

  Como poderia não ser se todas as pessoas à minha volta confirmam a verdade, justo eu irei negar o que aqueles que conhecem o mundo muito mais do que eu dizem? Não podia, não devia.

  — Pele queimada, espinhos, olhos vermelhos e asas. — Disse enquanto encarava minha pintura. Tinha tudo isso ali e mais um pouco.

  — Parece mesmo um demônio. — A voz de Ophelia soou no quarto

  A mais nova estava sentada na minha cama com alguns dos meus livros em mãos, já a mim, pintava um quadro que representasse as fábulas.

  Melhor do que palavras são imagens.

  — Talvez eu seja má pintora. — Não tirei os olhos daquele desenho terrível

  — Ou boa demais. Devem ser igualzinhos. — Ophelia riu baixinho

  Soltei o ar e me levantei do banco, removi a tela do cavalete e a deixei de lado. Retirei meu avental e comecei a guardar os materiais de pintura em seus devidos esconderijos.

  — “e ela disse: protejam sua pele!” — Disse a morena recitando um trecho do livro

  — Acha mesmo que comem carne humana? — Sentei me na cama olhando para aquele trecho do livro, ao lado de Lia

  — Não sei, mas na minha não vão tocar. São macias e sensíveis demais para esses monstros. — Sorriu brincalhona enquanto tocava suas bochechas rosadas

  Abri um sorriso fino.
  Até as memórias do calabouço voltarem à minha mente e tudo que ocorreu antes, meu sorriso se desfez velozmente.

  — Ophelia.

  — Sim? — Ela falou sem tirar os olhos do livro

  — Onde estava?

  — Como? — Soltou o livro sobre a cama para me olhar com sua face confusa

  — Quando tudo aconteceu. — Minha expressão se fechou  — Quando Luke fez aquela cena e eu tive que… correr. Onde você estava?

  Ophelia se ajeitou na cama e ficou de frente para mim, com uma expressão mais preocupada do que nunca.

  — Queria ter estado lá, na verdade, não imaginava que isso aconteceria. — Ela coçou o lado de sua nuca, desviando o olhar para depois voltá-lo de novo — Tinha ido ao jardim lateral caminhar com o irmão de Luke. Só soube o que aconteceu quando voltei e vi minha mãe bem… furiosa.

  Meu olhar caiu para minhas mãos, relembrando.

  — Tá tudo bem. A culpa foi minha. — Não mantive contato visual — Deixei meus pensamentos falarem mais alto que a realidade.

  — Eu entendo, tá tudo bem, você é mesmo sempre otimista, suas ideias se conectam nisso. — Ela tocou meus ombros com gentileza

  Meu sorriso voltou a crescer gradualmente.

Alados do SolOnde histórias criam vida. Descubra agora