Sem Lembranças

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rrado pelo Oráculo de Delfos

Eu estava cansado. Quando cheguei no Olimpo, praticamente desabei na poltrona que havia no templo construído para mim. Apolo, por sua vez, concentrou-se em me dar um sermão daqueles. Algo do tipo “Essa maldição te fez perder o juízo também, Delfos?! Será que o sacrifício que faço TODO DIA para te manter seguro não significa nada para você?!” Enfim... só sei que ele passou quase uma hora me dando bronca antes de perceber o quanto eu estava cansado e despedir-se com um “Se você sair sem minha ordem, vai me pagar, entendeu?!”. Depois que ele saiu, tentei relaxar. Tentei esquecer do que ocorrera pela manhã. Tentei dormir. Mas... eu não pude evitar que elas viessem.
Visões.
Elas sempre vêm. Não importa o quanto você tente afastá-las. Se você é um Oráculo... elas sempre vão te perseguir. Sempre tirarão seu sono. Sempre te perturbarão em forma de sonhos conturbados. E se você não souber lidar com elas... você enlouquece. Você enlouquece e... simplesmente não tem mais volta.
“Me vi no submundo. No Tártaro. O cheiro de morte era tão sufocante quanto eu me lembrava. E além de mim... haviam os outros três. Outros três que pareciam lutar ao meu lado contra algo maior. Um ser que emitia um calor insuportável até mesmo para mim. Algo que apesar de ser um ser de luz... emanava pura maldade. Todavia, a parte mais assustadora não era aquilo que nos enfrentava. O mais sufocante... era a sensação. Era aquela sensação de estar perdido. Era a sensação de... não me lembrar de quem eu realmente era”.
Acordei sobressaltado. Estava trêmulo. Algo está vindo. Eu queria falar com Apolo sobre isso. Queria avisar os deuses do que estava para acontecer. Queria... 
Mas a verdade é que... meu pesadelo começou naquele momento. Começou quando acordei.
Em primeiro lugar, o que me fez notar o quanto as coisas ali estavam erradas, foi o silêncio. O Olimpo não é silencioso pela manhã. Assim que Apolo começa sua viagem pelo céu em sua carruagem, (E PELOS DEUSES! Que carruagem barulhenta!) tudo e todos ali despertam e você nota o quão vivo é aquele lugar.
É impossível continuar dormindo até tarde quando se escuta os deuses menores indo de um lado para o outro, as criaturas olimpianas cruzando os céus, Zeus dando ordem ao Conselho Olimpiano, Hermes dando bronca no Sammy por pegar suas sandálias de novo...
Mas, naquele dia, não houve nada disso. Naquele dia, meus sentidos apenas contemplaram o silêncio. O silêncio e... a escuridão.
Aquilo me fez sentir medo. Eu sabia que algo estava muito errado ali. E a julgar pela minha visão... tudo só ia piorar. Vestindo-me depressa, (Não tentem imaginar isso a não ser queiram ter pesadelos, meus jovens. É pra lá de esquisito ver uma múmia trocando de roupa) corri o mais rápido que pude até o palácio de Zeus. Em meu caminho, nada vi além de um Olimpo deserto e sem qualquer sinal de vida. Empurrei os pesados portões que se abriram com um estrondo. Nem me importei. E disparei para o salão principal.
Eles estavam lá. Todos os olimpianos. Mas, ainda assim... Havia algo a mais. Algo errado. Algo... apavorante.
Quando entrei, seus olhares pousaram em mim. Olhares vagos. Olhares confusos. Era como se não me conhecessem.
— Vocês estão bem?! — perguntei, alarmado. Minhas mãos tremiam.
— Hã... Estamos, acho. — Zeus coçou a barba branca como quem tenta entender o que estaria se passando.
— O que há com você, rapaz? — Indagou Apolo. E foi aquela última palavra que me fez sentir ainda mais pavor. Rapaz. Ele nunca me chamara assim. Já me chamara Delfos... Oráculo... Profeta... até pelo meu nome verdadeiro. Mas... Rapaz? Era quase como se... Era como se ele não soubesse quem eu era.
— Milorde... — minha voz tremeu — Não se lembra de mim, senhor?
— Eu devia me lembrar? Não lembro nem de quem eu sou. Como saberei quem você é? E porque me chama de “Senhor"? Eu te governo?
— Febo... — foi como se uma lança tivesse transpassado meu coração sem vida — Pessoal... Vocês não podem ter esquecido! Não podem ter... — meus olhos pousaram em Sammy. Ele não, Santas Parcas! Por favor... Não façam isso comigo! — Sammy...
— Wow... — ele recuou — Então esse aí é meu nome. De onde me conhece?
Eu sentia uma dor excruciante na minha alma. Praguejei silenciosamente por não poder chorar. Se pudesse, desabaria ali mesmo, diante de todo eles, e choraria rios. Sammy... Apolo... Todos ali haviam perdido a memória.
Eu precisava fazer algo. Eu precisava!
— Eu vou resolver isso. — Jurei — Vou trazer vocês de volta, pessoal. — e segurei Sammy pelos ombros — Eu não vou perder você, entendeu?! Não depois de tudo.
Determinado, saí do Olimpo. Saltei lá de cima. E ao cair na terra, ao cair no Reino Dourado, fui para o castelo. Laíres. Eu precisava encontrá-la. Precisava de sua ajuda. Precisava dela.

As Aventuras de Laíres e Fernando na Terra da Imaginação: Do Fim ao Recomeço Onde histórias criam vida. Descubra agora