O Ladrão de Memórias

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Eu perdi alguém que amei outrora. Não consegui lutar contra a morte. Ela... Ela foi mais forte que eu dessa vez. Eu me lembro do seu sangue derramado. Do seu último suspiro. Das suas últimas palavras ditas em um sussurro enquanto ele... enquanto ele padecia em meus braços e tudo que eu podia fazer era chorar.
Era por volta das 8h. Quando acordei em meu quarto no Reino Dourado, o sol já iluminava o aposento inteiro. Um dia lindo. Um dia que tinha tudo para ser maravilhoso e eu torcia para que isso se concretizasse.
Após me vestir, desci as escadas, peguei algo para comer na cozinha e fui procurar os outros.
— Bom dia, pessoal! — saudei quando encontrei o Mestre, a rainha e Zaphenath reunidos na sala do trono
— Bom dia! — Fernando veio sorrindo até mim e me abraçou. Parecia animado. Já os outros...
— Que foi, gente? — Franzi o cenho.
— Eles dizem que querem te mostrar uma coisa. Mas eu não sei o que é.
— Nem vai saber. — Milena o censurou — Agora saia.
— Milena! — Vigart esbravejou — Quer ter mais respeito com meu filho?! Que tipo de rainha é você?!
— Respeito. — Ela repetiu com repugnância — Ele não precisa saber o que se passa aqui. A Flautista tem que saber. Ele não.
— Seja lá o que tiver de me contar, — devolvi, fuzilando-a com um olhar — Fernando não deixará esta sala se não quiser.
— Flautista... — Seus olhos cintilaram.
— Fique, filho. — Pediu Vigart, ignorando a ordem da rainha — Mas só te peço uma coisa, está bem? Não toque.
— Tocar no quê? — nós dois perguntamos. Em resposta, Vigart apontou para um pacote em cima do trono real.
— Pegue-o, Laíres. — pediu — Então saberá do que se trata.
Relutante e ao mesmo tempo curiosa, peguei o pacote e o abri. E, dentro dele...
Dentro dele, estava o livro mais belo que eu já vira. A capa de ouro puro reluzia de um modo lindo e incomum. As folhas de prata reluzente eram magnificas. Que livro era aquele?
— Ai... Meu... Deus! Mas isso é... — Fernando parecia mais admirado que eu. Mais surpreso que eu até — Esse é...
— Sim. — Vigart confirmou — Sim, meu filho. Este... é o Livro do Destino.
— Este é o livro onde o Primeiro Criador escreveu toda a nossa história. — Explicou Mávri Aktina — De todos os Imaginary. Ele foi...
— Foi confeccionado com ouro e prata dos deuses e ilustrado pelos Oráculos. — Completou Zaphenath. Seus olhos brilhavam e um sorriso dançava em seus lábios.
— Isso, filho. — o Mestre caminhou até mim — Todos... menos um. — e sorriu — Você deve ser encarregada de guardar este livro agora. O Primeiro Criador determinou isso.
— Eu não sei nem o que... — estremeci — Não sei nem o que dizer.
— Nem eu! — o músico aproximou-se mais de mim quando abri o livro e o repaginei — Essas ilustrações são...
Mais aí... ele tocou nas páginas. Pegou o livro das minhas mãos e... e aquilo aconteceu.
Suas mãos tocaram o livro e foi como se seu oxigênio tivesse sido sugado. Ofegando em busca de ar, o rapaz tentou afastar-se, mas era como se seu corpo não o obedecesse. Ele continuava virando as páginas. Seus olhos verdes passaram a brilhar num tom dourado.
— Filho! — Vigart tentou tirar o volume das mãos dele, mas recuou com um grito como se tivesse se queimado.
Eu, por outro lado, o segurei pelos ombros e o sacudi. Ele não voltou a si. Era como se sua mente não estivesse ali.
— Ai, meu Deus... — senti lágrimas de medo arderem em meus olhos — Fernando! — Mas ele não me ouvia. Não respondia.
— Aí está o motivo por eu não querer que ele estivesse aqui. — Revirando os olhos, a rainha deixou o aposento. Aquele ato de indiferença me fazendo querer queimá-la viva.
— Acorde, filho! — Vigart chorava de desespero. Aquela foi a primeira vez que vi lágrimas rolarem por seu rosto.
Eu não esperava que aquilo acontecesse. Não esperava que ele respondesse á súplica do pai daquela maneira. Ainda segurando o livro e com os olhos fixos no nada, o Menestrel Douradiano recitou:
“Lá no horizonte onde aponta o amanhã,
avança depressa o exército titã.
O Ladrão de Memórias será o trunfo,
para o poderoso inimigo adquirir triunfo.
Só quando uma vida for tirada, tudo mudará.
O banho de sangue, inevitável será.”

E como que tendo dito tudo que devia, ele largou o livro e desmaiou. Agarrei-o depressa com um arquejo.
— Ai, meu Deus! — Aposto que eu estava mais pálida que ele.
— MAS QUE DROGA! — Vigart estava desesperado. Tirando a varinha do bolso, ele olhou do seu filho para o livro e depois para seu filho de novo — Eu o farei acordar com magia. — Acho que ele disse isso mais para si mesmo que para mim — Se não funcionar, eu destruo essa droga de livro! Não quero nem saber se o Primeiro Criador vai me castigar! — e começou a recitar o encantamento...
— Não, Vigart. Espere. — o pedi para parar. Era estranho o quanto Zaphenath parecia leve em meus braços. Como se eu já tivesse me acostumado ao seu peso — Chame Filipe e Will. É melhor levarmos ele para... a enfermaria. Ele acabou de citar uma profecia. Não fazemos ideia de como a mente dele está agora. E se a magia o afetar?
— Tem razão. — concordou, respirando profundamente — Eu vou chamar os médicos então. Mas se meu filho não acordar...
— Ele vai.
— ... O Primeiro Criador me paga. Ah, se paga! — E saiu á procura dos dois curandeiros.

As Aventuras de Laíres e Fernando na Terra da Imaginação: Do Fim ao Recomeço Onde histórias criam vida. Descubra agora