Por Detrás das Claras
César de Andrada Batista
As reuniões no BOPE foram um inferno. Cada oficial tinha uma opinião sobre o caso, e o silêncio na sala era ensurdecedor. Fui temporariamente afastado das operações de campo enquanto a investigação prosseguia. O advogado garantiu que recorreria e que não seria exonerado, mas as chances não pareciam boas.
— Vamos lutar por você, Capitão. — disse o advogado. — Isso não vai ficar assim. A exoneração não é uma opção.
Sair do batalhão naquela tarde foi um dos momentos mais humilhantes da minha vida. Chutei um armário com raiva, sentindo a frustração correr pelas minhas veias. Peguei minhas coisas e fui direto para a casa da minha mãe ver como estava a Manuela, nessa confusão toda ela estava por lá.
A casa, como sempre, estava cheia. Meus primos, tios, e sobrinhos se reuniam em frente à TV, assistindo ao jornal. Minha mãe estava na cozinha, mexendo na panela.
— Eu sabia que aquela doutora não era coisa boa desde o momento em que vi o rosto dela. — ela disse, sem nem me olhar. — Mulher com cara de problema.
— Mãe, não adianta falar mal da Ana Eulália. — respondi, jogando minha mochila no chão. — Eu quem comecei a confusão. O errado fui eu.
Ela olhou para mim, balançando a cabeça.
— E agora? Vai resolver o quê? A menina tá aqui, sem entender nada. — Disse se referindo a pequena — E você, metido nesse escândalo.
Os primos, vendo o jornal, comentavam sobre as manchetes que diziam que ela queria minha exoneração. Senti o estômago revirar. Eu sabia que ela jamais diria algo assim. Ou talvez dissesse. Tudo estava tão confuso.
Saí de casa chutando o portão, indo parar no bar onde meu pai costumava beber. Ele já estava meio bêbado, como sempre. Pedi uma cerveja e me juntei a ele.
— Soube do que tá acontecendo, filho. — disse ele, enquanto jogávamos sinuca. — Essa mulher tá sendo muito ruim com você. Não acho que devia ir atrás dela. Soube que levou ela em casa.
Tomei um gole longo da cerveja, sentindo o álcool começar a fazer efeito.
— Eu gosto dela, pai. — admiti, a voz baixa. — Gosto tanto que só precisava vê-la de novo, mesmo que fosse pra ela me xingar.
Meu pai riu, balançando a cabeça enquanto preparava a próxima jogada.
— Você tá maluco. Mas quem sou eu pra falar? A vida é complicada, garoto. Muito complicada.
Fiquei olhando para o fundo do copo, perdido nos meus pensamentos. A cerveja estava quente, mas não me importava. Precisava de algo para entorpecer a dor que sentia.
— Pai, você sabia que por trás dessa casca dura, desse uniforme de Capitão do BOPE, existe um garoto? — falei, sem olhar para ele. — Um garoto que ainda sente a dor do abandono e da rejeição desde quando você fugiu para o Amapá e dó retornou quando já estávamos grandes.
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Por Detrás Das Claras | Chay Suede e Alanis Guillen
ChickLitDra. Ana Eulália é uma médica dedicada e autônoma, que trabalha na linha de frente de uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) em uma região periférica do Rio de Janeiro. Sua vida é dedicada a salvar vidas e lutar contra as injustiças sociais, o que...