Amarelo Vibrante com um toque de Azul Apagado

1.2K 148 285
                                    

Conchas, cangas, dinheiro, mais conchas, o alvorecer, Jisung. Era tudo o que meus olhos conseguiam captar, tudo o que minha mente se permitia assimilar.

Não entendia por que Han me arrastava por cada centímetro daquela viela apertada, cheia de pessoas diferentes, falando em línguas variadas. Pele avermelhada pelo recente contato com o sol e sorrisos animados nos rostos – provavelmente turistas. Eles falavam rápido e passavam por nós como vultos, sempre conversando alto sobre assuntos indecifráveis. Eu tinha a impressão de que Han os entendia; de vez em quando, ele olhava para os estrangeiros e ria, e eu o admirava, vendo-o passar pelas pessoas, pedindo licença e se desculpando até em línguas diferentes em seguida, como o belo amuleto social que ele era.

Diferente dele, eu permanecia calado, tentado a não dizer nada, não ceder. Mas a vontade de perguntar sempre me assombrava. Queria saber quantas línguas mais ele conhecia, se ele gostou do colar de conchas que eu confirmei ser mais bonito que o de olho grego quando ele perguntou.

O crepúsculo já tingia o ambiente com seus tons de laranja e amarelo vibrante, anunciando a chegada das trevas e o beijo da lua. Precisávamos visitar os restaurantes em breve, mas Han continuava a sorrir para a atendente de pele negra e boné rosa, que lhe oferecia uma caneca com a imagem de Bob Marley. Os olhos da mulher brilharam quando o carioca finalmente parou em sua barraca, e devo confessar que esses vendedores têm o dom da lábia.

— Acho que vou levar essa para um amigo. — Jisung sorriu, travesso, enquanto olhava para a caneca e começava a fuçar os bolsos à procura do cartão, como já fizera milhares de vezes hoje. Ou esses baianos sabem vender qualquer coisa, ou Jisung não consegue parar quieto com o próprio dinheiro. — Você acha que o Felix vai gostar? — Jisung ergueu a caneca artesanal na altura dos meus olhos e sorriu de novo. Felix? E Bob Marley? Bom, se ele ainda tivesse dezessete anos, talvez... Mas agora, não sei por que Felix gostaria de algo assim.

— Acho que estamos um pouco atrasados, Han. — Liguei o celular para checar a hora mais uma vez. Dezoito horas e alguns minutos. É curioso como a natureza atua: aqui, por exemplo, já está tudo escuro e as estrelas brilham num espetáculo no céu, mas, se estivéssemos em São Paulo, estaríamos sob o céu cinzento da tarde. Jisung revirou os olhos para a minha expressão séria e estendeu o cartão em direção à máquina de pagamento.

— Esse belo homem aqui só tem a cara de meigo, tia, porque nunca vi mais mala. — A vendedora sorriu com o comentário e entregou uma sacola com as compras de Han, todas embaladas. Ele agradeceu e, em seguida, lançou um olhar fulminante na minha direção, ácido como nunca, ao dizer: — Você já foi melhor, paulista. — Meus olhos se estreitaram, sem conseguir desviar dos dele. Eu odeio quando ele age com superioridade, com essa ironia que me irrita, mas ainda assim me conquista, porque foi exatamente essa personalidade que me enlaçou. E é uma luta diária fingir que não me sinto atraído por cada detalhe dele. A mulher negra, de boina rosa choque, camiseta branca simples e calça legging preta, nos observa curiosa. E, como se a situação não pudesse ficar mais estranha, ela solta uma risada escandalosa.

— Ah, esses jovens! Vocês me lembram eu e Carlos Ricardo. O homem era uma mula e eu, uma onça, mas não havia nada mais gostoso que nós dois na cama. Aproveitem a vida, pirralhos, eu juro que vale a pena. — Meu coração disparou. Palavras assim não são comuns. Ouvir uma desconhecida dizer exatamente o que eu não queria ouvir, sentir meu corpo amolecer a cada frase, perceber Jisung ao meu lado, respirando rápido, com as bochechas vermelhas e um sorriso enigmático... Quase como se ele me quisesse. Quase como se desejasse seguir o conselho. Quase como se eu acreditasse nisso. Soltei o ar antes de dizer:

— Bom, acho que agora precisamos mesmo ir, mas obrigada por tudo! — Han saiu do transe e assentiu, aceitando o contato direto das minhas mãos, aceitando trocá-las, aceitando ser guiado por elas até os restaurantes. E ele não disse nada o tempo todo, mas eu podia sentir a umidade em sua pele, a respiração ainda irregular e os pensamentos silenciosos que ele não precisava expressar, porque eu o ouvia, tão claro como qualquer fala.

Porto Seguro Onde histórias criam vida. Descubra agora