Eu desmaiei antes de beijar Cassandra.
Por alguns segundos, o suficiente para eu tombar para a frente, deitando a cabeça no seu ombro e acordar com meu nome sussurrado de perto. A memória veio rápido e acho que senti dor física de tanta vergonha. Levantei o rosto, olhei bem nos olhos de Cassandra e quis desaparecer.
Por outro lado, Cassandra só perguntou se eu estava bem e fingiu que nada aconteceu. Deitou novamente, me puxou para si como estávamos e dedilhou seus dedos pela minha pele até que eu dormisse. Nada. Não riu, debochou, estranhou, julgou... nada.
Não tocou no assunto de manhã, antes de eu ir embora. E nem citou nada disso desde então, por mensagem. Parece agir como se a noite em que eu desmaiei na sua frente não existiu. Um buraco vazio no meio do nada. E apesar de ainda estar envergonhada pela situação, preferia que ela tivesse dito alguma coisa. Nem que fosse uma mensagem ou "você ainda está pensando naquilo?".
Então, torna nossa interação tão... esquisita.
Agora, estou imaginando o que ela diria. "Eu sou a garota com coração defeituoso, mas é você quem desmaia", cogito em uma das encenações. Na outra, ela cai na gargalhada e eu vou embora do hospital de madrugada — em direção a rodoviária, claro. Mas essas simulações pós-demaio não são importantes.
Passei uma semana inteira pensando no beijo de Noemi. Como seria se eu tivesse a beijado. O tempo inteiro, cada segundo.
E agora esqueci.
Mais ou menos. Eu ainda me lembro de como estávamos sentadas no sofá, mas... não é ela mais.
É Cassandra e os beijos são diferentes.
Um beijo é bom, os lábios dela são macios e o gosto é viciante. Ainda sim, quando termina, a gente continua a conversar como se nada tivesse acontecido. Em outro, tem gosto forte de limão, do tipo que preciso me esforçar muito para não fazer cara de nojo quando me afasto. Azedo. Em outro, ela põe a mão debaixo da minha camiseta enquanto me beija e eu na sua. É esquisito, acho que não tenho imaginação o suficiente para fazer um beijo quente.
Não é o que mais me incomoda também. Nenhum deles.
É a imaginação que completa apenas a cena real. Cassandra está perto de mim, eu estou com a voz falha e o coração batendo forte. Ela tira meus óculos, pergunta se pode e... eu não desmaio. Sinto seus lábios (eu não lembro a sensação deles, foi rápido demais) e nos beijamos.
Em cima de uma cama hospitalar, sentindo o acesso do braço de Cassandra quando ela coloca sua mão em minha cintura.
Ainda bem que não a beijei.
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Camarão sem coração ⚢
RomanceBelém Martins quer se vista. Não por qualquer um, mas pelos pais - que nunca estão por perto. Quando o natal chega, ela tem um plano para chamar um pouco de atenção e conseguir um almoço em família. Um camarão, uma crise alérgica e um telefone deses...