6 de Junho
Má notícia: você não para de pensar em um problema só porque acha que já tem problemas demais para falar na terapia.
Cassandra parou de flertar comigo. Eu percebi isso, senti isso. Mas acho que depois que percebi, estive o tempo inteiro focado em outras coisas que essa questão acabou ficando de lado. E ela não está me tratando mal, então não tinha porquê se chatear. É, mas agora o incômodo voltou.
Principalmente porque quando saio do hospital, sinto que Cassandra está me empurrando para outra garota. Sim, eu poderia pensar que ela só quer me ajudar a me entender, mas não consigo. É só um palpite, talvez uma paranoia idiota. Como não posso tirá-la à força, não paro de pensar.
E pior: estou chateada. Tudo bem, eu fiquei triste quando percebi sobre os flertes, mas agora é diferente. Parece que o sentimento ficou menos abstrato e me incomoda mais. Penso em enviar uma mensagem dizendo "eu não gosto de você", mas me sinto idiota. "Não é legal que você me empurre para outra pessoa só porque acha que estou interessada em você, Cassandra. E não, eu não estou".
Planejo, planejo e... tenho medo de admitir que estou pensando nisso. Em teoria, não deveria me importar. Os flertes não são de verdade, eu não sinto nada por ela e Cassandra me trata bem demais para soar como se estivesse me repelindo. Eu não quero pensar nisso. Não quero.
Mas eu penso. E muito. E surge mais e mais sentimentos abstratos que eu não sei o que significam.
Para piorar, entendo o que Cassandra quis dizer com "remarque as aulas práticas" e "nos vemos semana que vem". O remédio me destroi nos primeiros dias. Mal me levanto da cama, sinto tontura e vomito boa parte do que comi.
Depois, também me sinto vazia como um balão furado. Fico por um triz de pensar "é, talvez a medicação realmente não seja para mim", mas os dois fiscais da casa me impedem de parar. E fazem sopa encorpada de carne com legumes, meu primeiro ânimo na semana.
— Eu realmente não sei porque estou chateada. Será que a terapeuta vai me julgar se eu trouxer um probleminha pequeno na próxima sessão ao invés de problemas gigantescos?
Estou deitada no sofá com as pernas para o alto, no encosto. Mavi está sentado no chão, sabe se lá o porquê, e Andressa ao meu lado. Contei a situação, ainda que eu ainda sinta um certo receio de ser julgada ou empurrada para uma decisão que ainda não entendi.
— Não sei, eu também ficaria chateada se minha amiga começasse a me negar indiretamente — Andressa diz. — Ia ficar me policiando para não dar pinta demais.
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Camarão sem coração ⚢
RomanceBelém Martins quer se vista. Não por qualquer um, mas pelos pais - que nunca estão por perto. Quando o natal chega, ela tem um plano para chamar um pouco de atenção e conseguir um almoço em família. Um camarão, uma crise alérgica e um telefone deses...