model | chris sturniolo

61.

As luzes do quarto eram mínimas, o olhar de Mia caía sob o espelho em sua frente, observando o coque desleixado de seu cabelo e um dos seios escapando pela regata de pijama azul bebê. Puxou o tecido de volta ao lugar, sem muita reação, sentindo a pele do rosto arder depois de tanto chorar.

Não chorou de tristeza por um segundo
se quer, chorou apenas de raiva.

Percebeu esse ciclo que parecia eterno, de ser machucada logo quando sentia-se tão próxima da real cura de outra ferida passada. Sempre estancando os sangramentos, sempre assoprando os ralados dos cotovelos.

Parte de si buscava explicações racionais para aquilo, que não fossem algo como "Christopher mentiu. Ponto final." E simplesmente não conseguia acha-las.

Era uma e meia da manhã. Cassie estava dormindo, percebeu que a irmã não estava bem, mas não fez mais perguntas. Tinham só trinta minutos que Blake mandara aquelas mensagens, e elas mudavam tudo que havia acontecido nos últimos dias. Diante das palavras da garota, achava improvável que tivesse sido traída no sentido comum da coisa, mas isso não a tranquilizava em nada.

Podia não ter ocorrido nenhum beijo, malícia ou sexo, mas no fim, Christopher mentiu. Ponto final.

Poucos minutos depois da troca de mensagens com Reed, Huang ligou para ele, que atendeu meio desnorteado como alguém que começava a entrar em sono profundo e fora despertado do nada. As palavras ecoaram do outro lado do telefone, rápidas, sem mais rodeios.

- Eu preciso que venha até aqui pra conversarmos. - Ela disse dura, apesar da vontade de cair no choro outra vez. - E se não conversar comigo agora, não vai conversar nunca mais.

Talvez ela estivesse sendo dramática, mas não conseguia fingir que tudo estava minimamente bem. Eram semanas e meses recuperando a confiança nas pessoas, em si mesma, em Christopher, em Cassie. Eram semanas e meses reaprendendo a demonstrar afeto para com outras pessoas sem o medo de ser rejeitada. Então em uma quinta-feira qualquer ela descobre que seu (seja lá o que Chris Sturniolo era a esta altura), mentiu descaradamente.

Desligou a chamada, sem chance de resposta ao outro que, em segundos digitou apenas duas mensagens

chris 🎸
me desculpa
tô indo pra aí

E agora aquele nó nas artérias parecia apertar cada vez mais, a garganta mais seca ainda, uma sensação apavorante de estar perto de presenciar o final horrível de algo bonito. Não porque ela desejava que acabasse, mas porque as mentiras tem um poder destrutivo inexplicável.

Depois de algum tempo com apenas o vento soprando na janela e o puro silêncio na rua, ela escutou um carro atravessando a escuridão e parando em frente ao prédio. Chris enviou uma mensagem, ela permitiu que o portão principal fosse liberado e esperou no corredor, até que os passos saindo do elevador a lembrassem que ele realmente chegara.

Sua respiração tornou-se atropelada, nem acreditava em coisa alguma mas quase rezava para não entrar em crise logo agora. O elevador se abriu no barulho emperrado clássico e foram só onze passos até parar na porta de entrada. Não tocou a campainha, apenas esperou Mia, que na ponta dos pés seguiu para abrir.

Eles trocaram olhares rápidos, ela sussurrou para que ele seguisse até seu quarto. Andy e Cassie estavam ferrados no sono ali na sala de estar que ainda tinha um leve cheiro de tinta. Cada segundo levado para atravessar o corredor pareceu horas, com a mais velha poucos centímetros atrás, seus olhos caindo pelas costas de Christopher que vestia um casaco cinza.

Mia fechou a porta do quarto, talvez pela primeira vez desde que decidira adotar um gato ou ter uma irmã com a perna quebrada em sua casa. O oxigênio parecia denso, o olhar dele era apavorado para dizer no mínimo.