11. Refém

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Margaret:

Despertava de um pesadelo. Imagens manchadas de sangue e poeira surgiam, eu me via arrastando uma mulher loira morta. Deslocava seu corpo pela terra, numa trilha de vísceras, eu e ela éramos engolidas pela neblina e tudo ao nosso redor se corrompia em culpa e horror.

Essa alucinação absurda não era um pesadelo. Foi real... Sentia tanta culpa que acreditava ser punida pela minha estupidez, castigada pelo impulso de seguir um desconhecido até a beira do inferno e ser levada junto com ele.

Após ser obrigada a carregar e desovar um cadáver, ter um revólver apontado na cabeça e ser pressionada de várias formas, concluí que aquela era a pior noite da minha vida e que estava fadada a suportar Evan, ou as consequências seriam trágicas.

Estava em um porão. Nunca estive naquele ambiente antes e a última coisa que me
recordava era de estar dentro do furgão de Evan, tentar fugir e ele me segurar. Depois, a
escuridão... O desgraçado deve ter me desacordado com algum componente químico e me prendeu.

Me levantei da cama e uma tontura latejante me fez hesitar. Ponderei por minutos parada
procurando acalmar a respiração. Ao me recompor, analisei o local. Era um porão de teto baixo, inteiro revestido de parede antirruídos brancas encardidas, sem saída de ar ou janela exceto um pequeno exaustor.

Havia uma única lâmpada pendurada no centro, e no teto havia a saída que deveria ser a porta. No canto, tinha uma divisória. Entrei nesse repartimento e encontrei a privada sem tampa, papel higiênico em cima da descarga, e ao lado havia o chuveiro sem box. Tudo miserável, embora estivesse limpo, me ver naquelas condições e sem saída me causou uma claustrofobia insuportável.

Encostei na parede e tolerei a falta de ar. Novamente ponderei a respiração, estava prestes a ter um surto de pânico... Segurei minha cabeça com as mãos e ouvi um grito estridente, ecoando pelas paredes acolchoadas, repercutindo de dentro pra fora de mim. Eu gritava, berrava com todas as forças e só me dei conta depois.

Meu surto se prolongou, gritei até a voz ficar rouca lembrando com pesar de minha irmã e
seus alertas para ir embora com ela... Exausta e desistente, deitei na cama e me permiti chorar de angústia, ódio, frustração e repulsa de mim mesma, até perder a consciência por fraqueza.

Ao acordar pela segunda vez, senti uma presença. Era a presença típica que sentia quando ele me observava, mesmo que de longe, mas dessa vez essa energia carregada estava perto, tão perto que me comprimia. Sentei-me, sonolenta e perdida, e minha visão focou Evan de pé me olhando.

Meu coração doeu quando minhas vistas focalizaram seu sorriso. Era seu sorriso
presunçoso, quase arrogante, de quem sabe que tem o controle de todas as coisas.

Comigo não seria assim... eu fui idiota uma vez, não seria novamente. Num furor repentino, saltei pra cima dele. Poderia matá-lo, só queria agarrar o seu pescoço com minhas mãos e apertar, até ver o ar findando. Me joguei contra o seu corpo, inesperadamente, e Evan tombou pra trás, surpreso com o ataque.

Eu caí pra cima dele e rosnei de fúria. Ele tentou me segurar, mas na adrenalina comecei a estapeá-lo em todos os locais que alcançava. Era óbvio que mal pensava direito no que fazia ou nas consequências, no entanto, não me importava de morrer, contanto que o matasse também!

Fui surpreendida quando Evan agarrou meus pulsos, conseguindo me reprimir, virou-se e
inverteu nossas posições. Ficou por cima e me imobilizou, pressionando meus punhos
contra o chão. Senti a dor do aperto e o peso de seus joelhos contra minhas pernas. Gritei alto, e mais alto, me debati, me contorci, me dobrei e me contrai até meus músculos queimarem, até minha alma se esgoelar em sincronia com a voz, com dor e pânico.

E tudo se tornou silêncio quando ele soltou um dos meus pulsos para virar um tapa tão forte
contra minha face, que por um segundo, a escuridão me sorveu de novo, o fôlego se perdeu e eu pedi para que a morte me levasse... porque nada poderia ser pior que isso...

Porém, eu ainda estava lá. Viva, desperta, sob seu peso. Agora parada e impossibilitada de me mexer, me defender, me livrar dele.

- Me solta... - murmurei, consumida pela impotência. - M-me solta...

- Não! - ele exclamou contra mim, rouco de nervoso. - Não vou soltar porra nenhuma
enquanto você não parar quieta!!

Ofegante de raiva, através das mechas do meu cabelo, eu o encarei. Sentia a sua respiração quente, tão furioso quanto eu. Pela primeira vez o vendo em um local iluminado, reparei suas olheiras fundas e marcadas. Onde em sã consciência eu fui capaz de pensar que esse cara seria uma boa pessoa?? Os
cabelos azuis estavam bagunçados tbm, escorridos pelas laterais da face, notava que não eram bem tingidos, possuíam a raiz castanho claro aparente. A rala barba clara crescia no rosto juvenil... e foi então que me lembrei o motivo de gostar de ser perseguida por ele, ao mergulhar no vazio dos olhos castanhos. Tinha algo naqueles olhos... algo indecifrável, doentio e misterioso, que de longe me atraíam, de perto me aterrorizavam.

O sorriso pretensioso voltou no seu semblante ao notar que eu baixava a guarda e me acalmava. Ele me soltou e se levantou. Me coloquei de pé rapidamente também, retornando à feição de rancor.

- Desgraçado...

- Se você surtar assim, eu vou te bater de novo.

- Se você levantar a mão pra mim de novo, eu não sei o que vou fazer mas eu juro que vou te foder tanto!!

Ele riu pra minha ameaça.

- Ah não, Margaret. Você não vai me foder, sabe por que? Porque eu tô no controle aqui.

- Por enquanto.

Ignorando minha última frase, se afastou e foi pra divisória onde era o banheiro. Ouvi o barulho do chuveiro abrindo e a água caindo de encontro ao chão. Ele voltou e apontou.

- Vai tomar banho, quero te ver. - mandou, simplesmente.

- Que???

- Não me faça repetir. Eu sei que você ouviu muito bem.

Permaneci quieta, perplexa demais pra coordenar meus pensamentos ou pra dizer algo.

- Agora, Margaret. Tira a roupa e vai pro banho. Você tá suja ainda. É só fingir que não tô aqui.

Fechei os punhos com as unhas quase afundando nas palmas. Friccionei a mandíbula com tanta força que senti gosto de sangue. Fitava-o abismada com a ordem. O que eu faria??

Ele esperava com seu olhar predatório, e sem alternativas constatava que eu era a sua refém e estava à mercê de Evan, inteiramente.

Voyeur || Evan Peters Onde histórias criam vida. Descubra agora