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Maria

— Podemos conhecer a cidade, amiga. A reunião ainda vai demorar, o que acha? Achamos um restaurante com comida caseira e almoçamos lá. Temos que aproveitar para passear também.

Realmente precisava de um passeio, então resolvi sair com Angélica, quando colocamos os pés para fora da casa de Pedro, os olhares dos moradores mostrou que éramos diferentes demais para eles. Pedro justificou que era por não saírem tanto para fora da vila, mesmo assim, não me sinto bem com todos esses olhares sob nós.

— Não liguei para eles, amiga, eu já estou acostumada com os olhares, logo se acostuma também, Mari.

— É estranho. Não sei, parece que essas pessoas não tem muita convivência com outros de fora daqui ou só sejam preconceituosos mesmo. Você sabe como odeio gente assim.

— Percebeu que a grande maioria é branco caucasiano? Esse pessoal não vê pessoas pretas com frequência, amiga. Não sou uma pessoa preta, mas pareço um unicórnio, só falta o chifre na testa. Eu não estou nem aí, e você deveria pensar como eu. Agora vamos, quero bater perna na cidade, tenho certeza que o passeio será perfeito.

Entramos dentro do carro indo na direção da cidadezinha turística, assim que carro entra na cidade sinto uma energia diferente, vejo o porto, as bancas, a música e sinto os cheiros bons de tempero e comida, tudo isso causam um certo frenesi em mim.

Angélica percebe como aquele lugar me atrai e para o carro próximo de um bar, uma música alta tocava enquanto várias pessoas dançavam, desci do carro, ficando na calçada paralisada com a cena na minha frente.

— Amiga, está tudo bem?

— Eu não sei! Parece que já estive aqui, dançando e feliz, estou ficando louca, Angel?

Ela segurou minha mão, me puxando até o bar, começou a dançar comigo como se sentisse que eu precisava disso. Ainda estou impactada mas continuei dançando com Angel, de repente vejo uma mulher morena de grandes cabelos negros dançando no meio das pessoas, ela para ao me ver e de repente desmaia.

Todos pararam com a música indo até a moça para ajudá-la, meu coração disparou ao vê-la como se uma energia diferente estivesse pairando ao meu redor. Senti uma tontura sendo amparada por Angel, que me ajudou a sentar na calçada.

— Amiga, vamos comer alguma coisa, você está pálida, deve ser por conta da fome.

Antes que pudéssemos ir embora olhei para trás, preocupada com a moça que passou mal, mas sentindo uma sensação diferente de familiaridade com ela, deve ser com certeza alguma loucura da minha cabeça. Estou começando a pensar que realmente tenho uma ligação forte com esse lugar.

Basemate

O movimento de hoje está excelente, a banda contratada para tocar samba e pagode trouxe uma multidão com o som dos pandeiros, cavaquinhos e voz. Felicidade fez um sinal para mim mostrando o movimento, minha filha adotiva é muda, ela ouvi bem, simplesmente não fala.

A levei em alguns especialistas que acreditam que o problema na fala esteja ligado ao psicológico, já que ela escuta muito bem. Felicidade não consegue falar, apesar dos tratamentos humanos e até os feitiços que faço não adiantaram de nada, decidi parar de insistir, no momento certo, ela vai falar.

Ela sabe fazer a linguagem de sinais perfeitamente, e por ela aprendi a fazer, vejo seu sorriso inocente e bom enquanto dança ao som da música. Só de pensar que aqueles lobos queriam machucar ela, fico louca. Minha menina já passou por tanta coisa nessa vida, os pais dela eram meus primos, faleceram a deixando órfã muito jovem.

Felicidade é descendente direta de Imaculada da Conceição assim como eu, somos primas. Imaculada foi a escrava de ganho que comprou a liberdade de muitos escravos, não teve filhos mas seus irmãos tiveram muitos, os descendentes deles fazem parte da nossa comunidade de bruxas.

— Vem, mãe!

Felicidade faz o sinal com as mãos pedindo para que venha dançar, saio do balcão indo até a roda para dançar, de repente a vejo, eu reconheceria ela em qualquer lugar, meu coração disparou, não consegui conter a emoção. Imaculada está aqui, sinto uma tontura e acabo desmaiando.

Sinto os braços da minha filha me amparando enquanto percebo os olhares das outras pessoas, procurei por ela no meio da multidão não encontrando seus olhos amendoados como no quadro.

— Pessoal, vamos dar espaço para ela respirar.

Vitor segurou meu rosto recitando um feitiço para acalmar meus nervos, ele é o segundo no comando das bruxas, responsável por ensinar as crianças e adolescentes a descobrirem seus poderes e a lidar com eles.

Além de ser meu irmão querido, somos gêmeos portanto nossa ligação é muito grande. Ele sabia que era algo sério, nada me faria ficar tão fora do eixo somente algo como o retorno de Imaculada. Ela não poderia voltar, justo para esse lugar.

Logo um flash vem na minha mente. O maldito lobo a encontrou, por isso, o sentimento diferente quando fui até a matilha, ele não pode ficar com ela, tenho certeza que fará o mesmo novamente.

Aqueles malditos lobos são corjas malditas que destroem tudo que é belo e doce, eles tentaram tirar minha menininha especial, cercando Felicidade na escola, sei o que são capazes inclusive usando de humilhações e crueldades para tirar a essência das humanas com quem acasalam.

Imaculada se matou por causa daquele amaldiçoado e sua crueldade, a queria para usar até que não tivesse nada para aproveitar. Eu não vou permitir que ele faça de novo, levanto com a ajuda do meu irmão procurando por Imaculada.

— O que foi, irmã?

Entrei dentro do bar sendo seguida por várias pessoas, somente depois que disse estava bem o pessoal foi dispersando, ficando só eu, meu irmão e Felicidade.

— Filha, a mãe está bem, vai lá fora e ajude com as pessoas. Preciso conversar com seu tio.

Ela não queria sair, mas depois do tio dizer que estava tudo bem, Felicidade beijou meu rosto e foi para o lado de fora.

— Irmã, o que houve?

— Imaculada voltou do mundo dos espíritos ou melhor, ela reencarnou. Sabemos que isso é possível, só não imaginei que ela voltaria para esta cidade, justo para o lugar que desencanou da maneira que foi. O que me faz pensar, o maldito lobo a encontrou.

Meu irmão se sentou fixando o seu olhar no quadro próximo ao balcão, é a imagem dela retratada, ela usava roupas de uma sinhá como costumavam dizer na época porém nós sabíamos que tudo aquilo era uma maneira que Pedro António usava para humilhá-la.

— Temos que encontrá-la. Por isso tive aquela sensação esquisita naquele dia quando formos na matilha.

— Sim. Pedro Lobo com certeza está com ela, o que não ajuda em nada, se ele tiver acasalado com ela será pior ainda. Pedro pode muito bem fazer tudo novamente, temos que fazer algo para impedir. Chame os outros, temos que nos reunir.

Aquele infeliz não vai fazer de novo, se depender de mim e do meu clã, Pedro não vai conseguir prejudicar Imaculada como a séculos atrás.

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