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No passado

Imaculada

A noite está tão bonita ainda mais com a trilha sonora de Abelardo tocando, me aproximo da janela da casa de Pedro para ouvir meu melhor cliente tocar. Assim que ele me vê pede para os outros músicos continuarem e vem para lado de fora.

Quando se aproxima de mim sinto uma sensação muito boa, ele sorri e me abraça, está feliz. A verdade é que nunca vi Abelardo triste, é como se sua vida fosse afortunada e bela. Confesso que as vezes sinto inveja dele e de tudo que tem, queria eu ter sua vida maravilhosa.

- Gostou de me ver tocar?

- Sim. Você já terminou? Podemos beber juntos, tem muito tempo que não se deita comigo.

Ele acariciou meu rosto colocando seus polegares nos meus lábios, gosto do carinho, do jeito que parece admirar cada parte minha. Os outros me tratam como pedaço de carne barata.

- Já terminei. Vamos! Vou comprar o melhor vinho do porto para nós. Hoje é dia de comemorar.

Antes que pudesse ir, sinto uma mão puxando meus cabelos. O hálito nojento de Xavier infecta o meu rosto, Abelardo se assusta mas tenta me soltar, peço que se afaste, minha podridão não deve manchar alguém tão bom como ele.

Xavier já desconfiava, e por um bom tempo tentei despistar, mas agora não tem mais jeito. Deixo que me afaste da casa xingando e ofendendo, eu não me importo. Vejo pelo caminho Quitéria com sua família feliz, ela vira o rosto como se não fosse nada, é assim que sou, um grande nada em sua vida.

Xavier está descontrolado gritando e berrando como um louco quando chegamos em casa, nem mesmo o fato da madrinha estar nos seus últimos dias o faz parar. Quando éramos crianças, formos amigos, mas algo mudou drasticamente, o meu corpo mudou e ele se tornou um homem e toda nossa amizade acabou.

- A quanto tempo você está me traindo, Imaculada?

- Querido, você está nervoso! Abelardo é um amigo. Ninguém iria substituir você, não seja bobo. Está bêbado. Façamos assim: preparo um banho para nós, ficamos juntos e depois podemos nos divertir.

Ele apertou meu rosto com força, vejo ódio em seus olhos, nada que eu diga vai fazê-lo mudar o que vejo.

- MENTIROSA. RAPARIGA INFELIZ, PEDRO ME AVISOU DE VOCÊ, DAS SUAS SAÍDAS E PASSEIOS, MAS EU RELEVEI. POR AMOR, POR SABER QUE SOFRIA POR MINHA TIA. MAS ERA TUDO MENTIRA! VOCÊ ESTÁ VIVENDO COMO UMA VADIA BARATA.

- Sempre o seu grande e melhor amigo enchendo sua cabeça contra mim. Ele contou para você que é um dos meus clientes? Claro que não. Contou que foi o primeiro, me usou ali em cima da mesa da cozinha por um saco cheio de moedas. Confesso que não gosto dele, é um animal, sempre saio machucada nas minhas partes de baixo, mas o dinheiro que ganho dele com certeza compensa muito.

Ele bateu no meu rosto machucando meu lábio inferior. Não me importo mais com nada, se quiser me espancar que faça logo.

- Está mentindo, Pedro não faria isso comigo.

- Você acredita mesmo que não? A quanto tempo você o conhece? Seis meses ou até um pouco mais que isso. Sabe, Xavier, Pedro foi o primeiro depois dele entendi que sou um nada, sem valor e imprestável. Mas você foi o culpado de tudo isso, se não tivesse voltado das Minas Gerais, talvez eu continuaria cuidando da madrinha e vendendo meus quitutes. Mas você tinha que voltar, marcar seu território sob meu corpo, de verdade, só tenho a agradecer por tudo que fez.

Ele está em negação, não acreditando no que está ouvindo.

- Cada homem que tive que servir na cama só me mostrou como sou uma casca e por dentro sou um ser deformado e abominável. Eu estou ganhando tanto dinheiro sendo puta, quer saber os detalhes? De como eles forçam dentro de mim? Ou melhor: quer saber como gostam de me ver dançando totalmente nua? Eu ganho até a mais pela apresentação.

Deixo que um riso alto saia da minha boca. Xavier se ajoelha inconformado ao saber que a doce e burra Imaculada a quem ele tanto usava não existe mais. Eu sou uma bruxa e logo serei imortal.

- Imaculada, perdoou você! Vamos embora daqui, eu e você. Esquecemos tudo e todos, um novo recomeço. Está magoada, sei que errei, mas podemos ter uma nova vida.

- Xavier, eu tenho nojo de você! É um bêbado podre. Só de olhar para você sinto vontade de vomitar. Um fracassado maldito como você somente me atrapalharia. Não preciso do seu perdão, na verdade, nunca precisei de nada que venha de um asqueroso como você. Seja um derrotado conformado e me deixe continuar fazendo o que sei fazer de melhor, que é ser uma puta. Meu querido, eu sou uma das melhores meretrizes da cidade, me arrependo de não ter começado desde de quando me violentou.

Ele tentou me bater de novo, mas fui mais rápida recitando um feitiço para que durma. Xavier demorou para entender que estava perdendo a consciência, em poucos instantes estava jogado no chão totalmente inconsciente.

Saio de casa procurando por Rosa, ela está conversando com algumas prostitutas mas se afasta delas quando me vê.

- Rosa, tomei uma decisão: vamos fazer o feitiço para imortalidade, eu e você, juntas para sempre.

- Imaculada, eu não sei se tenho coragem, matar uma pessoa, não parece ser certo.

- Ser bruxa também não é certo, e nós somos. É tudo ou nada, só seremos verdadeiramente poderosas se não tivermos medo. Pense nisso, irmã, o poder vem da coragem, não seja uma covarde.

Rosa parecia indecisa, mas sei que vou convencê-la. Serei poderosa, rica, imortal e livre custe o que custar.

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