Quando o Daniel me convidou para jantar, desconfiei logo. O que um homem daquele, cheio de pose e dono de fábrica, queria com uma jantazinha comigo? A resposta era óbvia: queria me convencer a desistir da bendita bananeira. Eu já estava há dias batendo o pé, defendendo aquele pedaço de terra com unhas e dentes, e ele, com seu sorriso debochado, achava que uma refeição resolveria tudo. Claro que aceitei o convite, porém, já estava armando meu plano. Se ele achava que ia me ganhar com um jantarzinho, estava muito enganado. Eu ia fazer da noite um verdadeiro inferno.
Coloquei um vestido que comprei numa promoção, mas que tinha um caimento meio duvidoso, e passei perfume o suficiente pra deixar qualquer um tonto. Fui ao restaurante da cidade, que só de pensar já me dava uma certa agonia, porque não sou do tipo que janta em lugar metido a chique. A dona Rosa, que era quem comandava o lugar, já me olhou atravessada, como se dissesse "o que é que essa maluca tá fazendo aqui?".
Quando o Daniel chegou, pontual como só um empresário sabe ser, o sorriso dele se alargou assim que me viu. Parecia encantado, mas eu sabia que ele estava era se achando esperto. Me trouxe uma rosa, coisa que só aumentou minha desconfiança. Quem é que ainda leva flor pra jantar, meu Deus?
— Que bom que veio, Rafaela. — ele disse, colocando a mão no meu ombro de um jeito que parecia natural demais. — Espero que esse jantar seja agradável.
Sorri de canto, já pensando nas minhas próximas jogadas.
— Ah, vai ser uma noite inesquecível, Daniel. Pode acreditar.
Sentei na mesa com toda a elegância que eu consegui reunir, o que não era lá muita, contudo, suficiente para ele achar que eu estava colaborando. O garçom apareceu com o cardápio e eu, claro, pedi tudo que de mais estranho tinha. Polvo, escargot, uns pratos que eu nem sabia pronunciar. Estava torcendo pra que ele ficasse horrorizado. Porém, ele apenas levantou uma sobrancelha e deu uma risadinha.
— Não sabia que gostava de frutos-do-mar, Rafaela.
— Ah, eu adoro experimentar coisas novas. — menti descaradamente, enquanto pensava no quão nojento ia ser mastigar aquele polvo borrachudo.
A comida chegou, e enquanto eu tentava engolir aquele monte de coisa esquisita, Daniel estava impassível. Elegante, cortando os pratos com uma calma que me irritava profundamente. Ele era o oposto de tudo que eu esperava que fosse. Em vez de reclamar, fazer caretas ou mostrar algum desconforto, ele parecia se divertir.
— Então, sobre a bananeira... — ele começou, e eu, que já estava com a boca cheia de um camarão gigante, quase engasguei. Claro que o assunto ia surgir.
— Ah, Daniel, não vamos falar disso agora. — falei, tentando ser casual, mas sabendo que era isso que ele queria. — Estamos num jantar, né? Tem hora pra essas coisas.
Ele me olhou por um instante, como se estivesse me avaliando. Aquele olhar de quem acha que está no controle da situação. Era quase irritante, no entanto, eu não ia perder a pose. Não agora.
— Tudo bem, não falamos da bananeira. Só espero que você esteja disposta a dialogar em algum momento. — ele disse, com aquele tom suave que me fazia querer jogar o guardanapo na cara dele.
— Claro, claro. — concordei, com um sorriso forçado. — A gente resolve isso outro dia.
E aí, foi a minha vez de começar o plano de sabotagem. Fingi que deixei cair o garfo no chão e me abaixei para pegá-lo, aproveitando para chutar a mesa com força. Os copos balançaram, o vinho quase caiu, mas Daniel, com uma agilidade que eu não esperava, segurou tudo antes que virasse desastre.
— Tudo bem aí? — ele perguntou, com um sorriso de quem percebeu a tentativa, mas não se abalou.
— Ah, que desastrada eu sou, né? — ri nervosa, já pensando no próximo movimento.
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Debaixo Da Bananeira
ComédieEm uma pequena cidade cearense, Rafaela Pereira luta com unhas e dentes para salvar uma bananeira plantada por seu pai antes de falecer, ameaçada pela construção de uma nova fábrica. Daniel Correia, o dono da fábrica, fica fascinado pela teimosia da...