Daniel Correia
Entrei na academia decidido ter uma conversinha com aquele bombadão, porém, tentando disfarçar a tensão. Aquela mistura de suor e música alta, combinada com os pesos batendo no chão, me trazia um incômodo. Eu não era frequentador desse tipo de ambiente, mas não estava ali para malhar. Meu objetivo era outro: Rodrigo.
Ele estava no canto, ajeitando alguns halteres, totalmente alheio ao que eu vinha ensaiando dizer na cabeça. Caminhei até ele, sentindo que o momento havia chegado.
— Rodrigo. — chamei, minha voz mais firme do que eu esperava. Ele levantou a cabeça, me encarando com surpresa.
— Daniel, e aí? Não sabia que você frequentava academia. — disse ele, meio rindo, enquanto terminava de ajeitar os pesos.
Dei um sorriso de canto, sem muito humor.
— Na verdade, não venho aqui pra isso. Preciso trocar uma ideia com você. — comecei, sentindo a tensão no ar crescer. Ele franziu a testa, curioso.
— Fala, o que foi?
Respirei fundo. Era agora ou nunca.
— É sobre a Rafaela.
A expressão dele mudou, e não era surpresa. Era como se ele já soubesse que esse assunto estava no ar, mas nunca tinha sido tocado diretamente. Rodrigo cruzou os braços e se encostou no suporte de pesos.
— O que tem a Rafaela?
Direto ao ponto. Claro, eu devia fazer o mesmo.
— Eu gosto dela. — falei, de uma vez. Vi o rosto dele se iluminar com algo entre surpresa e curiosidade, porém, sem hostilidade. — E eu tô percebendo que ela sente alguma coisa por você. Então vim perguntar, de homem pra homem... você sente alguma coisa por ela?
Rodrigo piscou, claramente pego de surpresa com a pergunta direta. Ele descruzou os braços e me olhou com mais seriedade agora.
— A Rafa? — ele balançou a cabeça, como se precisasse de um segundo para processar. — Cara, a Rafaela pra mim é como uma irmã mais nova. A gente cresceu junto. Eu nunca olhei pra ela desse jeito. Você me perguntar algo assim parece até piada.
Por um momento, o alívio tomou conta de mim. Só que, ao mesmo tempo, havia algo que não batia. A forma como a Rafaela olhava para ele não parecia a de uma irmã mais nova, e eu precisava esclarecer isso.
— Você pode até vê-la assim — continuei, tentando manter o tom firme, mas sem parecer agressivo —, mas, Rodrigo, te digo uma coisa: como ela olha pra você... não parece que vê você como irmão.
O silêncio que seguiu a minha frase foi quase ensurdecedor. Rodrigo mordeu o lábio, parecendo ponderar o que eu acabara de dizer. Ele balançou a cabeça, rindo baixinho, como se tentasse afastar o desconforto.
— Daniel, acho que você tá vendo coisa onde não tem. A Rafa é intensa, sempre foi. Às vezes, ela confunde as pessoas, mas te garanto, entre a gente nunca teve nada além de amizade. Se tivesse, eu seria o primeiro a te falar.
Observei cada reação dele. A postura confiante, o jeito tranquilo. Ele não parecia estar mentindo. Na verdade, ele parecia quase alheio a qualquer possibilidade de sentimentos românticos por Rafaela, o que me fez pensar que talvez o problema não fosse ele... mas eu.
— Não me leve a mal, Rodrigo. — continuei, sentindo o peso da conversa se acentuar —, mas eu precisava te perguntar isso. Não tem como ignorar a forma como ela reage perto de você. E para mim... bom, é óbvio que você importa muito pra ela.
Rodrigo olhou para o chão por um momento antes de levantar o olhar novamente, desta vez, com uma expressão mais séria.
— Daniel, eu sei que ela se importa comigo. E eu me importo com ela também, muito. Mas, cara, isso não significa que tem algo entre a gente além do que sempre tivemos: amizade. E, se me permite dizer, acho que se você tá preocupado com isso, talvez seja algo mais entre vocês dois que precisa ser resolvido.
As palavras dele me atingiram em cheio. Havia algo de verdadeiro no que ele dizia. Talvez o problema não fosse apenas os sentimentos da Rafaela por ele, porém, a maneira como eu vinha lidando com os meus próprios sentimentos por ela. Eu estava ali, confrontando o cara como se ele fosse o culpado por algo que talvez nunca tivesse existido.
— Talvez você tenha razão. — admiti, depois de um momento. — Mas preciso que você entenda, Rodrigo. Eu não posso simplesmente ignorar o que eu sinto por ela. E ver vocês dois juntos... mexe comigo, entende?
Ele assentiu, parecendo compreender mais do que eu esperava.
— Eu entendo, cara. Se eu tivesse no seu lugar, talvez me sentiria da mesma forma. Contudo, pra ser sincero, acho que você tá se estressando à toa. Se a Rafa sente algo por você — e, pelo que eu percebo, parece que ela sente —, então o que você tá esperando?
Fiquei parado, refletindo sobre aquilo. Rodrigo estava certo. Eu estava complicando as coisas mais do que precisava. A verdade era que eu estava com medo, medo de me entregar e acabar me machucando. Mas, se eu queria algo real com Rafaela, precisava arriscar.
— Valeu, Rodrigo. — disse, finalmente. — Acho que precisava ouvir isso.
Ele deu um sorriso, mais leve agora.
— Relaxa, cara. Só vai atrás do que você quer. E, se precisar de uma mãozinha... eu tô por aqui. Seja corajoso, sei que ela pode dar medo, porém, é um amor de mulher e tem um coração gigante. Cuida dela, ela merece ser cuidada e amada.
— Pode deixar. Estou cuidando dela como posso, você a conhece, ela é difícil e como é difícil, no entanto, não sou de desistir fácil.
Saí da academia sentindo um peso sendo tirado das minhas costas, no entanto, com um outro surgindo em seu lugar. Agora que eu sabia que Rodrigo não era um obstáculo, restava o verdadeiro desafio: abrir meu coração pra Rafaela.
Como falar dos meus sentimentos em meio a guerra boba por causa de uma bananeira? Seria bem mais fácil se ela deixasse eu transplantar a bananeira em outro lugar. Ela e eu tínhamos que chegar em um acordo sobre a bananeira quanto antes e, definitivo.
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Debaixo Da Bananeira
HumorEm uma pequena cidade cearense, Rafaela Pereira luta com unhas e dentes para salvar uma bananeira plantada por seu pai antes de falecer, ameaçada pela construção de uma nova fábrica. Daniel Correia, o dono da fábrica, fica fascinado pela teimosia da...