Antes de parar na frente da porta de entrada da casa de Diana já consigo ouvir o som de pipoca estourando e o cheiro delicioso de manteiga. Entro com facilidade, já percebi que por aqui todos se conhecem e ninguém teme um possível assalto como em todas as outras casas que já fiquei.
Na família Thomas, a primeira que me acolheu, era necessário trancar todas as portas e janelas, mesmo que não tivéssemos nada de valor, pois a possibilidade de roubo era alarmante. Mesmo quando vejo Diana aconchegada no sofá, sorrindo ao me ver, e Cole saindo da cozinha com dois baldes de pipoca, não consigo afastar as memórias sombrias daquele tempo.
Uma vez, deixei a janela do quarto aberta, estava fazendo um calor absurdo e o bebê não conseguia dormir. Quase consigo sentir o ardor da fivela do cinto na base das minhas costas, onde o senhor Tomas me bateu por ser a culpada pelo roubo do colar da senhora Tomas.
Volto a realidade quando sinto a mão de Diana tocar o meu ombro.
- Está tudo bem, Anne? Trouxe seus livros de volta, não se preocupe.
Balanço a cabeça, descontraidamente, como se estivesse colocando um ponto final nos meus pensamentos negativos e abrindo um novo parágrafo, repleto de novas possibilidades.
- Claro, estou ótima. Onde eles estão?
- Deixei em cima da minha cama, agora preciso da mesa livre.
Sinto que o clima não melhorou; a tensão apenas foi redirecionada para algo que apenas Diana conhece. Quando seus olhos se voltam, apreensivos, para Cole, percebo que vou descobrir algo nos próximos minutos.
Ela solta o ar dos pulmões aos poucos, mantendo os olhos fechados, e quando os abre, fixos nos meus, vejo uma determinação misturada com coragem.
- Acho que estou grávida.
Pisco várias vezes. Diana confiou em mim, mas porque?
- É sério?
Ela dá um sorriso nervoso e Cole se aproxima.
- É sim.
- Mas é só uma possibilidade. Pelo menos por enquanto.
Não sei dizer o que estou sentindo agora, mas sinto que deveria. Um filho é algo importante, mesmo que seja apenas de uma amiga.
- Chamei vocês aqui porque vou fazer o teste. Pensei em fazer com Jerry, mas ele é muito ansioso e acho que teria um treco.
- Ele sabe?
Diana morde o lábio inferior enquanto pega uma sacola plática de cima de uma das cadeiras da mesa de jantar.
- Não.
- Chega de enrolação, vá para o banheiro. - Cole coloca as mãos sob os ombros dela e a empurra para dentro do corredor, onde imagino ter um banheiro.
Me sento com calma no sofá e por algum motivo Marilla me vem a mente. Será que ela precisa de mim agora?
Cole aparece na sala em menos de cinco minutos, segurando um papel dobrado várias vezes. À medida que ele vai desdobrando, revela um manual de como usar o teste de gravidez, eu imagino, e quando se senta ao meu lado, com uma perna em cima do braço do sofá e o corpo inclinado perto meu, ainda não terminou com o manual.
- Tem ideia de como isso pode funcionar?
- Na verdade sim, qual a marca do teste?
Coloco meu cabelo atrás das orelhas e ajeito a postura, como fiz aos onze anos, quando a senhora Thomas engravidou pela primeira vez desde que me adotaram. Ela nunca tinha usado um teste de gravidez, mas sentia que precisava tirar a dúvida, especialmente porque o senhor Thomas acabara de perder o emprego. A lembrança daquela incerteza ainda me assombra, trazendo à tona uma ansiedade que não sentia tinha muito tempo. Quando o teste deu positivo eles cogitaram me devolver para o orfanato.
- Esse é caro. -digo ao ler o nome da marca em destaque no topo da folha.
Cole vira a cabeça para mim, com as sobrancelhas juntas.
-Você já usou um desses antes? - ele pergunta e eu rio.
- Não! Claro que não. Morei com um mulher que precisou usar e pediu que eu lesse os manuais.
- Ah, certo.
Dou uma lida rápida no manual, para ter certeza que nada de importante mudou desde a última vez que peguei em um teste de gravidez.
- Vai apareceu escrito no próprio teste o resultado. Precisa esperar cinco minutos.
Na mesma hora, Diana sai do banheiro e coloca o bendito teste em cima do aparador azul-celeste da TV, antes de se sentar sem cerimônias entre Cole e eu. Deveria ser um momento de tensão, em menos de cinco mintuos a vida de Diana pode virar de cabeça para baixo, mas a única cois que ela transmite é exaustão.
Os minutos se passam demoradamente, minhas costas doem pelo tempo que estou sentada ereta. Cole e Diana não parecem notar, mas estpu quase hiperventilando pela ansiedade.
- Falta quanto tempo? - Diana pergunta, na mesma posição em que se sentou.
Cole, que agora tinha uma das bacias de pipoca em mãos, gira o punho para olhar as horas em um reógio simples que até então não tinha notado.
- A qualquer momento.
Cole volta a comer, como se isso não significasse nada, mas a medida que Diana se levanta cada segundo parece mais intenso. Acho que vou vomitar.
Diana pega o teste e não sei dizer qual o resultado, ela ainda não se virou para nós e não consigo ver o seu rosto.
Ela leva as mãos até o rosto, o teste apoiado pelo dedão da mão direita. Cole e eu levantamos na mesma hora e viramos o rosto para lermos o que diz o teste.
Grávida.
E a abraçamos antes que a mesma comece a soluçar.
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Espresso Avonlea
FanfictionQuando Anne Shirley chega à pequena cidade de Avonlea, sua esperança de um novo começo é abalada por um engano administrativo que ameaça mandar sua vida de volta para o fundo do poço. Tudo isso com apenas meses antes de completar dezoito anos. Adota...