Após a saída de Carolina e Lucas, Clara ficou imóvel na porta, observando a poeira levantar-se no ar enquanto o carro deles se afastava pela estrada de Helena. A pequena cidade, com suas montanhas distantes e o silêncio pacífico, não condizia com a tormenta que ela sentia por dentro. Clara sabia que o encontro com Carolina a obrigava a tomar uma decisão crucial, mas tudo o que conseguia sentir era uma mistura de raiva e medo, sentimentos que a haviam acompanhado desde que sua própria irmã, Julia, arruinara sua vida.
Ela fechou a porta com um suspiro profundo, seus pensamentos a sufocando. Sentou-se no sofá velho, abraçando um travesseiro que cheirava a lavanda, algo que deveria ser calmante, mas naquele momento parecia irônico. Clara não queria estar escondida em Helena. Não queria passar o resto de seus dias olhando por cima do ombro, temendo que Julia aparecesse para destruí-la mais uma vez. Já perdera tudo o que importava — sua carreira, seus sonhos, e, mais doloroso de tudo, seu noivo, assassinado brutalmente logo após o julgamento de Alexandre, onde Clara havia sido testemunha chave contra ele.
"Por que eu ainda estou aqui?", murmurou para si mesma, a voz quebrada de desespero. Ela não conseguia esquecer o amor de sua vida, alguém que a amara verdadeiramente, sem segundas intenções. Tudo mudou após o testemunho. Clara sabia que sua decisão de depor havia rompido definitivamente o laço com Julia, mas jamais imaginara que sua própria irmã pudesse ser capaz de algo tão vil quanto o assassinato. E ainda assim, Julia provou que o sangue que as unia não a impedia de destruir a vida de Clara sem remorso.
O medo de Julia a mantivera prisioneira por anos, mas agora outro sentimento começava a surgir. A raiva, uma emoção tão poderosa quanto o medo, crescia silenciosamente dentro de Clara. Não era mais apenas raiva de Julia; era de si mesma. Como havia permitido que sua vida fosse destroçada por tanto tempo? Como pudera ser tão cega?
Os pensamentos de Clara voltaram aos tempos de infância, quando ela e Julia eram inseparáveis. Duas irmãs, sempre cúmplices. Clara sempre admirara Julia, sua confiança, seu carisma. Julia sempre sabia o que dizer para cativar todos ao seu redor. Na faculdade, Clara, a mais tímida, se apoiara em Julia, que parecia brilhar em qualquer ambiente. Julia a guiou, abriu portas, mas Clara nunca entendeu o preço. Anos depois, perceberia que Julia sempre usara as pessoas, incluindo sua própria irmã, para alcançar seus objetivos.
Julia se tornara uma figura manipuladora e cruel, e Clara só percebeu tarde demais. O julgamento de Alexandre revelou o monstro que Julia era, e Clara, em sua busca por justiça, se colocou diretamente no caminho da fúria da irmã. Quando Clara testemunhou contra Alexandre, sabia que seria o fim de qualquer relação com Julia. Mas não sabia que seria o fim de sua própria vida como conhecia.
Agora, Clara estava escondida em Helena, Montana, como uma fugitiva. Cada ruído inesperado a fazia congelar de pavor, temendo que fosse Julia ou alguém enviado por ela. Mas a visita de Carolina mudara algo dentro de Clara. Ela não queria mais viver assim.
Sentada no sofá, Clara fechou os olhos e relembrou cada detalhe do encontro com Carolina. A intensidade no olhar de Carolina, a determinação em sua voz, a urgência da vingança que a consumia. Carolina não era apenas uma mulher em busca de justiça, ela era um tornado de emoções. Traída por Julia, Rafael e Alexandre, ela havia suportado tantas cicatrizes, e ainda assim estava ali, disposta a lutar.
Clara sentia o peso dessa decisão. Não queria mais ser uma vítima, mas enfrentar Julia era algo que ela nunca imaginara fazer. Julia não era apenas uma mulher má, era uma manipuladora perigosa, implacável em sua busca por poder.
Mas algo dentro de Clara começou a se firmar. Fugir não era mais uma opção. Se ela não tomasse uma atitude agora, Julia continuaria a controlar sua vida, sempre presente como uma sombra, mesmo à distância. Carolina estava certa. Juntas, talvez pudessem enfrentar Julia. E se tivessem alguma chance de vencer, precisariam estar dispostas a tudo.
Clara se levantou do sofá, andando de um lado para o outro na sala pequena e claustrofóbica. Sua mente corria com lembranças e reflexões. Ela pensava em todos que haviam sido prejudicados por Julia — Carolina, Lucas, Rafael... e ela mesma, talvez a mais prejudicada de todos. Julia sempre fora um furacão, destruindo tudo em seu caminho.
— Maldita seja, Julia — murmurou Clara, socando o ar. A raiva crescia mais a cada segundo.
Ela parou perto da janela, observando as montanhas distantes. Julia era tão imponente quanto aquelas montanhas em sua mente, um obstáculo intransponível. Mas, pela primeira vez, Clara não sentia apenas medo. Ela sentia determinação. Precisava lutar, precisava retomar o controle de sua vida.
Pegando o telefone, Clara discou o número de Carolina com mãos trêmulas. Quando Carolina atendeu, Clara sentiu a própria coragem crescer.
— Carolina, eu estou dentro — disse Clara, sem hesitação. — Vou me juntar a você. Chega de fugir.
Do outro lado da linha, Clara podia quase sentir o sorriso de alívio de Carolina.
— Eu sabia que você iria aceitar. Nós vamos acabar com ela, Clara. Eu prometo — respondeu Carolina, sua voz firme e segura.
Clara sabia que Carolina não estava sozinha nessa luta. Lucas, o trapalhão do grupo, estava sempre presente, com suas piadas inapropriadas e uma personalidade que oscilava entre a comédia e o caos. Clara ainda não sabia se podia confiar completamente nele, mas havia algo em Lucas que a fazia acreditar que ele tinha seu papel, mesmo que fosse o mais improvável.
E então, havia Ivan, o misterioso ex-agente da KGB. Clara ouvira de Carolina que ele estava lidando com Julia e Rafael no Leste Europeu. A ideia de um ex-espião envolvido nessa trama era ao mesmo tempo reconfortante e assustadora. Ivan poderia ser o trunfo que precisavam ou sua maior ameaça. Mas, por enquanto, Clara se concentraria em ajudar Carolina a criar o plano perfeito. Um plano que garantiria que Julia pagasse por tudo que fez.
Nas horas seguintes, Clara começou a planejar. Ela sabia que precisariam de mais aliados. Sabiam que Julia tinha contatos no Leste Europeu, mas Ivan estava cuidando dessa parte. No entanto, Clara não queria depender inteiramente de Ivan. Decidida a contribuir com mais do que sua própria raiva e dor, Clara pensou em antigos conhecidos, pessoas que, como ela, haviam sido feridas pelas ações de Julia.
Era o começo de uma nova fase. Clara não era mais a vítima. Agora, com Carolina e os outros ao seu lado, ela estava pronta para a batalha.
O que Julia não sabia é que, desta vez, Clara não tinha mais medo. Ela tinha uma missão.
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Sombra de Vingança
Mystery / ThrillerCarolina acreditava que o passado estava enterrado, mas as sombras da traição e da vingança voltam a persegui-la. Em "Sombra de Vingança", a continuação arrebatadora da trilogia, Carolina se encontra envolvida em uma trama de segredos mortais, menti...