Prólogo.

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Devido a morte repentina e precoce do nosso querido e falecido X (vulgo twitter) eu não tive a oportunidade de divulgar essa história como eu planejava, então posto agora às cegas e no escuro esperando que a justiça seja feita e de alguma forma não afunde totalmente.
Às gn's mais antigas, peço paciência. Entrei pra esse fandom semana passada! Primeira história deles que escrevo, longe de ser perfeita, mas vai fluir, prometo!


...


Já foi estabelecido que fazer as malas é a pior parte de uma viagem, né? Independente da ocasião, estação, destino, fazer as malas só perde para desfazer elas, e eu, escolhida pelos anjos, acabei tendo que fazer e refazer quatro malas. Bem, cinco, se a do cachorro contar também.

Viagem de férias é circo em família grande. Por aqui somos cinco – mas uma é de quatro patas, que pega mais fogo que as duas outras crianças juntas. Falando nelas, as gêmeas me ajudaram muito na arrumação da mala delas, mas é aquilo, né? Pra elas é mais importante levar o vestido de princesa espaçoso e desconfortável ao invés do conjuntinho fofo de passear. São prioridades!

Já a Sorte, a nossa mascote, uma spitz alemão minúscula mas com a mesma potência de um tsunami, extremamente ansiosa e agarrada nas meninas – tá aí o motivo da ida dela – não me deu taaanto trabalho assim na hora da arrumação. Por sorte eu passei por todos os perrengues e sufocos possíveis e existentes na nossa primeira viagem com ela em que tudo que podia dar errado, deu. Da pior forma possível. Então agora tô vacinada!

E por mais que eu bata no peito pra dizer que não sou mãe de homem nenhum e adoro falar por aí que deixo o Vinicius se lascar sozinho pra aprender, eu tenho que revisar a mala dele sempre que viajamos. Porque se algo fica pra trás, quem paga o pato sou eu: seja com o mau humor dele, a falação, ou a tarefa de ir comprar pra substituir o item esquecido. Sempre assim. Então como dessa vez a viagem é longa, passei um pente fino por cada canto da mala, e depois de tudo pronto, aí sim estava livre pra ir pra provação final.

A minha, que ficou por último.

O ascendente em virgem não me deixa fazer nada sem duas listas na mão, uma que controla tudo e a outra que me faz ter certeza que tudo que devia ser controlado foi devidamente controlado. Assim, nada sai do lugar. Deixa o processo menos tumultuoso e evita dores de cabeças futuras, não poupa tempo mas poupa estresse, o que vale muito mais.

Pelos cálculos que fiz, levei cerca de seis horas completas para que tudo estivesse a postos na sala de estar, incluindo bolsas pequenas de mão para previnir emergências e possíveis problemas com a segurança do aeroporto. Anos de praticam levam a perfeição, já que na primeira viagem que eu fiz depois de me tornar mãe de duas, eu passei dois dias empacotando o guarda-roupa inteiro delas. Mãe de primeira viagem...

Enfim. Pra quem decidiu que a família toda ia fazer uma viagem em menos de dois dias, eu até que me saí bem. Quarenta e oito horas para avisar funcionários, familiares, escola, pacientes, marido e filhas de uma viagem surpresa — que foi surpresa até pra mim — comprar passagens, alugar carro, fechar uma suíte no resort e não ter uma síncope no processo é pra poucos.

Mas tá, chega de me vangloriar por ser uma máquina. Essa viagem vai acontecer porque eu necessito parar de agir feito uma.

Quero me desconectar de todas as versões da Giovanna que existem: a fisioterapeuta, a chefe, a professora, a empresária, a cozinheira, e as outras milhares que vivem em mim. Quero que todas sumam para bem, bem longe deixando espaço para a esparramada, espalhafatosa, vibrante e animada versão premium: a Giovanna das férias.

Ela é minha favorita. É destemida, encrenqueira, justa, fogosa e pra frente. Ela é um superego meu que deu certo, muito certo, e coloca minha versão normal do dia a dia no chinelo.

Mas para a minha tristeza, essa versão precisa ser resgatada. São tantos anos sem que ela venha a superfície que a coitada acabou adormecida, dando vez para uma banana viciada em trabalho que não sabe se divertir e vive em função da família, tal como uma mãe dos anos 50.

No caso, eu.

Por isso minhas expectativas para esses doze dias estão altíssimas. Impossível controlar a empolgação pela possibilidade de ser eu mesma de novo, respirar ar puro, fazer algo por mim e curtir essa vida que Deus me deu! Eu mereço, né?

Mereço, sim. Isso não tá mais no tópico discussão.

Dias atrás, quando bati o martelo no destino da viagem, quase acabei batendo essa ferramenta na cabeça do pobre coitado que eu chamo de amor.

O Vinicius, meu marido, chegou em casa querendo confusão. Senti de longe o espírito de contenda vagando ao redor dele, que a todo momento tentava me empurrar para uma de suas armadilhas, mas eu resisti até onde fui capaz.

— Vai pedir pizza de novo? — perguntou lá do sofá da sala, enquanto eu tentava administrar um pouco da bagunça da cozinha e a brincadeira que Clara e Carolina faziam ali no meu pé.

— Olha, o fogão tá livre se você quiser preparar algo. — respondi igualmente cansada, sentindo as canetas desenhando na minha panturrilha. — Prefere vir cozinhar?

— Essa função é sua, Giovanna.

— Essa e todas as outras da casa aparentemente. — arqueei as sobrancelhas, deixando o pano de prato cair no chão.

— Tá respondona, hein?! Já te falei que detesto comer porcaria em dia de semana, Giovanna! — ele levantou a voz, nem tão longe de um grito, e veio marchando até a cozinha.

Olhei para as gêmeas nos meus pés e com um comando silencioso, mandei elas pro quarto. Esperei que a porta ecoasse, sinalizando que estava fechada, para então responder o meu marido.

E olha, eu não me orgulho do que eu fiz não, tá? Deixo bem claro que sou contra gritos, surtos e brigas dentro de casa, ainda mais com os filhos presentes. Mas o meu nível de exaustão extrapolou qualquer limite, meu corpo estava sobrecarregado e meu cérebro nem funcionava direito. Aquele desaforo do Vinicius foi o suficiente pra que eu tentasse acertar ele com dois copos e um prato.

De plástico, claro. Não se tratava de uma tentativa de homicídio... era só um expurgo.

Ele não se machucou e eu acabei bem mais calma, abrindo o notebook para comprar as quatro primeiras passagens que vi na minha frente.

Tá vendo? Só vitórias!

Então foi assim que a família Antonelli Guimarães acabou numa aeronave rumo à Bahia em plena quarta–feira.

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