Lize:
Uma sensação de alivio invade todo o meu corpo quando chego ao meu quarto. Meu coração pula pela boca e meu estomago da voltas.
Levo os dedos aos meus lábios, sorrindo ao lembrar o toque quente e macio dos seus. Adormeço sentindo uma paz e alegria que nunca senti antes, acordando disposta no outro dia. Mas minha disposição é abalada quando vejo uma mulher estranha sair do quarto ao lado quando saio para o café. Ela sorri, um pouco tímida, mas não diz nada, apenas continua seu caminho até as escadas. Um taxi espera por ela do lado de fora, e os observo enquanto se afastam na estrada de cascalho.
-- Bom dia... – diz Luna, sonolenta. Seus cabelos estão enrolados com uma espécie de rolinho cor de ameixa, amarrados em cima da cabeça. – O que foi? – diz, revirando os olhos para mim. -- Uma mulher não deve medir esforços para ficar bonita.
-- Sabe quem era aquela mulher? – pergunto, quando nos sentamos á mesa. Papai ainda não desceu.
-- Não. – minha irmã me encara, um pouco envergonhada.
Eu entendo isso. Não é como se eu não me importasse que papai trouxesse mulheres desse tipo aqui em casa, eu me importava, mas eu também não esperava nada melhor da parte dele. Muitas das coisas que ele faz não me surpreendem mais.
-- Bom dia. – resmunga minha irmã para a empregada, Eugenia, quando ela nos cumprimenta.
Afundo meu waflle no recipiente com mel e dou uma mordida generosa, sentindo o doce se espalhar por minha língua. A massa ainda quente brinca com meus sentidos, quase me fazendo sorrir sozinha. Tomo meu café sem pressa, adiando ao máximo o que terei que fazer hoje depois do desjejum: ir ás compras com minha imã.
Não tenho nada contra isso, ate que é divertido, mas só de pensar em ter que passar horas e horas andando e experimentando milhões de roupas (nesse caso, minha irmã e não eu), já sentia meus pés sofrerem.
-- Termine logo, Lize. – diz minha irmã, já impaciente atrás da porta do banheiro, onde eu me tranquei para passar um pouco de maquiagem.
-- Já estou saindo... – minto. O problema é que já falei isso no mínimo, umas três vezes.
-- Pelo amor de Deus, mana! Isso não é tão difícil... – solto um gemido, tentando unutilmente espalhar todo o pó em meu rosto, sem manchar minha roupa. Como fiz antes. – Não me faça derrubar está porta! – avisa ela.
-- Não dá! Desisto.
Abro a porta, quase derrubando Luna, que estava escorada nela.
-- Deixa que eu te ajudo. – diz, me puxando para a penteadeira. – Você não pode esfregar, tem que passar de leve, fazendo movimentos circulares... – enquanto ela falava, espalhava o pó em meu rosto, delicadamente.
– Pronto. – diz, batendo uma mão na outra. – Simples, fácil e rápido. – olho meu reflexo no espelho. Fico impressionada, o pó realmente funciona!
Tento não demonstrar o quanto estou desconfortável durante á viajem de carro até a cidade. Meu pai pediu para que Gregor, o capataz, nos levasse, pois estaria muito ocupado hoje. Ignoro suas olhadas para mim, e tento me convencer de que ele não está dentro daquele carro comigo. Assim que chegamos, abro a porta correndo, sem dar a chance de ele fazê-lo para mim.
Ajusto a saia de meu vestido, desamassando o tule azul, que cai perfeitamente em meu corpo até a altura de meus joelhos. Luna admira seu reflexo no vidro do carro antes de agarrar meu braço e me puxar para dentro da primeira loja da rua. Assim que entramos, uma moça, um pouco mais velha que eu, nos cumprimenta, pedindo o que queremos.
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Alma Negra
Roman d'amourOutono de 1962, os Estados Unidos da América está em guerra. Negros e brancos erguem seus punhos e voz contra uma sociedade racista, conservadora e capitalista. Todos os dias ouvimos pelo rádio que mais e mais pessoas se juntam as causas e partidos...