The Weight of Fear

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Gwyn havia adormecido há algum tempo. Ela chorou, e muito, até que Azriel percebeu que sua respiração se tornara regular e constante, mostrando que finalmente havia cedido ao cansaço.

Ele a observava em silêncio, o rosto dela suavizado pela exaustão, as pálpebras tremulando ocasionalmente, como se ainda lutasse com os fantasmas de seus medos.

Ele não conseguia tirar os olhos dela.

Gwyn tinha sido forte por tanto tempo, lutando contra demônios que ele conhecia bem. Mas ver a vulnerabilidade dela... a maneira como ela se encolhera quando o Illyriano a insultara, fez algo dentro dele estalar.

Com cuidado, tentando não acordá-la, ele a ergueu um pouco em seus braços, sentindo a leveza do corpo dela, ainda envolto na manta de lã. Gwyn se mexeu levemente, mas não acordou.

Suavemente, Azriel a deitou no sofá próximo à lareira, garantindo que sua cabeça repousasse num dos travesseiros. Ele ajeitou a manta em volta dela, certificando-se de que ela estivesse bem aquecida.

Quando ele se inclinou para afastar a mão, sentiu os dedos dela segurarem os seus, pequenos e frágeis, como se temesse que ele fosse embora. Seu toque era suave, mas firme, e sua voz, baixa e trêmula, quebrou o silêncio.

- Fica comigo... - Gwyn murmurou, os olhos ainda fechados, a voz um reflexo de sua vulnerabilidade. - por favor.

Azriel ficou imóvel por um instante, o pedido dela ressoando dentro de si. Ele não esperava isso.

Ele respirou fundo, soltando o ar lentamente enquanto olhava para o rosto dela. Gwyn ainda segurava sua mão, como se aquele simples toque fosse suficiente para acalmá-la.

Sem dizer uma palavra, ele se deitou ao lado dela no sofá estreito, cuidadoso para não invadir o espaço dela mais do que o necessário. Ele ajeitou a manta ao redor dos dois, envolvendo-os no calor compartilhado.

Quando ele finalmente descansou a cabeça no travesseiro ao lado dela, sentiu Gwyn se aninhar mais perto, o rosto dela se inclinando para o seu ombro, a respiração dela quente contra sua pele. Por um momento, ele ficou rígido, incerto de como agir, mas então relaxou, permitindo-se apenas estar ali. O braço dele passou ao redor dela instintivamente, a mão repousando nas costas dela com suavidade.

Naquele silêncio tranquilo, com o calor do corpo dela encostado no seu, o laço se agitava dentro dele como uma corrente invisível, algo primordial é inegável

O sentimento veio como um trovão, intenso e implacável.

Nossa.

Suas sombras sussurraram.

O desejo de protegê-la, de mantê-la segura, era mais do que instinto - era uma promessa. Mesmo que ela nunca soubesse, Azriel jurou, ali e agora, cuidar de Gwyn. Protegeria-a de tudo e de todos, inclusive de si mesmo, se necessário.

Ele observou enquanto o rosto dela se movia suavemente contra seu ombro, a respiração dela constante, lenta. O laço quase dolorosamente presente agora, um lembrete de algo que ele não poderia negar para sempre.

A noite avançava, e o calor da lareira banhava os dois em uma luz suave.

Azriel sentiu o olhar de Gwyn antes mesmo de abrir os olhos. Lentamente, ela ergueu as pálpebras, e os olhos dela encontraram os dele, aqueles olhos sempre tão brilhantes, tão fortes, mas agora cheios de uma ternura que o desconcertava.

Por um breve instante, nenhum dos dois se moveu.

A respiração dela ficou um pouco mais rápida, e ele sabia que ela podia sentir o mesmo que ele. Gwyn estava tão perto, o rosto a poucos centímetros do seu, e ele podia sentir a fragância suave dela, como flores selvagens depois da chuva. A mão dela se apertou levemente contra seu peito, e Azriel, incapaz de se mover, permaneceu imóvel, tentando lutar contra a força crescente do laço dentro dele.

- Gwyn... - Ele começou, a voz baixa, hesitante, como se tentasse avisá-la, tentar pará-la antes que fosse tarde demais.

Mas ela apenas se aproximou, inclinando-se para ele, os olhos dela presos nos seus. Por um momento, Azriel achou que poderia afastá-la, dizer a verdade, que ele sabia de algo que ela não sabia. Mas então, como se todo o mundo ao redor desaparecesse, Gwyn fechou a distância entre eles e pressionou os lábios contra os dele.

O beijo foi suave, hesitante no início, como se ela estivesse testando se ele permitiria.

O coração de Azriel martelou contra o peito, a vontade de resistir quase se esvaindo no momento em que o calor dela o atingiu. Ele podia sentir o laço pulsando, mais forte do que nunca, exigindo que ele correspondesse, que ele cedesse.

E ele cedeu.

As mãos dele se moveram para os cabelos de Gwyn, seus dedos envolvendo-a com uma ternura que ele nem sabia ser capaz. O beijo se aprofundou, sua língua pediu passagem e Gwyn cedeu, ela soltou um leve gemido que desencadeou uma onda de sentimentos que ele não poderia mais segurar.

O laço dentro dele rugia, mas ele sabia que aquele momento, aquele beijo, era algo além de qualquer vínculo - era escolha, desejo e algo que ele nunca soube que precisava até sentir.

Ele a puxou para mais perto, o beijo se tornando mais firme, mais intenso mas ainda cauteloso, e, por um instante, todos os seus medos, dúvidas e ressentimentos se dissiparam. Gwyn era tudo o que ele via, tudo o que ele sentia, e naquele momento, ela era dele, assim como ele era dela.

Então Azriel sentiu, o cheiro dela mudando.

Todo os seus músculos ficaram tensos, e ele terminou o beijo com cuidado, depositando um último toque suave nos lábios de Gwyn, tentando acalmar o turbilhão de emoções que sentia.

Quando seus olhos encontraram os dela, ele viu algo novo na forma como ela o olhava - dúvida, talvez uma pergunta silenciosa, como se ela estivesse tentando entender o que acabara de acontecer. A respiração dela estava rápida, e ele pôde ver o conflito interno que a consumia.

Azriel sabia que havia cruzado uma linha perigosa, que, se fosse mais longe, poderia destruí-la, destruí-los. Ele precisava parar, por mais que o laço rugisse em sua mente, exigindo que ele ficasse, que continuasse. Mas ele não podia.

Ele conhecia a escuridão que habitava seu ser. Sabia das sombras que o cercavam, dos segredos obscuros que carregava, e a ideia de que alguém como Gwyn poderia olhar para ele com amor ou carinho era, na melhor das hipóteses, uma cruel ilusão. Ela merecia mais do que ele poderia dar — mais do que ele poderia permitir a si mesmo oferecer.

- Gwyn - ele sussurrou, a voz rouca e baixa. - Eu não posso...

Ela o olhou, o rosto ainda tão próximo do dele que podia sentir o calor de sua pele, seus olhos confusos, talvez até feridos. Mas ele sabia que não era justo. Não seria justo com ela, não dessa forma.

O peso de suas palavras parecia se transformar em uma âncora em seu coração. Cada letra carregava a realidade de que ele era uma sombra, alguém que existia na penumbra e se alimentava do sofrimento, alguém que já havia perdido demais e que não poderia permitir que outra pessoa, especialmente ela, fosse arrastada para o abismo que o cercava.

Com delicadeza, Azriel afastou-se, o movimento lento, cuidadoso, como se temesse quebrá-la. Ele precisava sair daquele momento, daquela sala, antes que a tentação se tornasse insuportável.

Com um movimento firme, mas gentil, ele a cobriu com a manta que ela ainda segurava, o calor dela emanando para ele, quase como um lembrete de que havia beleza no mundo. Mas essa beleza não era para ele; era um tesouro que ele não poderia reivindicar.

- Vamos voltar para a Casa do Vento. - disse ele, tentando manter o tom leve, controlado.

Ele sabia que precisava tirar Gwyn daquele lugar, daquele momento, antes que fosse tarde demais.

Gwyn piscou, parecendo sair de um transe. Ela assentiu, silenciosa, talvez sem saber o que dizer.

Azriel estendeu a mão para ela, e quando seus dedos se entrelaçaram, ele sentiu o calor dela se espalhar por seu corpo. Mesmo que estivesse tentando afastar-se, ele não podia negar a necessidade de protegê-la, de mantê-la segura.

E sabia, no fundo de sua alma, que sempre seria assim.

Ele lutava contra o laço que ainda latejava dentro dele, sabendo que um dia teria que enfrentar essa verdade — mas, por enquanto, ele precisava apenas mantê-la segura.

Canção das Sombras | GWYNRIELOnde histórias criam vida. Descubra agora