Cidade de Sombras

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Esperança, uma cidade grande e movimentada, é conhecida por sua localização privilegiada e seus inúmeros pontos turísticos e comércios. A cidade é a queridinha dos turistas, um lugar acolhedor, encantador para visitar ou até mesmo morar.

Surpreendentemente, a taxa de criminalidade aqui é baixa, um feito admirável para o tamanho da cidade. Segurança parece ser a promessa inquebrável de Esperança.

Exceto em outubro. Especialmente no Halloween.

Durante o ano todo, a cidade permanece tranquila, mas assim que outubro chega, coisas estranhas começam a acontecer. Coisas sinistras.

Crimes macabros. Casos arquivados sem solução.

Muitos dizem que são espíritos, o mal manifestando-se no dia que celebra sua essência. Outros acreditam que o verdadeiro mal são as próprias pessoas, aproveitando-se da data para externalizar a violência latente dentro delas. Como em Scooby-Doo, onde os monstros sempre acabam sendo humanos mascarados.

O Halloween aterroriza a população, manchando a imagem pacífica e segura que a cidade tenta manter.

Devido a isso, Esperança instaurou um toque de recolher rigoroso, na tentativa de conter os crimes horrendos. A partir das 23 horas, ninguém pode ficar nas ruas, a não ser autoridades e serviços de emergência.

A maioria dos habitantes evita qualquer tipo de comemoração. Sem decorações, sem festas. As escolas não celebram, apenas alertam as crianças a ficarem em casa, especialmente à noite.

***

Do meu quarto, escutava o som da televisão, o volume alto preenchendo a casa enquanto meu pai assistia ao noticiário, afundado no sofá com uma garrafa de cerveja na mão.

Ainda eram oito da manhã e ele já estava bebendo.

A casa era uma bagunça. Roupas espalhadas pelo sofá, pelas escadas, pelo chão. Caixas de pizza vazias acumulavam-se na mesa, e moscas sobrevoavam restos de comida. Garrafas de cerveja e uísque estavam por todos os cantos.

Desci as escadas rapidamente, desviando das camisas sociais que ele jogava em cada degrau.

Aproximei-me dele na sala, peguei uma das camisas do chão e balancei na frente de seu rosto.

— Sério? — questionei, tentando conter a irritação. — Eu sempre acabo limpando sua bagunça.

Ele me olhou com indiferença antes de voltar a atenção à TV, tomando um longo gole da cerveja.

— Vai ao escritório hoje? — perguntei, tentando conter meu tom ácido. — Porque, sinceramente...

— Shhh... — ele me interrompeu, sem nem olhar para mim. — Tô ouvindo as notícias.

Apontou para a tela, e eu suspirei, jogando a camisa de volta no chão.

Na televisão, a jornalista falava sobre o Halloween. Droga, tinha esquecido que era hoje.

— Comerciantes estão fechando mais cedo, festas foram proibidas e o toque de recolher continua. Tudo isso para manter Esperança a salvo desta data que, por séculos, tem nos assombrado. A data que nos rouba amigos e familiares — dizia a mulher de cabelos curtos e castanhos, sua voz grave ecoando pelo microfone. O cenário ao fundo mostrava o centro da cidade, onde as pessoas andavam apressadas.

Cruzei os braços e olhei novamente para o meu pai.

— Nem pense em sair hoje — ele ordenou, com aquele tom apático de sempre.

Revirei os olhos. Como se eu fosse idiota o suficiente para isso.

— Vou ficar bem. A lanchonete fecha às dez.

Sombras de Outubro Onde histórias criam vida. Descubra agora