Eu não ia me preocupar com a conta de água, eu ficaria debaixo daquele chuveiro até que metade de minha ficha caísse. Eu tinha chegado ao banheiro amparada por Jungwon e ali entrei sem nem piscar. Tive a sensação de que se eu piscasse eu perderia informações. Jungwon se preocupou em fechar a porta, me deixando à vontade, porque eu mesma só caminhei direto para a água fria e me uni a ela ainda com roupa no corpo.
Se zumbi existia de verdade eu ainda não sabia, mas certamente eu era a representação mais fiel de um naquele momento.
Enquanto a água encharcava minha roupa, tentei organizar meus pensamentos. Eu esperava ter o anel retirado, ter minhas lembranças e ver que talvez eu tivesse uma vida meio complicada e o tal bruxo só tinha errado o endereço do feitiço. Depois disso eu voltaria para minha família e… manteria contato com os rapazes. Mesmo que isso fosse contra a vontade de Jungwon. Mas a batalha contra os bruxos já tinha sido um exemplo de que não seria simples assim. Estavam atrás de mim e não deles. E se não bastasse tudo aquilo, agora eu sabia que eu não tinha para onde fugir. Minha família… Eu levei minhas mãos aos meus cabelos e os puxei.
Eu não ia acordar. Não ia. Eu só era humana por conta do anel, mas eu nem deveria ter crescido. Era surreal imaginar que eu devia ter 7 anos ainda… E se um dia eu tive medo deles… os chamei de monstros… o que eu era ? Eu era pior? Minhas lágrimas voltaram e se misturaram à água. Deixei minhas unhas arranharem meu pescoço. Eu tinha tanto medo dos olhares dos bruxos e … eu tinha sido raptada por um. Ele matou pessoas graças a mim. Eu não deveria existir… Se eu tirasse o anel eu voltaria a ser esse veneno que meus pais tanto lutaram para impedir que se espalhasse… meus pais … estavam mortos por minha culpa. Eu… eu era uma assassina. Só consegui chorar mais e me abaixei na cabine do chuveiro.
Eu não lembrava de nenhum desses horrores vividos, mas Hans, meu avô, meu avô, meu avô, meu avô…ele era meu avô bruxo… nossa… eu consegui encontrar meu avô e não pude reagir de forma que uma neta reagiria na presença daquele que sempre lhe cuidou e … ele tinha sinceridade nos olhos. Eu pude sentir cada cena que ele descreveu. Cada emoção transmitida. Não era pegadinha, não era pesadelo, era minha verdadeira identidade sendo desenhada para mim. Eu era uma chama da noite, algo que só foi possível existir por ser filha de pais híbridos… pais híbridos…. Meu pai sendo como Sunghoon… bruxo, vampiro… minha mãe fada….uma fada … as fadas existiam então… e loba. Loba como Ni-ki. Ela devia ser incrivelmente linda. Minhas lágrimas caíram mais forte e eu abracei minhas pernas, ficando encolhida naquele chão. Não importava buscar beleza naquilo tudo, eu nasci como um veneno. Eu não podia tirar aquele anel.
Eu não podia causar mais problemas do que já tinha causado desde o meu nascimento. Seria loucura. Olhei para meu anel…ficar com ele seria como aceitar e respeitar os desejos de meus pais. Não era fugir de minha essência, de quem eu era verdadeiramente… não era. Fechei minha mão a colocando no peito. Eu podia ser humana, então eu seria. Eu não tinha raciocinado o bastante, mas era o que eu tinha conseguido até ali. Hans… meu avô… tinha dito tanta coisa…Ele disse que preferia assim não disse? Senti o cansaço pesar e o frio da água me endurecer. Eu soube que passei muito tempo ali pensando e repensando, mas só tive certeza quando me chamaram.
_ S/n você está bem aí?_ Sunghoon perguntou do lado de fora. Sunghoon… ele já sabia metade das coisas… era estranho ter pessoas sabendo mais de você do que você mesma. Mas ele quis ajudar, eu não tiraria a razão e o cuidado que ele teve. _ S/n? _ Ele chamou de novo porque esqueci de responder.
_ Oi. Tô. _ Falei me sentindo um peso.
_ Precisa de alguma coisa?
_Não… _ Eu me levantei. _ Vou tomar banho agora. Me desculpa… _ Não tive resposta então tirei minha roupa molhada para tomar um banho de verdade. Eu devia estar só causando preocupação ao ficar no banheiro por horas.
