4. Amanhecer

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Um feixe de luz atravessava a janela, atingindo meus olhos e me obrigando a acordar. Mas algo estava errado. Não era o meu quarto. A cama era muito maior e mais macia. Um cheiro amadeirado, que não conhecia, impregnava o ar, e as cortinas pesadas bloqueavam a maior parte da luz, deixando o quarto na penumbra. Me virei, os lençóis macios e caros roçando na minha pele, e comecei a olhar ao redor, tentando entender onde estava.

Uma leve dor de cabeça pulsava em minha têmpora, consequência óbvia da noite anterior, mas as memórias vinham como flashes desconexos. Kadu me puxando para longe de alguém... um menino que eu tinha beijado? Sim, eu tinha beijado alguém na festa. Mas por quê? E por que Kadu parecia incomodado? Será que ele estava com ciúmes?

Enquanto minha mente se debatia entre as lembranças fragmentadas, uma voz grave ecoou do outro lado do quarto, me arrancando abruptamente dos pensamentos:

— Já lembrou de tudo que aconteceu ontem à noite? — A voz era grave, rouca, e imediatamente me fez pular da cama. Virei em direção ao som e, para o meu espanto, vi Marc, sentado em uma poltrona de couro ao lado da janela.

Meu coração acelerou. A atmosfera do quarto parecia pesada, como se o ar estivesse carregado de tensão. Olhei para baixo, percebendo que estava só de cueca. Um frio percorreu minha espinha. Eu tinha transado com ele? A pergunta latejava na minha cabeça.

— O que... o que está fazendo aqui? — gaguejei, tentando processar. — Nós... você sabe... nós transamos?

Marc se levantou lentamente, seu corpo musculoso se movendo com a precisão de um predador. Ele cruzou o quarto em passos decididos, subindo na cama até que seu rosto estivesse apenas a centímetros do meu. Sua respiração quente roçava minha pele, e eu me vi completamente paralisado.

— Se nós transamos? — ele murmurou com um leve sorriso nos lábios, seus olhos cravados nos meus, intensos e perigosos. — Não, não transamos.

A tensão que eu nem sabia que estava segurando se dissipou um pouco, mas não por completo. Eu ainda não entendia o que estava acontecendo.

— Então por que eu estou aqui? Como vim parar aqui? Isso é algum tipo de sequestro?

Marc gargalhou alto, um som que reverberou pelo quarto luxuoso. Ele se afastou de mim, indo de volta para sua poltrona com um ar relaxado, quase cínico.

— Sequestro? — ele repetiu, divertido. — Você está livre para ir quando quiser. Eu só te tirei de uma encrenca.

— Que encrenca? — perguntei, confuso, sentindo a tensão voltar aos meus ombros. — Eu só estava numa festa...

— Uma festa cheia de menores de idade, bêbados e drogados — ele respondeu, seu tom ficando subitamente mais frio. — Inclusive, aqueles dois demônios vão se ver comigo hoje.

Demônios? Ele estava falando de Kadu e Giovanna? A situação começou a ficar ainda mais surreal.

— Espera... você é o pai deles? — perguntei, incrédulo.

Marc riu mais uma vez, um som seco e carregado de ironia.

— Surpreso? Sim, sou eu o pai daqueles dois imbecis.

O choque me paralisou. Marc, o homem que tentou me comprar naquela boate, era pai da minha melhor amiga. Tudo parecia pior a cada segundo.

— Vamos deixar uma coisa bem clara — disse ele, sua voz adquirindo um tom de comando inegável. — Você não vai dizer a ninguém que já me conhecia antes disso. Para todos os efeitos, nós nunca nos encontramos antes. Entendido?

Assenti rapidamente, engolindo em seco.

— E outra coisa — ele continuou, levantando-se e indo até a porta do quarto. — Não quero mais ver você usando drogas. Se quiser se meter em encrenca, vai fazer isso longe da minha família.

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