1. A queda

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Meu nome é Yago, tenho 16 anos e morava no interior de São Paulo com meus pais. Minha mãe nunca trabalhou; não éramos ricos, mas meu pai nunca deixou faltar nada.

Seu Antônio era pedreiro e se desdobrava o máximo que podia para que eu e minha mãe tivéssemos sempre o básico.

— Eu consegui! — gritei, saindo do quarto e abraçando minha mãe, que estava na sala. — Eu passei, mãe, consegui!

— O que foi, menino? — disse ela, rindo e retribuindo o abraço, sem entender nada.

— Eu consegui uma bolsa de 100% em uma das melhores escolas particulares do Rio de Janeiro.

— Como assim, Rio de Janeiro? — disse meu pai, levantando-se imediatamente. — Não temos como ir para o Rio de Janeiro. Não posso largar meus projetos aqui, morreremos de fome lá. Aqui é cidade pequena, todos já nos conhecem.

— Exatamente! — falei irritado. — Aqui é cidade pequena! Eu quero ter um futuro, ou você acha que eu quero ser ajudante de pedreiro a vida toda?

— Mas saiba que é o pedreiro aqui que coloca comida na sua mesa, menino! — disse meu pai, levantando a voz.

— Não foi isso que quis dizer, pai — falei, arrependido. — É só que eu quero estudar em um lugar bom, quero ter oportunidades.

Senti meus olhos se encherem de lágrimas e fui para o meu quarto. Ouvi minha mãe bater na porta, mas preferi ignorar e acabei pegando no sono.

Acordei algumas horas depois com um grito que vinha da cozinha. Levantei rapidamente e encontrei meu pai no chão, se tremendo, enquanto minha mãe gritava por ajuda.

Infelizmente, não teve nada que pudéssemos fazer. Quando os médicos chegaram, meu pai já não estava mais vivo; ele havia tido um AVC.

Os dias seguintes foram bem complicados. Comecei a me afastar dos estudos e a pegar as obras que fazia com meu pai. Minha mãe não conseguia emprego em lugar nenhum, e ficou para mim a obrigação de sustentar a casa.

A cada dia, eu me sentia mais triste e com menos vontade de voltar para casa. Sempre fui um garoto estudioso, e ter que jogar meu futuro fora para ter a mesma vida que meu pai estava acabando comigo.

Um dia, ao chegar em casa, minha mãe estava com todas as nossas roupas em malas e sentada no sofá, me esperando.

— O que é isso, dona Bia? — perguntei, sem entender nada.

— Aquela escola que você ganhou a bolsa... Eles ligaram.

— E aí? — perguntei.

— E aí que nós vamos para o Rio de Janeiro. Eu vou vender essa casa e lá a gente consegue se virar em uma kitnet por alguns meses. Vai ser o tempo que eu vou precisar para arrumar um emprego de faxineira ou sei lá.

— Você tá falando sério? — perguntei, com um sorriso enorme no rosto. — Eu vou poder estudar?

— Vai sim, meu filho. Não vou mentir, não estou com uma sensação boa sobre essa mudança, mas vou porque você é mais importante para mim — disse ela, fechando os olhos. — Só te peço uma coisa: não me decepcione.

Assenti com a cabeça e fui para o meu quarto ajeitar as coisas.

As aulas já haviam começado, mas só conseguimos nos mudar para o Rio cerca de duas semanas depois, tempo necessário para encontrar um comprador para a casa e arrumar algum lugar para morar no RJ.

Ficamos em um apartamento bem pequeno no centro da cidade, que era bem distante da escola onde eu ia estudar, já que o colégio ficava na Barra da Tijuca.

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