Capítulo X : O Despertar da Ira

102 11 3
                                    

O salão da Fortaleza Vermelha estava mais silencioso do que de costume naquela manhã, envolto em uma tensão quase palpável. Os ecos das passadas firmes de Aegon ressoavam pelos corredores de pedra enquanto ele avançava em direção aos aposentos de sua mãe, a raiva queimando em cada fibra de seu ser. Seus punhos estavam cerrados, as unhas cravando-se em suas palmas, enquanto seus pensamentos fervilhavam em um redemoinho de fúria. Ele mal podia acreditar no que tinha acabado de ver.

Alicent estava sentada à beira da cama de Dhaelyra, os olhos marejados e cheios de uma fúria silenciosa, quase devastadora. O pequeno corpo da filha mais nova estava encolhido sob os cobertores, as lágrimas escorrendo por seu rosto, enquanto os braços, ainda pequenos e delicados, exibiam marcas roxas e profundas, provas incontestáveis do abuso que sofrera. Alicent alisava os cabelos da filha com uma suavidade tremenda, mas o brilho em seus olhos traía a tempestade que se formava dentro dela.

Quando Aegon entrou, sua mãe ergueu o olhar, e o silêncio entre os dois era carregado de uma compreensão mútua. Ele não precisava dizer nada; seus olhos flamejavam o mesmo ódio. Alicent se levantou lentamente, respirando fundo, tentando manter a compostura, mas a raiva transbordava de seu corpo como se fosse uma força incontrolável.

"Dhaelyra," ela murmurou, ainda com a voz terna para a filha, "vai ficar tudo bem. Mamãe está aqui. Eu não vou deixar que ninguém te machuque de novo." Alicent beijou o topo da cabeça de Dhaelyra, deixando sua mão repousar no ombro trêmulo da menina.

Aegon, que permanecia imóvel, finalmente quebrou o silêncio, sua voz grave e dura como aço forjado. "Quem fez isso com ela?"

Alicent não respondeu imediatamente. Ela não precisava. O nome estava no ar como uma praga: Rhaenyra. A princesa havia ultrapassado todos os limites. A rivalidade silenciosa entre as duas mulheres, que havia se intensificado ao longo dos anos, tinha finalmente explodido em algo físico. Alicent sabia que, de alguma forma, Rhaenyra estava envolvida no incidente que deixara sua filha marcada.

"Foi ela," Alicent murmurou, o tom de sua voz um sussurro mortal, como se cada palavra fosse um veneno que ela tinha de cuspir. "Rhaenyra machucou sua irmã."

Aegon sentiu o sangue correr para sua cabeça, o coração acelerando com uma fúria incontida. A ideia de Rhaenyra, sua meia-irmã, ousando encostar em lyra o enojava. E agora, ao ver a prova do que ela havia feito... não havia mais espaço para hesitação.

"Ela vai pagar por isso," ele rosnou, a voz tremendo com a promessa de violência. "Eu juro pelos deuses antigos e novos, ela vai pagar."

Alicent se aproximou dele, seu rosto contorcido em uma expressão que misturava dor e determinação. "Eu não vou deixar isso passar em branco. Não mais. Rhaenyra pensa que pode agir impunemente, como se não houvesse consequências para seus atos. Ela acha que está acima de todos nós. Mas Dhaelyra... lyra é minha filha. Minha."

O calor da raiva os unia naquele momento. Alicent se lembrou de todas as vezes que fora desrespeitada, desprezada por Rhaenyra e seus seguidores. As palavras afiadas, os olhares de desprezo, as zombarias sobre sua fé, sua moralidade. Tudo aquilo fervilhava agora dentro dela, como o fogo de um dragão que estava prestes a ser solto.

"Eu já a perdoei antes. Por Aemond. Por Helaena. Mas isso... isso vai ser a última vez," Alicent declarou, sua voz gélida.

Aegon se aproximou da cama de Dhaelyra, ajoelhando-se ao lado dela. Ele segurou a mãozinha de sua irmã, com o cuidado de não pressionar os braços machucados. "Eu estou aqui, Dhaelyra," ele disse suavemente. "Ninguém vai te machucar de novo. Eu vou garantir isso."

Os olhos de Dhaelyra, ainda inchados pelas lágrimas, olharam para ele com uma confiança inabalável. Ela sabia que Aegon era seu protetor, e mesmo sendo ainda muito jovem para compreender toda a complexidade do que havia acontecido, ela sentia o conforto que sua presença trazia.

"Rhaenyra vai pagar, mãe," Aegon repetiu, mas dessa vez suas palavras eram mais calculadas, frias. Ele já começava a traçar os próximos passos, planejando sua vingança. "Ela não vai mais se safar."

Alicent se aproximou da janela, observando os céus distantes, onde dragões já sobrevoavam o horizonte. Sua mente trabalhava rapidamente, entrelaçando seu desejo de proteger Dhaelyra com sua própria ambição. Rhaenyra havia cometido um erro grave, e agora, Alicent sabia, ela tinha uma nova vantagem.

"Sim," Alicent concordou finalmente, virando-se para encarar Aegon com um olhar resoluto. "A partir de agora, as coisas vão mudar."

Rhaenyra sentira o gosto do poder por tempo demais. O próximo movimento pertenceria à rainha — e à sua família. O fogo nos corações de Alicent e Aegon queimaria com ainda mais intensidade, e Rhaenyra aprenderia, da maneira mais amarga possível, que havia consequências para suas ações. Consequências que nem mesmo os dragões poderiam impedir.

                                       \\

Nos aposentos reais, o silêncio reinava após a tempestade de emoções. Alicent ainda segurava Dhaelyra com cuidado, acalmando os soluços da filha, enquanto Aemond permanecia firme ao lado dela, o corpo tenso. Viserys, por sua vez, estava perdido em pensamentos. Alicent podia ver o conflito em seus olhos, mas seu coração não poderia mais tolerar essa hesitação.

— "Não basta falar com ela, Viserys," Alicent disse com firmeza, sua voz atravessando o ar como uma lâmina afiada. "Rhaenyra precisa ser responsabilizada pelo que fez. E se fosse outra pessoa? Se fosse um nobre qualquer, você permitiria que isso passasse impune?"

Viserys a encarou, percebendo o olhar resoluto de sua esposa. Ele sabia que Alicent estava certa. Os olhos violetas de Dhaelyra, ainda inchados de lágrimas, o fizeram hesitar. Ver sua filha assim, tão pequena e vulnerável, trouxe à tona uma raiva que ele raramente sentia, especialmente em relação a Rhaenyra.

— "Eu sei," Viserys sussurrou, aproximando-se da esposa e da filha. Ele acariciou levemente a cabeça de Dhaelyra, que agora estava quieta nos braços de Alicent. "Eu farei o que for necessário. Ela não deveria ter machucado nossa filha."

Aemond observava o pai atentamente, seus próprios sentimentos de desconfiança crescendo. Ele amava seu pai, mas já vira Viserys perdoar os erros de Rhaenyra muitas vezes no passado. Ainda assim, ele permaneceu em silêncio, sua lealdade agora voltada completamente para sua mãe e sua pequena irmã.

— "Deixe-me levar Dhaelyra," Aemond disse suavemente, estendendo os braços. "Eu a levarei para seus aposentos. Ela precisa descansar."

Alicent, embora relutante em soltar a filha, assentiu. Ela confiava em Aemond, e sabia que ele cuidaria bem da irmã.

— "Cuide dela," Alicent pediu, seus olhos brilhando com preocupação. "Não a deixe sozinha, nem por um momento."

Aemond pegou Dhaelyra com delicadeza, e a bebê encostou a cabeça em seu ombro, ainda cansada após o incidente. Ele lançou um último olhar para os pais antes de sair, determinado a manter a irmã segura.

Enquanto Aemond saía, Alicent voltou-se novamente para Viserys, seu rosto agora implacável.

— "Ela não pode continuar se comportando assim," Alicent insistiu. "Você sabe o que Rhaenyra pensa de nossos filhos. Ela sempre nos olhou com desprezo, como se fossem menos merecedores do que os dela."

— "Alicent," Viserys começou a dizer, mas foi rapidamente interrompido.

— "Não!" Alicent exclamou, sua paciência esgotada. "Eu não estou pedindo apenas por Dhaelyra. Estou pedindo por Aemond, Aegon, e Helaena. Quantas vezes mais você vai permitir que ela fira nossa família antes de agir?"

Viserys suspirou, o peso da coroa pressionando-o mais uma vez. Ele sabia que essa divisão na família só crescia a cada dia, e o incidente com Dhaelyra apenas acentuava isso. A responsabilidade de ser justo como rei e pai era um fardo terrível.

— "Eu falarei com ela. Isso não passará impune, Alicent," ele prometeu, mas a rainha não estava satisfeita com palavras vazias.

— "Se você não agir," Alicent continuou, mais baixa, mas tão mortal quanto antes, "eu mesma tomarei providências. Eu protegerei meus filhos, Viserys, com ou sem sua ajuda."

Viserys permaneceu em silêncio, observando a esposa deixar o aposento com um olhar decidido. Alicent estava em fúria, e ele sabia que, desta vez, ela não se contentaria com promessas vazias. Ela tinha razão: a situação estava fora de controle, e sua hesitação como pai e rei poderia colocar em risco o que restava da unidade de sua casa.
__________________________________

Entre Dragões e Serpentes Onde histórias criam vida. Descubra agora