A verdade

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A transferência do meu avô para São Paulo é feita de helicóptero. Por esse motivo, viagem  é relativamente curta, mas pela minha angústia é como se demorasse um século para chegarmos.
Eu o acompanho durante todo o tempo no transporte aeromédico e Ramón pega um jatinho particular.

Assim que chegamos ao hospital, eu entro correndo juntamente com os enfermeiros que arrastam a maca para o centro cirúrgico. Eles me orientam a aguardar na sala de espera.
Mesmo contrariada, obedeço e chorando, sento-me em uma das poltronas enquanto aguardo.
Ramón que chegou um pouco antes de mim ao hospital, permanece ao meu lado o tempo todo.

Um filme passa pela minha cabeça e me lembro  do enterro dos meus pais.

Flashback on

Eu com apenas 5 anos choro no colo no meu avô enquanto vejo os caixões serem fechados.

- Mamãe! Papai! - Choro desesperadamente estendendo as mãozinhas enquanto o meu avô também aos prantos me abraça.

- Não chora, meu amor...  Eu vou cuidar de você, eu prometo - Beija a minha testa.

Em seguida relembro momentos da minha vida em que eu passei com o meu avô: as minhas festas de aniversário que ele fazia questão de transformar em um evento, a valsa que dançamos juntos na minha festa de quinze anos, o apoio que ele me deu quando Hans e eu terminamos e posteriormente quando descobri que estava grávida.

- Minha princesa, não se preocupe. Eu vou te ajudar a criar esse bebê. O meu bisneto vai ser muito amado e nós nunca vamos precisar do genitor dele para nada - Dizendo isso, meu avô enxuga as minhas lágrimas e me abraça forte.

Flash back off

Eu não posso perder o meu avô...

Ele é tudo pra mim...

Choro desesperadamente com o rosto entre as mãos enquanto Ramón me abraça.
De repente escuto uma voz familiar:

- Dona Mila.

Ao levantar os olhos, vejo Guto parado à minha frente com o olhar preocupado.

- Guto que bom que você veio! - Ramón diz.

- Como ele está? - O assistente pergunta.

Meneio a cabeça antes de dizer:

- Estão operando ele lá dentro, mas até agora nenhuma notícia - Encaro-o olhos nos olhos - Por que você não me contou que o meu avô tinha um aneurisma? - Pergunto com dor na voz - Ele passou mal na praia enquanto surfava.

- Aneurisma? Como assim? - Guto pergunta sem entender.

- O meu avô está com esse aneurisma há muito tempo. Já era pra ter sido tratado. Não é possível que você também não sabia. Você era a sombra dele. Com certeza deve ter percebido o meu avô apresentar os sintomas - Digo.

- Dona Mila, eu juro por tudo que é mais sagrado que eu não sabia disso - Guto justifica - Recentemente eu percebi mesmo que ele estava abatido e magro. Pouco antes da nossa mudança para cá, teve  algumas tonturas e dores de cabeça. Eu insisti várias vezes para que ele fizesse exames, mas a senhora conhece o seu avô. Ele é muito teimoso. Quando eu o questionava, o senhor Edgar dizia que era cansaço.

- O Edgar nunca procurou saber o porquê desses sintomas? Ele tinha um geriatra em Miami e outro aqui no Brasil  para acompanhá-lo. Não é possível que nenhum deles tenha percebido que havia algo errado! - Ramón protesta.

- Eu não sei. Ele nunca me deixou acompanhá-lo nas consultas. - Guto se recorda -  Sempre me dava folga nesses dias.

- Quando ele vinha ao Brasil também não me deixava acompanhá-lo ao médico - Digo triste ao me dar conta de que o vovô esteve esse tempo todo escondendo a doença de todos nós.

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