Sentia seus dedos tocando meu pulso, era algo recente. Ficar algemada por semanas deixaria marcar não só na minha carne, mas também na minha alma. Respirei fundo e me mexi na cama e senti ele se afastar. Sua respiração era intensa, sentia o medo e a raiva dele, aos poucos sinto ele se afastar de mim. Abri meus olhos e com a claridade do sol e do quarto branco do hospital. Abri e fechei meus olhos até me acostumar com a iluminação. Olhei para ele que estava de costas para mim. Minha fragilidade naquele momento era tanta que me perguntava, será que eu superaria?
Olhei sua pele machucada ao redor dos pulsos, seu lábio com um corte profundo no canto, um olho roxo, ela sofreu nas mãos aquele lixo humano, mataria todos que ousaram tocar nela, minha alma estava quebrada ao ver minha esposa assim, seu nariz machucado, pequenos cortes na face, os braços com marcas de que a seguraram com força. Ela tinha a pele clara e sensível, eu nunca a deixei marcada, nem mesmo quando fazíamos amor um pouco mais intenso. Queria apagar isso da sua mente, do seu corpo e da sua alma. Me vi impotente quando a levaram, explodiria aquele quartel inteiro para salvar ela, dou graças que eles chegaram antes que eu, pois mataria todos naquele lugar do inferno. Me afastei quando ela se mexeu, tão frágil, tão vulnerável, sei que tenho culpa, mas neste momento só quero o bem estar dela, e penso será que vamos superar mais isso, será que ela vai me olhar novamente com aqueles olhos lindos, e me dar aquele sorriso que tanto amo e que me acalma, será que ela vai superar o que viveu naquele lugar por minha culpa?
Vi o médico entrar, e fechei meus olhos novamente, queria ouvir ele, mas também queria dizer que eu estava bem. Nada fácil para alguém que ficou semanas sequestrada, algemada e torturada psicologicamente. Mas eu estava bem, meu corpo doía tanto, minha cabeça estava explodindo e meu pulso queimava, algo que naquele momento não tinha controle e senti minha carne tremer.
— Sr. Atílio, sua esposa está bem, os hematomas saíram em breve. A cicatriz nos punhos devido às algemas podem ser removidas com cirurgia plástica. — queria gritar naquele momento e dizer o que vou fazer com a cicatriz deixada dentro na minha cabeça, a minha mente pode ser feita também uma plástica, isso também pode ser removida? Fiquei quieta e só ouvi a voz do médico. Ele não falou nada, mais um sinal que sua raiva estava ali.
Eram 10 anos de casamento e sei exatamente quando Atílio Montenegro estava com raiva de algo ou alguém. Ele fica quieto observando tudo e todos. Trava o maxilar quase que rangendo os dentes, fecha os punhos e buliçoso. Meu marido é um homem observador, e eu sabia que naquele momento estava remoendo meu sequestro, se culpando pelo acontecido. Preciso contar para ele que não foi culpa dele. Mas naquele momento o médico disse algo que não só deixou ele com ódio mortal, mas com medo também.
— Sr. Montenegro, sei que é premeditado, mas sabia que sua esposa está grávida?
Me viro para olhar para o médico e também para minha esposa, como assim grávida? Como? Quando? A vi, seus olhos abertos e olhando para mim, estavam tristes e marejados. Queria beijar e abraçar Cristina, mas não consegui me mexer. Ela estava frágil, machucada e grávida. Havia sido sequestrada, machucada e torturada e tudo por minha culpa, por eu ser quem sou, pela minha profissão.
— Ela está de quatro meses, e os exames de integridade deram negativo, ela não foi estuprada! — ouvir ele falando me deu um certo alívio, mas fiquei olhando para meu marido, como eu saberia, e quanto tempo se passou desde o meu sequestro, será que ele pensa que foram eles?
Ouvir aquilo foi um alívio, em saber que eles não tocaram nela, aquela forma vil, desprezível e desumano que um homem pode se prevalecer de uma mulher e ao mesmo tempo todas aquelas informações era como estar dentro de um tornado e ser o epicentro dele. Cristina me olhava com a face avermelhada de choro. Era sempre assim, via o medo dela o choro contido sua face ficando rubra, ela precisava de mim, precisava que eu deixasse que o meu medo naquele momento ficasse lá fora.
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Um resgate do amor
FanfictionUm amor, um evento traumático será que um amor poderá superar isso tudo?