Desde o incidente na piscina, não consegui tirar aquela garota da cabeça. Algo nela era diferente, fascinante de uma maneira que eu não conseguia explicar. Mesmo o trabalho — que sempre executei com precisão e propósito — começou a ser feito de forma automática, quase negligente. A inquietação me consumia, e percebi que a única forma de entender o que me prendia a ela era me aproximar.
Entrar no mundo dos humanos nunca foi um desafio, e manipular o professor Gregory foi quase... infantil. Convenci-o facilmente de que eu era um aluno brilhante de medicina, com um histórico impecável, merecedor de ingressar em seu seleto grupo. Uma distração conveniente para justificar minha proximidade com ela.
Quando a vi novamente, tão perto, notei algo que as observações distantes nunca me revelaram: sua beleza era mais profunda. Não apenas física, mas algo nos olhos dela — uma resiliência, um fogo que parecia desmentir sua aparente tranquilidade.
Eu sabia que meu olhar era intenso demais. Humanos têm um medo inexplicável de encarar aquilo que lhes interessa, de confrontar suas próprias emoções. Eu não tinha essa limitação, mas, mesmo assim, quando percebi que ela notou meu olhar fixo, desviei, disfarçando. Não por vergonha, mas por curiosidade. Queria ver como ela reagiria.
Quando Gregory começou a falar sobre um acidente de carro que ocorreu em agosto de 2024 que envolvia um casal e sua filha de 10 anos. Lembro-me dele com uma clareza arrepiante, como se tivesse acontecido ontem. Era um sábado chuvoso. Um casal apaixonado decidiu visitar a praia, mesmo sob o céu nublado. Na volta, a chuva não dava trégua. A estrada escorregadia transformou o percurso em uma armadilha mortal.
O carro deslizou, perdeu o controle e capotou. A mulher, que mal havia chegado aos 40, foi lançada pela janela. A morte foi instantânea. O homem ao volante agonizava, sufocado pelo próprio sangue, enquanto sua vida se esvaía diante de mim. Mas a garota...
A garota não estava lá. Não havia sinal de sua alma. Mesmo sendo meu trabalho, essa ausência era incomum, perturbadora. Era como se ela simplesmente não estivesse no acidente — ou como se algo muito maior a tivesse protegido.
Voltei ao presente, mas aquele dia ainda ecoava em minha mente. Apesar de ser a morte, sempre achei injusto quando pessoas boas sofrem tanto, mesmo no fim.
Minha atenção foi então atraída para Katarina, sentada ali, mas claramente perdida em seus próprios pensamentos, assim como eu estava. Algo nela parecia... fora do comum. Era como se estivéssemos conectados de alguma forma, embora eu ainda não conseguisse compreender por completo.
Gregory chamou seu nome, ao responder a voz dela carregava uma ligeira angústia, embora tentasse escondê-la. Claro que o restante de pessoas naquela sala não notou nem o próprio Gregory mas eu percebia tudo, todos os detalhes sempre.
A aula finalmente chegou ao fim. Katarina esperou pacientemente todos saírem antes de se levantar, permanecendo um pouco no corredor. Eu a observava de longe, atento a cada detalhe de sua expressão. Porém, um dos idiotas do grupo, aquele cheio de sarcasmo e ego inflado, soltou um comentário que me fez questionar minha própria paciência. Senti uma vontade quase irresistível de revelar a verdadeira natureza de quem eles tinham por perto, de lembrar-lhes que, diante de mim, eles não eram nada.
Mas ela simplesmente ignorou, passando por eles como se não valessem o esforço. A calma dela me desarmou, e eu me vi novamente intrigado.
Decidi segui-la, ainda tentando entender o que em Katarina me causava esse turbilhão de pensamentos. Contudo, antes que pudesse prosseguir, ela encontrou o tal rapaz da toalha — Jonas, o garoto encantador que parecia ocupar um espaço indevido na proximidade dela.
"Isso é desnecessário," murmurei para mim mesmo, irritado com minha crescente obsessão. Era uma humana, um mero pedaço de carne e osso, como todos os outros. Que valor havia em acompanhá-la? Que sentido tinha esse interesse repentino?
Com essas perguntas perturbadoras ecoando em minha mente, virei as costas e simplesmente fui embora, tentando, sem sucesso, apagar sua presença da minha cabeça.
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Rainha da morte
Novela JuvenilKatarina é uma jovem de 20 anos que carrega a dor da perda desde os 10 anos, quando seus pais faleceram em um trágico acidente de carro. A perda precoce dos pais a forçou a amadurecer rapidamente, vivendo em lares adotivos e enfrentando uma infância...