24 - Certeza é incerteza.

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— O que diabos você está fazendo!

Eu puxei o braço de Rattikarn para longe de Ann. A mulher de rosto delicado, agora com uma marca vermelha do tapa forte, tropeçou para trás contra seu próprio carro. Nossos gritos chamaram a atenção das pessoas no saguão e o segurança, que deve ter acabado de sair para ir ao banheiro, veio correndo para ver o que estava acontecendo. Olhei para frente e para trás entre minha parceira e Ann, dividida, insegura sobre para quem eu deveria correr como uma heroína dramática, embora eu não estivesse em conflito no meu coração.

— Eu não sei...

Até Rattikarn, que tinha acabado de dar um tapa em alguém, olhou para sua própria mão em confusão. Seu rosto, agora vermelho de vergonha, se inclinou para cima como se quisesse escapar da cena.

— Eu não sei, eu não sei!

— Dao... onde você está indo?

Eu gritei para Rattikarn enquanto ela saía correndo do condomínio.  O céu estava mudando para um azul-marinho profundo, sinalizando o amanhecer de um novo dia. Ann, que pareceu atordoada por um momento, acenou para mim, me pedindo para ir atrás dela.

— Não se preocupe comigo. É só um tapa. Eu não estou morrendo. Vá falar com sua garota.

— Mas você está machucada.

— Um tapa de esposa dói mais do que isso.

Por mais bizarro que fosse esse raciocínio, eu corri atrás de Rattikarn. A linda mulher estava saindo furiosa como se sua vida dependesse disso. Seu ritmo me forçou a alternar entre andar e correr até que finalmente a alcancei e coloquei uma mão em seu ombro.

— Onde você pensa que está indo? Você não pode simplesmente fazer uma cena e depois sair correndo! Isso não é do seu feitio!

Rattikarn ignorou minha mão sem nem olhar para mim, então eu a agarrei pelos ombros e a girei. Foi quando vi lágrimas escorrendo por suas bochechas. Nós discutíamos com frequência e, geralmente, eu era quem chorava.  Mas dessa vez, os papéis estavam invertidos. Seus cílios encharcados de lágrimas a faziam parecer ainda mais lamentável.

— Você...

— Você está certa. Não é do meu feitio. Nunca fiz nada assim antes! — Ela enxugou as lágrimas com as costas da mão. — E esse choro... a última vez que chorei foi quando meus pais morreram. Mas agora, por algo tão trivial quanto o amor? É a coisa mais ridícula da minha vida. E ainda assim... h-hic... não consigo parar de chorar!

Ela soluçou como uma criança. Eu podia vê-la lutando para se conter, mas seu corpo não parecia cooperar. A essa altura, alguns carros estavam começando a passar enquanto os madrugadores se dirigiam para o trabalho, temendo engarrafamentos. Um punhado de pedestres na calçada olhou para nós curiosamente, imaginando o que estava acontecendo. Decidi agarrar o pulso de Rattikarn e levá-la até um ponto de ônibus próximo. Não era longe do condomínio.  Ela resistiu o tempo todo e, no final, ela puxou a mão livre e olhou para mim com desdém.

— Não me toque. Você é imunda.

— Imunda? — Eu levantei minhas mãos, confusa.

— Quem sabe onde essas mãos estiveram, cavando em sabe-se lá o quê.

— Eu não toquei em nada inapropriado. Do que você está falando? O que há de errado com você? Por que está agindo assim? — Comecei a ficar irritada e fiquei com as mãos nos quadris, observando-a limpar as mãos na blusa como se tivesse acabado de tocar em algo nojento.

— Vocês duas se divertiram a noite toda, não é? Desde que estou com você, nunca te traí fisicamente.

— Eu não traí.

No5: Quando sinto seu cheiro (Série Perfumes Vol.1)Onde histórias criam vida. Descubra agora