1-Sal

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Ele estava dançando pelo quarto. Devia estar ouvindo uma música bem animada por que suas dancinhas eram um tanto quanto estranhas. Eu estava olhando(espiando) pela janela do meu quarto o novo vizinho arrumar suas coisas. Ele tirava algumas coisas da caixa: porta retrato, livros, troféus, livros, pequenos animais feitos de madeiras, livros, CD's, mais livros... Eram tantos livros que eu imaginava onde ele colocaria tudo aquilo.

Ele pegou seu celular em cima da cama, moveu o dedo pela tela e parou. Devia estar escolhendo uma outra música. Depois de alguns segundos jogou seu celular na cama de novo. Começou a andar em direção a um porta retrato que havia deixado em cima de uma prateleira que já havia na casa. Eu conhecia os antigos vizinhos então sabia que havia uma prateleira que fora deixada lá. O garoto da casa ao lado colocou o porta retrato no peito e abraçou com força. Mexia seu corpo lentamente. Ele dançava de costas para a janela, mas quando virou de lado, vi que estava chorando. Ele era lindo demais para estar assim. Queria estar lá para consolá-lo. Abraçar ele e dizer que qualquer que fosse a dor dele, um dia passaria. Mas não podia. Eu era só um vizinho desconhecido.

-Matheus. - gritou minha mãe da cozinha.

Me afastei da janela, sai do quarto e desci correndo as escadas.

-Não desça correndo menino! Um dia você pode cair. Vai que morre e como é que eu fico? Caixão tá caro! - disse ela.

Apenas revirei os olhos e ri.

-O que foi? - perguntei.

-Vai lá comprar sal para mim. Quero logo terminar o almoço.

Obs.: mãe não manda, ordena!

-Mas hoje é domingo. Tá fechado o comércio.

-Nem ali no canto tá aberto?

-Não. Eles fecham cedo. - disse e já ia saindo, quando ela começou a falar de novo.

-Então vai lá pedir dos novos vizinhos.

Meu coração quase parou. Só de saber que havia mil possibilidades de ele atender a porta e eu ver ele, fez eu quase desmaiar de nervosismo.

-Eu... - minha voz engatou no eu.

-Não Matheus, a Safira vai lá.

Safira era uma gata preta minha.

-Eles acabaram de se mudar. Acho que nem fizeram as compras do mês ainda.

-Vai logo!

-E a vizinha aqui do lado? Ela não tem?

-A casa tá toda fechada. Acho que eles saíram.

Droga!

Ela me deu um pequeno copo e fui em direção a porta. Parei em frente a um espelho que havia perto da entrada(segundo minha mãe, o espelho servia para rebater a inveja. Tipo, fazia a inveja bater na pessoa que te desejou) e vi se eu estava apresentável. Ajeitei meu cabelo, alisei minha camisa que estava toda amassada e saí. Fiquei parado na escadinha que tinha em frente de casa e desci. Tomei coragem e fui andando. Meus pés pareciam pesar 500 kg cada uma. Um século se passou e eu havia chegado na entrada da casa do vizinho.

Apertei a campainha e ouvi uma voz de dentro gritar:

-Já vai.

Depois de algum tempo a maçaneta da porta girou.

-Olá. - disse a mãe dele.

Me bateu uma decepção.

-Olá. Sou o vizinho aqui do lado - apontei para a minha casa que ficava a esquerda da casa dela - e gostaria de saber se você tem um pouco de sal para me emprestar.

Ergui o copo para ela.

-Sim, tenho sim. Entre! - disse isso e ela foi se virando para ir para a cozinha, mas continuou - Só não sei onde está. Acabamos de nos mudar e está uma bagunça por enquanto - disse ela da cozinha.

Olhei para os lados e vi que havia muita coisa que faltava sair da caixa ainda. Vi também que haviam sido pintadas as paredes da casa. Enquanto olhava a sala da casa, ela estava voltando da cozinha.

-Achei. - disse ela - Dê-me seu copo.

Entreguei a ela e aos poucos foi enchendo o copo de sal.

-Você se chama... ? - perguntou ela enquanto balançava o saquinho do sal para cair mais.

-Me desculpe. Sou o Matheus.

Terminando de colocar, ela entregou o meu copo.

-Aqui Matheus.

-Obrigado.

Agradeci e fui em direção a porta. Quando eu ia sair, ouvi passos na escada. Depois uma voz doce e forte ao mesmo tempo me fizeram tremer as pernas.

-Mãe, a senhora viu...

Olhei para trás e vi ele. Pessoalmente o garoto era mais alto, mais forte, mais lindo. Ele estava de toalha e vi suas bochechas ficarem coradas. Fiquei de boca aberta. Seus cabelos estavam molhados o que fazia a água cair pela sua barriga definida. Quase tive um treco.

-Filho, esse é o Matheus, nosso vizinho aqui do lado! Veio nos emprestar sal.

Ele ficou me olhando e tive vontade de me enterrar. Minhas mãos tremiam, mesmo assim levantei a mão que não estava com o copo com sal, acenei para ele e disse um "Oi" inaudível.

-Esse é o meu filho, Victor.

Ele acenou com a cabeça. Para não babar ali, disse que minha mãe devia estar esperando o sal e sai. Quando estava na escada frente à porta, ouvi a mãe dele dizer:

-Da próxima vez que você voltar, as coisas vão estar mais arrumadas por aqui.

Olhei para trás e atrás dela vi Victor parado no mesmo lugar, ainda me olhando. Apenas sorri para ela e fui andando em direção a minha casa. Quando cheguei no último degrau da escada tropecei e quase cai. A vontade que eu tinha era de me enterrar ali. Minhas bochechas começaram a ficar quente e saí apressadamente. Cheguei em casa, entreguei o sal à minha mãe e subi para o meu quarto. Tentei não olhar pela janela, mas a vontade de vê-lo falou mais alto.

Ele estava em seu quarto, colocando uma camisa branca. Pegou o celular, pôs no bolso e depois saiu. Deitei na cama e não via a hora de vê-lo novamente.

O Garoto Da Casa Ao LadoOnde histórias criam vida. Descubra agora